Descrição de chapéu Eleições EUA 2020

Citando Lula e George Soros, brasileiros que votaram em Trump veem fraude em eleição

Na Flórida, imigrantes dizem que Justiça reverterá resultado; em estados democratas, celebram vitória

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Viçosa (MG)

As projeções da mídia americana deram vitória a Joe Biden, mas brasileiros que vivem nos Estados Unidos e votaram em Donald Trump afirmam acreditar na tese do presidente, de que houve fraude e que ele conseguirá reverter o resultado na Justiça.

Também defendem que o republicano teria aceitado a derrota caso a apuração, na visão deles, tivesse sido honesta.

Um deles é o empresário Edson Delana, 56, que é tão fã de Trump que estampou o rosto do republicano em dois outdoors de sua cidade natal, Governador Valadares (MG) para mostrar que o político tem apoio de imigrantes como ele, que chegou aos EUA há mais de 30 anos. “Isso ainda vai dar muito pano para manga. Provavelmente o Trump vai virar porque está tendo muitas provas de fraude”, diz.

Outdoor faz campanha para Donald Trump na cidade de Governador Valadares, em Minas Gerais
Outdoor faz campanha para Donald Trump na cidade de Governador Valadares, em Minas Gerais; o imigrante brasileiro Edson Delana pagou a propaganda - Sueli Siqueira/arquivo pessoal

Morador de um dos poucos condados da Flórida que não elegeram o atual presidente —que, no estado como um todo, foi vencedor—, Edson ajudou a fiscalizar um local de votação na última terça-feira (3), dia da eleição, e afirma ter presenciado irregularidades, como uma mesa com quatro pessoas distribuindo propaganda democrata dentro do recinto.

“Eu e um amigo avisamos o porteiro, e os caras tiveram que sair, mas ficaram até as 19h30 entregando esse material do lado de fora. Isso só em uma área de votação, imagina em todas as outras", diz.

"É tudo gente paga pelo George Soros. Esse povo do George Soros trabalhou dentro das áreas de votação, o que mostra que houve fraude”, completa, referindo-se ao bilionário da Open Society, considerado inimigo por grupos conservadores.

Edson citou outras suspeitas que circulam entre republicanos, como de que um software teria transferido votos de Trump para Biden em Michigan e de que votos de pessoas mortas teriam sido computados. “Os conservadores americanos são muito ingênuos. Eles acham que todo mundo é honesto. Só que a esquerda é muito corrupta. Agora eles estão acordando [e entrando na Justiça]."

Também diz que confia apenas em pesquisas que projetaram vitória de Trump e que se Biden tivesse vencido de fato, os republicanos reconheceriam. “Quando o [Barack] Obama ganhou, ele realmente ganhou. Mas esse Biden não ganharia nem para vereador. O Trump aqui é amado. Se você for a um comício dele, ele parece um de nós. Diferente do Obama, de muitas estrelas, ele sabe lidar com o povo.”

Evangélico, Edson afirma também que o republicano é "abençoado" por ter tido a chance de indicar três juízes à Suprema Corte durante seu mandato. “Para mim, Trump é usado por Deus. E ele não vai se entregar fácil. Se o Biden ganhar roubado, ele vai brigar até o final.”

Também morador da Flórida, o caminhoneiro Valdir é outro que desconfia do resultado anunciado neste sábado, especialmente em estados com governadores democratas. O brasileiro, que pediu para não ter o sobrenome divulgado, cita especialmente a Pensilvânia, cuja apuração levou Biden a conseguir os votos necessários para a vitória.

“Nos estados com governos de esquerda aconteceu muita coisa estranha. Já acharam fraude em chip de computador, voto de pessoa falecida, gente que votou duas vezes, pelo correio e presencialmente. O homem [Biden] não tinha chance nenhuma na Pensilvânia e uma semana atrás deu entrevista dizendo que ia ganhar lá. Ele já sabia que isso ia acontecer”, afirma, completando que o que aconteceu "nem parece que foi nos Estados Unidos".

