No último dia de ultimato, ditadura usa balas de borracha contra protesto na Belarus

Oposicionista definiu meia-noite como prazo para Lukachenko renunciar e libertar presos políticos

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Bruxelas

No último dia do ultimato pela renúncia do ditador da Belarus, Aleksandr Lukachenko, dezenas de milhares voltaram às ruas de Minsk neste domingo (25). As tropas de choque usaram balas de borracha, granadas e canhões d’água, em cenas que lembraram as da noite da eleição, em 9 de agosto.

Naquele domingo, bielorrussos saíram às ruas revoltados com a declaração de que Lukachenko tivera mais de 80% dos votos e foram dispersados com violência.

Neste 12º domingo seguido de protestos, imagens de gente ferida voltaram a aparecer nas redes sociais, em meio a chamadas para uma greve geral e novos protestos nesta segunda-feira (26).

A greve foi convocada quando a principal candidata da oposição, Svetlana Tikhanovskaia, deu a Lukachenko 13 dias para cumprir três condições: renunciar, soltar todos os presos políticos e dar fim à repressão das manifestações pacíficas.

O ditador, porém, voltou a declarar que não deixará o cargo e, como se viu neste domingo, não interrompeu a repressão. Mais de 500 pessoas foram detidas, segundo o regime, entre as quais sete jornalistas.


Lukachenko também não libertou todos os presos políticos. Cem deles continuavam na cadeia na última sexta (23), segundo a entidade de direitos humanos Viazna.

Ainda continuam presos seis jornalistas, de acordo com a Associação de Jornalistas da Belarus, que registra 431 casos de repórteres detidos pelo regime de Lukachenko desde o começo dos protestos.

Analistas são céticos quanto à capacidade da oposição de parar a economia do país contra a ditadura.

“Fazer reivindicações tão radicais e irrealistas e anunciar uma greve geral, em um cenário de crescente desencanto por parte do público, parece altamente arriscado”, escreveu Kamil Klysinski, analista sênior para Belarus do Centro de Estudos Orientais, em Varsóvia.

Bielorrussos que têm participado de todas as marchas dominicais desde agosto também disseram à Folha que não esperam uma greve geral nesta segunda, embora afirmem acreditar que parte do transporte público e companhias privadas façam protestos.

Na última sexta, Tikhanovskaia escreveu em aplicativo de mensagens que “trabalhadores dos transportes e funcionários das ferrovias bielorrussas, professores e alunos estão planejando greves e campanhas de desobediência”.

“Atletas, artistas, médicos e comunidades religiosas vão organizar suas ações de apoio. É assim que vai começar a primeira semana de greve nacional”, acrescentou a opositora.

Segundo o site informativo Tut.by, que está com a licença suspensa pelo regime, empresas divulgaram que fechariam nesta segunda por motivos técnicos (entre as justificativas apresentadas estavam balanço de estoque, manutenções, atualizações de programas de informática) ou por temer a falta de transporte público.

O banco Belagroprombank, por exemplo, comunicou em seu site que fechará todas as agência dos país das 8h às 14h, para "trabalhos técnicos".

Centros médicos, lojas, bares, cafés, escolas de idiomas, academias, agências de viagens, floriculturas, salões de beleza e oficinas estão entre as empresas que, ao Tut.by, afirmaram que parariam.

​Funcionários de algumas companhias, incluindo as de tecnologia (setor importante para as exportações de serviços bielorrussas), escreveram em redes sociais que tirariam folga por conta própria nesse dia. Outros grupos decretaram férias coletivas, por tempo indeterminado.

Na carta que mandou a seus funcionários, o diretor de uma escola de idiomas avisou que fecharia na segunda “em apoio à sociedade civil” e garantiria dois terços do salário daquele dia: “Somos uma gota no mar, mas essas gotas fazem o oceano”.

Sem mencionar o ultimato e a convocatória para a greve geral, TVs estatais divulgaram na última semana diversas entrevistas com diretores de empresas estatais e membros do governo, que advertiam para o custo das greves e o risco de demissões.

A oposição, por sua vez, vem prometendo pelas redes sociais apoio financeiro a quem for demitido.

O risco de uma paralisação fraca, segundo Klysinski, é que o regime a explore em seus meios de comunicação como símbolo da falta de influência da oposição.

O aumento da repressão neste domingo mostrou que Lukachenko ainda conta com o apoio das forças de segurança, apesar do apelo de Tikhanovskaia para que eles tomassem o lado antiditadura.

Para o analista independente Serguei Chali, o ultimato foi um erro de avaliação. “O ultimato é apropriado quando você pode infligir danos irreparáveis ao inimigo. Agora não existe essa possibilidade”, disse ele à imprensa bielorrussa.

O analista também considera estranho que um ultimato seja convocado por líderes da oposição que decidiram sair da Belarus por julgar que não estavam em segurança no país.

“Não haverá diálogo com Lukachenko, é claro. Tudo depende da energia de pessoas dispostas a sacrificar seus meios de sobrevivência e sua segurança por um propósito maior”, afirma ele.

Para Chali, a única estratégia viável é manter manifestações pacíficas, enquanto investidores e atores internacionais aumentam a pressão sobre Lukachenko e reduzem suas chances de governar.

Reino Unido, Canadá e União Europeia impuseram sanções a integrantes do regime bielorrusso, e a oposição foi premiada na última semana com o Sakharov, uma das principais homenagens europeias na área de direitos humanos.

Lukachenko, porém, parece contar por enquanto com algum apoio do governo russo, para o qual a Belarus tem importância geopolítica, por separar a Rússia das tropas da Otan (aliança militar ocidental) e por ser zona de passagem de gás e petróleo russos.

No sábado (24), o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, ligou para Lukachenko. De acordo com o regime bielorrusso, eles discutiram “as situações políticas internas na Belarus e nos EUA".

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