Nobel antiditadura diz temer que não a deixem voltar à Belarus

Na Itália, Svetlana Aleksiévich afirma que jornalistas bielorrussos sofrem como correspondentes de guerra

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Bruxelas

A vida dos jornalistas bielorrussos é tão dura quanto a dos correspondentes de guerra, disse neste domingo (4) a escritora Svetlana Aleksiévich, 72, prêmio Nobel de Literatura (2015).

Só em setembro, 60 repórteres foram detidos pela ditadura da Belarus, segundo a associação de jornalistas do país.

Aleksiévich, uma das líderes do conselho que tenta negociar uma transição com o ditador Aleksandr Lukachenko, disse que quer voltar à Belarus, mas afirmou que, embora se considere um pouco mais protegida por ter recebido um prêmio Nobel, tem medo de ser presa.

“Imaginar que você pode ir para a prisão é uma ideia bárbara”, disse a escritora.

Segundo ela, não é certo também que a ditadura a deixará entrar. “Todos os que pensam como eu estão na prisão ou foram forçados a deixar o país”, diz ela. Dos sete líderes do conselho de oposição, dois estão na cadeia e três foram exilados.

Cerca de 12 mil pessoas foram detidas desde que os protestos começaram, em 9 de agosto, dia da eleição presidencial, considerada fraudada por oposicionistas, governos e entidades internacionais.

“Nunca quis morar em outro país, e a primeira vez que parti da Belarus foi também em protesto contra Lukachenko, que acabava de chegar ao poder”. O ditador foi eleito pela primeira vez em 1994, na primeira e única eleição considerada livre e justa no país.

Aleksiévich disse admirar os manifestantes bielorrussos, que há 57 dias protestam contra a ditadura e pedem a renúncia do ditador.

Não há medições independentes, mas sites jornalísticos do país estimaram que mais de 100 mil pessoas participaram do protesto em Minsk neste domingo, o nono de grandes marchas desde a eleição.

A passeata foi até a prisão de Akrestina, uma das principais da capital, exigir que presos políticos sejam soltos. Segundo entidades de direitos humanos, há 77 presos políticos atualmente no país.

Entre eles, além dos dois membros do conselho de oposição, estão dois dos principais candidatos impedidos por Lukachenko de concorrer na eleição, Viktor Babariko e Serguei Tikhanovski, marido de Svetlana Tikhanovskaia, que assumiu a candidatura depois que ele foi preso e liderou uma frente de oposição.

Aleksiévich disse neste domingo que Lukachenko foi surpreendido com a popularidade da candidata. “A sociedade bielorrussa é patriarcal, e ele jamais imaginou que pudesse ser batido por uma mulher.”

As bielorrussas viraram uma marca dos protestos antiditadura, desde que foram às ruas vestidas de branco e vermelho e levando flores, na primeira semana após a eleição. As correntes de solidariedade desconcertaram os policiais, que até então vinham reprimindo brutalmente os atos.

Para evitar detenções crescentes, neste sábado (3) as mulheres "atomizaram" seu movimento semanal, percorrendo as principais avenidas da cidade sozinhas ou em duplas, levando flores, em vez de marcharem todas juntas.

Pela primeira vez desde o início dos atos, nenhum jornalista estrangeiro foi autorizado a trabalhar neste final de semana: todas as credenciais foram anuladas e, segundo o regime, os correspondentes serão recadastrados a partir de segunda (5).

Repórteres de veículos bielorrussos também tiveram a cobertura dificultada pelas tropas de choque. Ao menos cinco foram detidos quando reportavam passeatas, “para averiguação de documentos”, segundo a polícia.

Aleksiévich, que é também jornalista, afirmou que as manifestações atuais a fazem lembrar-se dos anos 1990, ao final do domínio soviético.

“Íamos para a praça gritar ‘liberdade!’, mas tínhamos apenas uma ideia romântica e literária de liberdade. Então percebemos que o caminho é longo e difícil. Ao virar da esquina, encontramos apenas devastação econômica e barbárie, pronta para colocar a cabeça para fora a qualquer momento”, afirmou a escritora.

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