As forças especiais de elite da Austrália mataram ilegalmente 39 civis e prisioneiros afegãos, inclusive por meio de execuções sumárias que seriam parte de rituais de iniciação, de acordo com uma investigação militar a ser enviada para um promotor especial de crimes de guerra.
Na quarta (18), o general Angus Campbell admitiu a existência de provas críveis dos crimes cometidos. "Ao povo afegão, em nome da Força de Defesa Australiana, sinceramente e sem reservas peço desculpas por quaisquer atos repreensíveis por parte dos soldados australianos", declarou ele.
"Algumas patrulhas ignoraram a lei, regras foram quebradas, histórias foram inventadas, mentiras foram contadas e prisioneiros foram mortos", acrescentou a principal autoridade do Exército australiano.
Após os ataques de 11 de setembro de 2001 nos EUA, mais de 26 mil soldados australianos foram enviados ao Afeganistão para lutar ao lado dos americanos e das forças aliadas contra o Taleban, a facção terrorista Al-Qaeda e outros grupos radicais islâmicos.
As tropas de combate australianas deixaram o país em 2013. Desde então, inúmeros relatos vieram à tona, às vezes brutais, sobre a conduta de unidades de forças especiais de elite.
Segundo Campbell, que chamou a investigação de um "vergonhoso balanço" para a instituição que dirige, os crimes incluem casos em que novos membros de patrulha teriam sido forçados a atirar em um prisioneiro para cometer seu primeiro assassinato, em uma prática conhecida como 'sangramento'".
O relatório também apresenta evidências de que as tropas estiveram envolvidas em "competições de contagem de cadáveres" e acobertamento de assassinatos ilegais.
A investigação, de 465 páginas e conduzida pelo inspetor-geral do Exército, trata de eventos entre 2005 e 2016 e detalha dezenas de assassinatos ocorridos "fora do calor da batalha".
O documento recomenda que 19 pessoas sejam entregues à Polícia Federal da Austrália, que uma indenização seja paga às famílias das vítimas e que o Exército realize uma série de reformas.
Campbell deu um passo além, dizendo que os envolvidos deixaram uma "mancha" em seu regimento, nas Forças Armadas e no país e que seriam encaminhados ao investigador especial para crimes de guerra.
O general pediu a revogação de algumas medalhas concedidas às forças de operações especiais que serviram no Afeganistão entre 2007 e 2013. Já o premiê Scott Morrison, por sua vez, pediu aos australianos na semana passada que se preparem para "verdades cruéis e honestas" contidas no documento, que censura muitos detalhes.
O gabinete do presidente afegão, Ashraf Ghani, disse que Morrison "expressou sua mais profunda tristeza com a má conduta", e o Ministério das Relações Exteriores do Afeganistão, ainda que tenha classificado as ações descritas no relatório como "imperdoáveis", reconheceu que a divulgação do documento é um "passo importante em direção à justiça".
A imprensa australiana fez eco a várias acusações graves contra os militares do país, como no caso de um homem que foi morto para abrir espaço em um helicóptero ou o de um menino de seis anos assassinado durante uma operação de busca em uma residência.
O episódio foi revelado em 2017, quando a emissora ABC divulgou os "Arquivos Afegãos", uma série de investigações nas quais as forças australianas foram acusadas de terem matado homens e crianças desarmados no Afeganistão.
Em resposta, a polícia abriu uma investigação contra dois jornalistas do canal, Daniel Oakes e Sam Clark, suspeitos de terem arquivos confidenciais. A sede da rede em Sydney foi invadida no ano passado, mas o caso acabou sendo arquivado.
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