A média de pesquisas de intenção de voto, no entanto, indicavam vantagem de cinco pontos percentuais para Biden no Estado. "É um absurdo, é coisa de Brasil na época do Lula, coisa de Venezuela, com perdão da palavra, uma coisa bem baixa. Acho que o homem [Trump] não vai engolir fácil, não”, completa.

Para Valdir, os discursos do atual presidente contra imigrantes dizem respeito àqueles que vão para os EUA “para fazer arruaça, roubar, bagunçar”. “Se você suja as mãos, trabalha duro, paga imposto e respeita a lei, você tem tudo aqui.”

Casado com uma americana, diz que conseguiu convencer a esposa, que tinha “um lado de esquerda”, a votar em Trump. Seu temor é que os impostos aumentem com os democratas reassumindo o poder.

“Trump fez muita coisa em relação a emprego, segurança, contra o terrorismo, o ISIS [sigla em inglês para Estado Islâmico]. Na minha opinião, a América está uma maravilha para viver.”

O brasileiro diz que confia que a Suprema Corte irá acatar a tese de Trump de que houve fraude na eleição e acha que “todos os juízes das Supremas Cortes do mundo deveriam ser conservadores”.

“Os da direita sempre têm a resposta certa para qualquer assunto. Para todos os que me ligam, eu digo: ‘fica tranquilo que [o resultado] será revertido’.”

Em Nova Jersey e Massachusetts, comemoração

Enquanto isso, em Nova Jersey e Massachusetts, outros dois estados com um grande número de brasileiros e que tradicionalmente elegem democratas, o clima entre os imigrantes é majoritariamente de comemoração.

“Estamos começando a acreditar que o pesadelo está terminando”, diz a psicóloga Viviane Wilkens, 46. “Não tenho dúvidas de que o Biden vai ser melhor para os brasileiros. O Partido Democrata é mais pelo social, pelo imigrante.”

Nos Estados Unidos há 23 anos, ela obteve a cidadania em 2005. Desde então, sempre votou e afirma que a maioria dos brasileiros naturalizados faz o mesmo. “Estamos acostumados a votar. É um dever cívico que a gente leva a sério."

Viviane é registrada no Partido Democrata e doou dinheiro para a campanha de Biden, apesar de ter apoiado outro pré-candidato nas primárias, Bernie Sanders. Neste ano, votou pelo correio, antecipadamente. Ela admira especialmente a vice de Biden, Kamala Harris. “Ela é um tremendo modelo de força, superação. Uma mulher negra, de pais estrangeiros, chegar onde chegou.”

O marido de Viviane, americano, vota em Trump —”infelizmente”, ressalta ela. A brasileira afirma que a família dele sempre foi republicana e que o fato de ter se casado com uma imigrante não o fez mudar de ideia.

“Eles não pensam nessa parte da imigração. Só querem menos intromissão do governo na vida deles. Eu aponto para ele: como você pode apoiar esse homem que fala que não pode ver uma mulher bonita que tem que tocar, que não respeita ninguém? Mas eles focam outra coisa, o foco do republicano é em fazer dinheiro.”

Viviane diz não acreditar na tese de fraude defendida por Trump e seus apoiadores nem que o atual presidente conseguirá reverter o resultado na Justiça. “Os números estão claros. Ele fez muito barulho e tem muito dinheiro, mas agora é nossa vez de novo.”

Em ​Somerville, nos arredores de Boston, noestado de Massachusetts, a funcionária pública Regina Bertholdo, 59, também gostou de ver Trump derrotado, mas se diz decepcionada com a quantidade de votos que o republicano recebeu.

“Acredito que se não fosse a pandemia ele ganharia de lavada. Para mim, ele é um monstro, e fiquei indignada de ver quanta gente pensa como ele. Isso vai ser perigoso na nossa sociedade. As minorias vão ter que se fortalecer”, afirma.

Ela diz não entender como outros brasileiros puderam votar em Trump e considera a política democrata mais alinhada com as necessidades dos imigrantes e de outras minorias.

Para Regina, “muita água vai rolar até janeiro [mês da posse]". “Vamos ver o quanto o Trump vai resistir. Ele não vai largar esse osso”, diz, mas acrescenta que não acredita que ele conseguirá reverter o resultado. “Só se tiver uma revolução no país.”

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