Cinquenta dias antes da eleição americana, a Folha começou a publicar a série de reportagens “50 estados, 50 problemas”, que se debruça sobre questões estruturais dos EUA e presentes na campanha eleitoral que decidirá se Donald Trump continua na Casa Branca ou se entrega a Presidência a Joe Biden.
Até 3 de novembro, dia da votação, os 50 estados do país serão o ponto de partida para analisar com que problemas o próximo —ou o mesmo— líder americano terá de lidar.
Quando o assunto é voto por correio, Utah faz valer a máxima de 1 em 1 milhão. Desde 2013, autoridades registraram apenas um caso de fraude em 970 mil cédulas enviadas por correspondência em eleições no estado, derrubando a tese vociferada por Donald Trump de que a prática aumentará a chance de irregularidades na disputa à Casa Branca.
Com 3,2 milhões de habitantes e cercado por famosos desertos, Utah soma-se a Havaí, Colorado, Washington e Oregon entre os cinco estados que realizam eleições quase totalmente por correio nos EUA.
Utilizado há anos de forma segura no país, o voto por correspondência virou tema de desinformação na disputa à Presidência americana e mobilizou os dois lados do xadrez político em meio à pandemia que já matou mais de 215 mil americanos.
Para evitar aglomerações, o uso do voto a distância deve aumentar consideravelmente nas eleições deste ano, o que também deve atrasar a divulgação completa dos resultados.
Numa espécie de vacina para quem está dez pontos percentuais atrás nas pesquisas, Trump tem repetido o discurso de que o voto por correio pode levar a fraudes e chegou a sugerir que os americanos votem duas vezes, de forma presencial e por correspondência, o que é ilegal.
O presidente também se recusou a responder se vai aceitar a derrota para o democrata Joe Biden e sinalizou que pode questionar o resultado na Justiça.
As acusações do presidente, porém, não têm fundamento. Estudo da Heritage Foundation, um centro de pesquisas conservador, mostra que, desde 1988, de 250 milhões de cédulas enviadas pelo correio, apenas 208 eram fraudulentas e resultaram em condenações.
Nos EUA, o voto não é obrigatório, e o eleitor pode escolher seu candidato de três maneiras: a mais tradicional é ir à urna no dia da eleição, mas há também como votar pessoalmente de forma antecipada ou ainda fazer o voto por correio, que precisa ser solicitado com antecedência.
As regras variam de estado para estado, mas a pandemia fez com que muitos deles deixassem de exigir justificativa para o voto a distância e abrissem prazos até o fim de outubro para pedir as cédulas —a eleição acontece em 3 de novembro.
Em 2016, cerca de 25% dos eleitores votaram por correspondência, índice que só aumenta desde 2004, quando eram 12% os que escolhiam esse formato. Trump avalia que mais participação de eleitores pode favorecer Biden —o republicano perdeu no voto popular em 2016 para Hillary Clinton, mas venceu no Colégio Eleitoral, sistema indireto que escolhe o presidente.
Diante da ofensiva de Trump, Biden inicialmente estimulou com vigor o voto por correio e foi ouvido por grande parte de seus eleitores. Pesquisa de agosto divulgada pelo Wall Street Journal/NBC mostrou que cerca da metade dos apoiadores do democrata pretendia votar por correspondência.
Nas últimas semanas, porém, a ideia passou a ser também um problema para o ex-vice de Barack Obama. Não por causa das fraudes pouco prováveis, mas por erros simples que podem ser cometidos por eleitores pouco habituados a preencher, assinar e enviar as cédulas corretamente, gerando a rejeição do voto.
Não há dúvida de qual partido se beneficiaria com a desqualificação em massa de cédulas enviadas pelo correio, mas ainda não está claro qual será o tamanho do impacto para cada candidato. A certeza é que, em razão da logística, será difícil cravar quem foi eleito presidente dos EUA na noite de 3 de novembro.
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