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Eleições EUA 2020

Trump conta com maioria na Suprema Corte, mas precisa superar instâncias inferiores

Diferentemente do que acontece no Brasil, não é possível levar o caso direto ao tribunal máximo

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Juliana Cesario Alvim

Doutora e mestre pela Uerj, com LLM pela Yale Law School, é professora da Faculdade de Direito da UFMG

Em setembro, Donald Trump anunciou: “Eu acho que isso [a eleição presidencial] vai acabar na Suprema Corte”. Em seguida completou: “E eu acho que é muito importante que nós tenhamos nove ministros”, fazendo referência à vaga aberta pela morte da liberal Ruth Bader Ginsburg e dando ao presságio cara de aposta.

No último sábado (7), após o resultado anunciado a favor de Joe Biden, o presidente americano tuitou: “A Suprema Corte dos Estados Unidos deveria decidir!”. Trump parece contar com a maioria conservadora do tribunal como último recurso para reverter o resultado das urnas. Para isso, enfrentará uma série de obstáculos não só jurídicos, mas também fáticos.

Diferentemente de países como o Brasil, em que é possível levar questões políticas sensíveis e controversas direto para a mais alta corte, nos EUA esses casos devem, em regra, passar primeiro por instâncias inferiores.

Com isso, o Partido Republicano, de Trump, vem fomentando litígios em torno de questões eleitorais perante tribunais locais sem que tenha, até o momento, obtido vitórias expressivas. Dos casos ainda em curso, apenas um deles chegou à Suprema Corte.

O caso discute a extensão em três dias do prazo para recebimento de votos pelo correio, determinada pela Suprema Corte da Pensilvânia. Os republicanos alegam que essa decisão teria usurpado a competência do legislativo estadual para determinar as regras eleitorais.

Ainda em setembro, já na Suprema Corte, um 4 a 4 fez com que a flexibilização de três dias da Pensilvânia se mantivesse em vigor, deixando aberta a possibilidade de que o mérito do caso fosse revisitado no futuro. A ministra Amy Coney Barrett, recém-empossada, não participou da decisão. Em seguida, o ministro Samuel Alito determinou que os votos em questão fossem contabilizados à parte.

Se o caso voltar a ser enfrentado, duas decisões recentes podem indicar caminhos que serão tomados. Em outubro, a Suprema Corte decidiu que votos à distância só seriam contabilizados se chegassem até a data do fechamento das eleições no estado de Wisconsin, e manteve em vigor exigência de assinatura de testemunha em votos realizados à distância no estado da Carolina do Sul.

Em ambas, a corte privilegiou regras eleitorais mais restritivas em detrimento de flexibilizações estabelecidas pela Justiça que poderiam se mostrar mais inclusivas em um contexto de pandemia. As ações, contudo, impugnavam decisões da Justiça federal (e não estadual como no caso da Pensilvânia) e em uma delas houve acomodação para levar em conta os votos de eleitores que já haviam votado (Wisconsin).

Essas considerações, entretanto, não são suficientes para definir o desfecho de Trump. Não só pelas controvérsias e nuances jurídicas envolvidas. Mas porque talvez os elementos fundamentais para determinar seu destino sejam fáticos, e não jurídicos.

Toda a movimentação dos republicanos nos tribunais parece se inspirar em um só precedente: Bush v. Gore. Na decisão de 2000, cinco conservadores formaram a maioria que interrompeu a recontagem de votos no estado da Flórida, determinada pelo judiciário estadual em razão de problemas com a perfuração das cédulas eleitorais.

Segundo a Suprema Corte, a multiplicidade de parâmetros utilizados pelos condados do estado para a recontagem violaria a cláusula constitucional de igualdade, e não haveria tempo hábil para uniformizá-los.

A decisão garantiu a vitória do republicano George Bush sobre seu rival democrata Al Gore na Flórida pela diferença de 537 votos. Assegurou, assim, seus 25 delegados e um total de 271 delegados nacionalmente, um a mais do que o necessário para vencer as eleições.

Na ocasião, uma maioria conservadora foi crucial para garantir, nos tribunais, a vitória eleitoral de Bush. A decisão da Suprema Corte, embora criticada por interferir diretamente no pleito eleitoral, foi capaz de definir para onde o fiel da balança penderia.

É nisso que Trump parece mirar. Agora, porém, a situação é diferente. O caso da Pensilvânia, pendente na Suprema Corte, discute apenas uma pequena parcela do total de votos do estado que, segundo indicam os analistas, seria insuficiente para virar o resultado local.

E, ainda que virasse, isso não seria suficiente para mudar o cenário nacional. Isso porque Biden pode alcançar os 270 delegados que precisa para vencer independentemente dos 20 da Pensilvânia.

Por isso, para virar o jogo, Trump precisaria combinar eventual vitória na Suprema Corte no caso da Pensilvânia com outras ações judiciais expressivas e/ou recontagens capazes de virar outros estados.

Mas em um cenário como esse, a própria Suprema Corte pode simplesmente optar por não decidir o caso e escolher ficar fora da disputa política e eleitoral.

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