Candidato de direita desiste na Bolívia e fortalece frente contra nome de Evo

Tuto Quiroga anuncia desistência e afirma que prioridade é impedir que sigla do ex-presidente vença

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Buenos Aires

O ex-presidente da Bolívia Jorge "Tuto" Quiroga (2001-2002) anunciou neste domingo (11), por meio das redes sociais, a desistência de tentar voltar ao cargo na eleição do próximo domingo (18) .

"Não tenho possibilidade de chegar à Presidência, por isso declino de minha candidatura. Tenho na alma profunda dor e enorme angústia. Tenho diferenças com outros candidatos, mas espero que atuem para derrotar o MAS", afirmou ele, referindo-se ao Movimento ao Socialismo, partido de Evo Morales.

Quiroga participa de debate entre candidatos à Presidência da Bolívia em La Paz
Tuto Quiroga participa de debate entre candidatos à Presidência da Bolívia em La Paz - David Mercado - 4.out.20/Reuters

"Por menor que seja o risco de o MAS voltar ao governo, neste próximo 18 de outubro devo fazer tudo o que estiver ao meu alcance para evitar isso", completou ele.

A justificativa de Quiroga é muito parecida à da presidente interina do país, Jeanine Áñez, que também abandonou sua candidatura "para não fragmentar o voto da direita e evitar uma nova vitória do MAS".

Quiroga é um conhecido crítico de Evo e passou a maior parte da gestão do ex-presidente (2006-2019) apontando denúncias de corrupção contra o governo.

No ano passado, quando o líder indígena obteve permissão do Tribunal Constitucional para disputar um quarto mandato —o que é proibido pela Constituição, que só permite uma reeleição—, Quiroga disse que não se candidataria porque, "se o fizesse, estaria respaldando uma fraude, uma eleição ilegítima".

Após a renúncia de Evo, em novembro de 2019, Quiroga apoiou o controverso movimento que levou Añez, então segunda vice-presidente do Senado, ao comando do país. O ex-presidente, entretanto, desembarcou em poucos meses, quando ela decidiu que participaria do pleito. Curiosamente, nem Áñez nem Quiroga declararam apoio ao também ex-presidente Carlos Mesa, que segue concorrendo ao pleito.

Mesa aparece atualmente em segundo lugar nas pesquisas e é considerado o principal nome capaz de vencer o candidato do MAS, o ex-ministro da Economia Luis Arce. Seu perfil, porém, é bem diferente do dos rivais que desistiram. Enquanto Quiroga e Añez se posicionam como representantes da direita, Mesa é um político de centro-esquerda que inclusive chegou a colaborar com o MAS em diversas ocasiões.

Ele foi, por exemplo, escolhido por Evo para ser o porta-voz da demanda da Bolívia por uma saída pelo mar —o país trava há anos uma disputa sobre o assunto com o Chile.

As pesquisas mostram que, a uma semana da votação, o cenário está em aberto. A opção mais provável é um segundo turno entre Mesa e Arce, mas os levantamentos não descartam a possibilidade de o candidato do MAS vencer em primeiro turno —o que pode ter motivado as desistências.

As pesquisas na Bolívia, no entanto, não costumam ser confiáveis, principalmente pela dificuldade dos institutos de realizar enquetes nas regiões andina e amazônica. Assim, a maioria dos levantamentos costuma ser baseada nas cidades ou em sondagens feitas por telefone.

Entre as mais recentes, realizadas nas últimas semanas, portanto antes da desistência de Quiroga, está a do instituto Jubileo, que tem a maior amostragem —16 mil pessoas. Nela, a diferença entre Arce (42,9%), em primeiro lugar, e Mesa (34,2%), em segundo, é de 8,7 pontos percentuais. Quem cresceu depois da saída de Añez foi o também direitista Luis Fernando Camacho, que agora aparece com 17,8%.

Na Bolívia, para vencer no primeiro turno um candidato deve ter mais de 50% dos votos ou 40% e uma diferença de 10 pontos percentuais em relação ao segundo colocado. Caso contrário, há segundo turno.

A pesquisa do Ipsos, com 2.000 entrevistas, traz Arce com 42,2%, contra 34,6% de Mesa. A diferença cairia para 7,6%. Nesta, Camacho aparece com 17,1%. Já a pesquisa da Mercados y Muestras, realizada a pedido do jornal Página Siete, traz vitória apertada de Mesa (37,4%) sobre Arce (37,2%), com Camacho com 19,2%.

Enquanto isso, o Celag ,com 1.700 entrevistas, mostra Arce ganhando em primeiro turno, com 44,4%, contra 34% de Mesa. Aqui, Camacho tem 15,2%. Todos os levantamentos apontam que Mesa venceria Arce em um hipotético segundo turno.

Apesar de a pandemia do coronavírus não estar contida no país, que tem 138.463 casos confirmados e 8.292 mortes, Camacho tem realizado atos públicos e, assim, promovido aglomerações —ele realizou um comício neste domingo no departamento de Pando. Já Arce tem misturado alguns atos públicos e outros eventos virtuais, enquanto Mesa tem feito campanha principalmente por meio das redes sociais.

No domingo anterior (4), houve um debate presidencial com todos os candidatos, menos Arce. A estratégia do candidato de esquerda é a de não se expor enquanto ainda está na liderança.

Porém, ao final da semana, ele marcou uma diferença com relação a Evo. Em uma entrevista em Buenos Aires na última quinta-feira (8), o ex-presidente afirmou que os "meios de comunicação foram cúmplices do golpe de Estado", em uma referência aos protestos e às ameaças que o levaram a renunciar.

Assim, Evo disse que era "necessário fazer algo com a imprensa". "Precisamos de mais veículos que sejam do Estado e mais convencidos de sua missão social."

As declarações repercutiram de modo negativo na Bolívia. Em um ato em La Paz na sexta-feira (9), Arce discordou do padrinho político, dizendo que "não compartilha as opiniões do companheiro Evo sobre a imprensa" e que os veículos "cumprem um papel importante na democracia e na recuperação da pátria".


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