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Biden propõe criar comissão bipartidária para estudar mudanças na Suprema Corte

Democrata evita dizer se pretende ampliar número de juízes para acabar com maioria conservadora no tribunal

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Washington e São Paulo | Reuters

O candidato democrata à Presidência dos EUA, Joe Biden, anunciou nesta quinta-feira (22) que, caso eleito, criará uma comissão com acadêmicos e representantes dos dois principais partidos do país para estudar mudanças na Suprema Corte americana.

"Pedirei a eles para, em 180 dias, oferecerem recomendações de como reformar o sistema judicial, porque ele está fora de sintonia", afirmou o democrata ao programa "60 Minutes", da rede CBS, em uma entrevista que será exibida na íntegra no domingo (25). "Há um número de alternativas que vão além da ampliação."

O candidato democrata Joe Biden durante comício em Riverside, no estado da Carolina do Norte
O democrata Joe Biden durante comício em Riverside, no estado da Carolina do Norte - Tom Brenner - 18.out.20/Reuters

Biden tem evitado responder se aumentaria o número de juízes da corte máxima americana, uma proposta da ala mais à esquerda do Partido Democrata para garantir maioria de magistrados progressistas.

A manobra é permitida, já que a Constituição do país não fixa um número para o tribunal, mas o próprio candidato, em declaração no começo do mês, já se mostrou contrário à ideia. Biden afirma que o tema é uma "bola viva" e que, caso responda sobre a proposta, "todo o debate será em torno do que disse ou não".

O ex-vice-presidente disse na semana passada que revelará sua posição aos eleitores antes do dia da votação, em 3 de novembro, o que indica que ele não conseguirá tergiversar por muito mais tempo. A postura evasiva também irrita alguns defensores da estratégia de expandir a corte, uma vez que, afirmam eles, a questão tem de ser tratada com muito mais urgência caso Biden vença o pleito à Casa Branca.

“Esta comissão proposta corre o risco de brecar o ímpeto de uma reforma séria”, disse Brian Fallon, diretor-executivo do Demand Justice, movimento que defende mudanças no Judiciário para "restaurar o equilíbrio ideológico" e se opõe a indicações de nomes considerados extremistas. “Uma comissão que permitiria a oponentes de uma reforma estrutural atrasar o processo não é uma solução. É um chute."

Outros nomes, do próprio Partido Democrata, casos da deputada Alexandria Ocasio-Cortez, a AOC, e da senadora Elizabeth Warren, argumentam que "não é apenas sobre expandir, é sobre despolitizar a corte".

No passado, Biden disse que assumir uma posição firme apenas ofereceria combustível a Trump, que tem todo o interesse em transformar o tema num calcanhar de Aquiles da campanha rival.

Democratas não superaram o trauma dos emails de Hillary Clinton em 2016 —a então candidata passou boa parte da corrida pela Casa Branca se explicando sobre o uso de um servidor privado quando era secretária de Estado de Obama, tido como potencial risco à segurança nacional.

A Suprema Corte tem atualmente nove juízes. Com a nomeação de Amy Coney Barrett, em análise pelo Senado, a corte terá maioria de conservadores, de 6 a 3. Nesta quinta, a juíza foi aprovada pelo Comitê de Justiça da Casa. A votação em plenário, que confirmará a indicação, está marcada para segunda (26).

Como juíza no tribunal de apelações responsável por decisões nos estados de Illinois, Indiana e Wisconsin, Barrett deixou um rastro de votos conservadores, principalmente em questões relacionadas a direitos civis, como a legislação sobre aborto e acesso a armas.

Segundo modelo desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Virgínia, votos da juíza no tribunal indicam que ela tem de 87% a 95% de probabilidade de tomar decisões consideradas conservadoras.

Por isso, parte dos democratas sugere expandir o números de cadeiras do tribunal, contendo o avanço dos conservadores e oferecendo uma resposta às manobras de republicanos para ganhar espaço na corte.

Em 2016, os republicanos impediram o então presidente Barack Obama de indicar um novo juiz às vésperas da eleição. O democrata tentou emplacar o sucessor do juiz Antonin Scalia, ultraconservador e mentor de Barrett, morto nove meses antes do pleito que consagraria Donald Trump. Sem sucesso: os republicanos barraram a indicação, alegando que a escolha deveria caber ao próximo presidente.

Em 2020, no entanto, fazem o oposto, ainda que o prazo seja bem mais curto: a juíza Ruth Bader Ginsburg, símbolo progressista da Suprema Corte, morreu a 45 dias da eleição. Ainda assim, os republicanos aceleraram o processo para que Trump nomeasse um novo magistrado nos meses finais de seu mandato. Nos dois casos, o partido do presidente tinha maioria no Senado.

A Suprema Corte tem o poder de dar a palavra final em questões jurídicas nos EUA, o que pode trazer grande impacto para a sociedade. Seus membros escolhem quais casos aceitarão julgar.

A maioria conservadora poderá fazer a diferença caso sejam analisados processos envolvendo direito ao aborto, poderes do presidente, acesso ao porte de armas e direitos LGBT, por exemplo.

Os juízes têm cargo vitalício, sem idade de aposentadoria compulsória. Assim, as nomeações podem influenciar os rumos da corte por décadas. Ao todo, Trump terá nomeado três juízes da corte até o fim deste mandato, o que não o impediu de sofrer derrotas no tribunal em questões como imigração e aborto.

O atual presidente disse acreditar que o resultado da eleição presidencial de novembro, devido à votação por correio e o tempo maior para concluir a apuração, pode parar na Justiça, como ocorreu em 2000. Assim, ter maioria na Suprema Corte poderia ajudá-lo a obter a reeleição.


QUEM É QUEM NA SUPREMA CORTE

Ala conservadora

John Roberts, 65
Indicado por Bush em 2005. Ainda que seja considerado conservador, o atual presidente da Corte tem atuado de forma moderada

Clarence Thomas, 72
Indicado por Bush pai, em 1991

Samuel Alito, 70
Indicado por Bush em 2006

Neil Gorsuch, 53
Indicado por Trump em 2017

Brett Kavanaugh, 55
Indicado por Trump em 2018

Ala liberal

Stephen Breyer, 82*
Indicado por Clinton em 1994

Sonia Sotomayor, 66
Indicada por Obama em 2009

Elena Kagan, 60
Indicada por Obama em 2010

*devem se aposentar nos próximos anos. Amy Coney Barrett, de orientação conservadora, espera confirmação pelo Senado.

COMO FUNCIONA A SUPREMA CORTE

O que faz
Instância máxima da Justiça dos EUA, responsável por dar a palavra final em processos que geram dúvidas na interpretação das normas constitucionais americanas.

Como é composta
Tem nove juízes. Quando um cargo fica vago, o presidente indica um nome, que é sabatinado pelo Senado e precisa ser aprovado na Casa por maioria simples dos votos.

Duração dos mandatos
Não há aposentadoria compulsória: cada magistrado escolhe quando se aposentar. Os juízes também podem sofrer impeachment, mas até hoje nenhum saiu por esse caminho.

Como julga
Os juízes escolhem quais casos querem analisar. É preciso que ao menos quatro deles concordem para que um processo seja aceito. São julgados em torno de 80 casos por ano.

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