Ao contrário de Bolsonaro, ex-presidentes brasileiros foram rápidos em parabenizar líderes americanos

De Sarney a Temer, regra tem sido saudar sucesso nas urnas de eleitos para a Casa Branca

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Brasília

O silêncio de Jair Bolsonaro diante da eleição do democrata Joe Biden nos Estados Unidos contrasta com o comportamento de outros presidentes brasileiros. Eles não tardaram em enviar cumprimentos a líderes americanos recém-eleitos.

Em 1988, os americanos foram às urnas em 8 de novembro e escolheram o republicano George H. W. Bush como presidente do país. A Folha do dia 10 trouxe a manifestação do então presidente José Sarney, que rasgou elogios a Bush.

O presidente Jair Bolsonaro discursa no Palácio do Planalto, em Brasília
O presidente Jair Bolsonaro discursa no Palácio do Planalto, em Brasília - Lucio Tavora - 10.nov.20/Xinhua

Para Sarney, os americanos confiaram na "liderança, no espírito público e na ação de estadista" do novo líder dos EUA, que era o vice-presidente de Ronald Reagan.

Quatro anos depois, foi a vez do então presidente Itamar Franco felicitar Bill Clinton por ter vencido o pleito disputado em 3 de novembro.

Itamar enviou um telegrama a Clinton no dia seguinte e classificou o êxito do jovem governador do Arkansas como uma "vitória da democracia".

"Nós nos unimos ao povo norte-americano nessa celebração", disse o brasileiro à época. "A melhor arma da democracia é sua capacidade de renovação dentro da lei e da ordem."

Em 1996, Clinton se reelegeu com folga numa votação ocorrida em 5 de novembro.

A Folha do dia 7 informou que o então presidente Fernando Henrique Cardoso —que manteve uma estreita relação com Clinton ao longo do seu mandato— enviara carta ao democrata dizendo que estava disposto a auxiliá-lo a "construir uma ponte" para o próximo século.

FHC também aproveitou as felicitações para convidar Clinton a visitar o Brasil.

Joe Biden se tornou presidente eleito no sábado (7), tendo vencido o pleito concluído na terça-feira (3).

No sistema descentralizado dos EUA, o vencedor é conhecido após projeções da imprensa com base nas apurações estaduais. Normalmente o anúncio da imprensa é suficiente para que o perdedor admita o resultado, mas Donald Trump insiste, sem apresentar provas, que houve fraude eleitoral.

O republicano não reconhece a derrota e desencadeou uma guerra judicial para tentar comprovar as acusações de irregularidades.

Admirador de Trump, Bolsonaro é um dos poucos líderes que ainda não parabenizaram Biden, que já foi felicitado inclusive por aliados do atual presidente americano, como Boris Johnson (Reino Unido) e Binyamin Netanyahu (Israel).

A eleição dos EUA que também teve um tumultuado período pós-votação foi a de 2000, quando George Bush —filho do homem parabenizado por Sarney em 1988— enfrentou o então vice-presidente Al Gore.

A população foi às urnas em 7 de novembro, mas na noite da disputa ainda não estava claro quem era o vencedor. A margem na Flórida para Bush foi tão estreita que houve um processo de recontagem.

Gore, que havia ligado para Bush para parabenizá-lo, voltou atrás no gesto. Assim foi dada a largada para uma batalha nos tribunais que se arrastou por um mês. Finalmente, a Suprema Corte do país determinou que a recontagem fosse interrompida, chancelando a vitória de Bush.

Especialistas alertam, no entanto, que o cenário em 2000 era bastante diferente do atual. A distância entre Bush e Gore na Flórida chegou a estar na casa das centenas de votos, e todo o litígio se concentrou em um estado, que numa apertada corrida no Colégio Eleitoral definiria quem chegaria à Casa Branca.

Já Trump terá de conseguir vitórias judiciais em diferentes estados, inclusive em locais onde Biden lidera por margens confortáveis, o que faz analistas classificarem suas chances de sucesso como mínimas.

Em 2000, segundo lembra Rubens Barbosa, que chefiava a embaixada do Brasil em Washington, o tom assumido pelo governo FHC foi de prudência diante de uma luta nos tribunais que se arrastou por um mês e que de fato poderia reverter o cenário.

"A situação é totalmente diferente. Primeiro porque era um único estado, e ele [Gore] estava perdendo na Flórida. Eles [democratas] questionaram 55 mil votos que, se fossem apurados, reverteriam a eleição. Aí o Bush pediu para a Suprema Corte suspender a recontagem", afirma.

"Agora o Trump está alegando várias coisas: ele está querendo recontagem, anulação de votos, é totalmente diferente. [Ele] está considerando ilegais os votos que vieram por correio, o que nunca foi questionado. E são vários estados, três, quatro estados. Lá [em 2000] era um estado só."

Fernando Henrique Cardoso enviou as felicitações a Bush depois da decisão da Suprema Corte que lhe garantiu a Presidência.

FHC disse que os dois países estavam "diante de uma excepcional oportunidade" e que esperava um "aprofundamento do diálogo" com o americano.

Na disputa pela reeleição, Bush teve uma vitória um pouco mais folgada e recebeu rápidos cumprimentos do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva —que manteve bom relacionamento com seu contemporâneo republicano.

Lula transmitiu "calorosas felicitações" a Bush e pontuou: "A vitalidade das nossas democracias é um entre tantos outros fatores de convergência e aproximação entre Brasil e Estados Unidos".

Em 2008, no dia seguinte à eleição do primeiro presidente negro dos Estados Unidos, Lula classificou a vitória de Barack Obama como um "feito extraordinário". O petista também disse que esperava uma relação mais forte de Obama com a África e com a América Latina.

A sucessora de Lula, Dilma Rousseff, tampouco demorou a dar os parabéns pela reeleição de Obama, em novembro de 2012. Ao deixar uma cerimônia em Brasília no dia posterior à eleição, Dilma disse que ligaria para o americano. "Eu vou dar os parabéns a ele", afirmou, fazendo o formato de coração com as mãos e de positivo com os dois polegares.

Quatro anos depois, o então presidente Michel Temer comentou o resultado das eleições dos EUA logo após a confirmação da vitória de Trump.

Auxiliares de Temer preferiam que a vencedora tivesse sido a democrata Hillary Clinton. Mas isso não impediu o mandatário brasileiro de elogiar o discurso da vitória de Trump, destacando que o republicano fizera uma fala "moderada" e um aceno "à união".

Na ocasião, Temer disse que ligaria para parabenizar o americano.

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