Cinquenta dias antes da eleição americana, a Folha começou a publicar a série de reportagens “50 estados, 50 problemas”, que se debruça sobre questões estruturais dos EUA e presentes na campanha eleitoral que decidirá se Donald Trump continua na Casa Branca ou se entrega a Presidência a Joe Biden.
Até 3 de novembro, dia da votação, os 50 estados do país serão o ponto de partida para analisar com que problemas o próximo —ou o mesmo— líder americano terá de lidar.
Um dos principais estados do país, berço de importantes lideranças e envolto em uma nuvem de corrupção que parece atingir toda a política local. A sentença anterior poderia ser sobre o Rio de Janeiro, mas é sobre Illinois. O estado onde Barack Obama e Abraham Lincoln começaram suas carreiras também chama a atenção por já ter mandando quatro ex-governadores para a prisão.
A situação em Chicago, a mais importante cidade do estado, é ainda pior: cerca de 30% dos vereadores do período entre 1976 e 2012 foram condenados por corrupção, de acordo com estudo liderado pelo cientista político Dick Simpson, da Universidade de Illinois em Chicago.
“Chicago é a cidade mais corrupta da América, e Illinois, o terceiro estado mais corrupto”, resume ele, que analisou a proporção entre condenações por corrupção na Justiça e a população geral.
A fama de Chicago —e, consequentemente, de todo o estado— como capital nacional da corrupção tem quase cem anos, desde a época que Al Capone comandava a máfia local nos anos 1920.
Recentemente, essa reputação cresceu ainda mais depois de dois ex-governadores se envolverem em escândalos. Primeiro, foi o republicano George Ryan, que comandou o estado entre 1999 e 2003, condenado em 2006 por aceitar propina de caminhoneiros em troca de liberação de trabalho.
Depois, o sucessor, o democrata Rod Blagojevich, cobrou propina para indicar quem substituiria Obama no Senado após ele ser eleito presidente. No estado, é o governador quem nomeia o suplente para um mandato tampão. Blagojevich acabou sofrendo impeachment em 2009, sendo condenado na Justiça e preso —ele deixou a cadeia em fevereiro deste ano depois de receber perdão do presidente Donald Trump.
Para Simpson, as raízes do fenômeno em Illinois estão ligadas à formação da elite política local, que se baseou no arranjo conhecido como “political machine” (máquina política), no qual um pequeno grupo controla a política de determinada cidade ou região, sem dar chance a alternância de poder.
Essa estrutura se reproduziu em todo o estado, afirma o cientista político, criando um cenário que favorece a corrupção, embaça os limites entre o público e o privado e dificulta a transparência.
“Essas máquinas [políticas] são construídas a partir de clientelismo, do favorecimento a apoiadores e de contratos superfaturados para empresários que apoiam as campanhas”, diz.
Ele aponta ainda que o arranjo não é exclusivo de Illinois e está presente em outros estados que também enfrentam problemas crônicos de corrupção, como Louisiana e Nova Jersey. Assim, o tema tem ganhado relevo entre as preocupações dos eleitores para a eleição presidencial. Apesar disso, nem Trump nem seu rival, o democrata Joe Biden, têm planos claros de como combater a corrupção.
Em 2016, o republicano chegou à Casa Branca prometendo “drenar o pântano de Washington”, uma metáfora para corrupção no governo federal. Passados quatro anos, seu site de campanha afirma que essa foi uma das promessas que o republicano cumpriu ao longo do mandato, mas não explica que medidas tomou sobre o assunto nem o que pretende fazer caso conquiste a reeleição.
Biden, por sua vez, acusa Trump de ser “o presidente mais corrupto da história” e promete devolver integridade ao cargo, mas também não apresenta medidas concretas do que fará.
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