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Bukele repete em El Salvador padrão de corrupção de antecessores

Presidente governa país no ritmo das redes sociais, mas gradualmente percebe que elas não são suficientes

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​Dardo Justino Rodríguez

Analista, comunicador e consultor independente para organizações e agências internacionais. Diretor nacional da Presagio Consulting Honduras.

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Nayib Bukele é uma dessas pessoas que despertam paixões. Ou você o ama ou o odeia. Não é comum que alguém se mostre indiferente à sua figura.

Até hoje, ele é o presidente mais popular da história democrática de El Salvador. Nem seus muitos erros como presidente nem sua notória vocação autoritária deixaram marcas em sua popularidade.

E embora seja verdade que ele não atrai mais tanto apoio como no início de sua administração, esse declínio não é significativo.

Estratégia bem-sucedida

Nayib Armando Bukele Ortez, nascido em 1981, tornou-se uma estrela que, aparentemente, podia fazer tudo para fazer o país avançar.

Uma campanha eleitoral muito bem orquestrada, mais uma presença perfeitamente estudada nas redes sociais, lhe deu, nas eleições de 3 de fevereiro de 2019, o que ele e sua comitiva almejavam: a Presidência da República.

Isso sem que o eleitorado percebesse as várias queixas contra ele como prefeito de Nuevo Cuscatlán e San Salvador por corrupção, nepotismo, misoginia e abuso de autoridade.

O presidente salvadorenho chegou ao poder em um contexto marcado pela ineficácia e corrupção dos governos anteriores da Aliança Republicana Nacional (Arena) e da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN).

Esses governos minaram as esperanças de uma população que, cansada, cedeu aos cantos da sereia de um jovem, mas não inexperiente, empresário e político que acabara de se tornar prefeito em Nuevo Cuscatlán e na capital, San Salvador.

O presidente, que com sua chegada ao poder quebrou a hegemonia bipartidária que prevalecia desde o fim da guerra civil em 1992, tem governado no ritmo das redes sociais, mas está gradualmente percebendo que elas não são suficientes.

O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, palestra em San Salvador
O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, palestra em San Salvador - Jose Cabezas - 30.set.2020/Reuters

Tanto ele quanto seu irmão Karim, praticamente seu braço direito, são habilidosos na comunicação. Nayib é assim devido ao seu carisma e à sua capacidade histriônica, enquanto Karim é assim devido à sua inteligência e sagacidade quando se trata de conceber uma campanha.

“Neste longo ano e meio de Presidência, Bukele demonstrou amplamente que sua vocação não é o diálogo, mas o confronto, a calúnia, a mentira e a perseguição.”

Assim é descrito o atual presidente por um antigo colega de quando ele era uma das estrelas em ascensão da FMLN. Essa pessoa, por razões de segurança, solicitou o anonimato.

“Seus ‘apertos’ na Assembléia Nacional, bem como a invasão de sua sede com os militares e a polícia, podem ser considerados violações da independência de poderes estabelecida pela Constituição Nacional.”

Entretanto, os políticos e as instituições estão tão desacreditados que poucos levantaram sua voz para denunciar tal ultraje. “É nisso que o presidente Bukele baseia suas ações”, diz essa mesma pessoa.

Corrupção

O renomado analista político salvadorenho Napoleão Campos diz que, durante a pandemia, ele (Bukele) exibiu o mesmo padrão de corrupção de seus antecessores.

“A essa altura, a Procuradoria-Geral da República acumulou mais de 17 processos sobre compras anômalas e irregulares típicas de corrupção envolvendo ministros como os de Saúde, Agricultura e Pecuária, Obras Públicas e do Fundo Ambiental, entre outros.”

Campos acrescenta que, como se isso não fosse suficiente, diante das acusações internacionais de violação do Estado de Direito e da Independência Judicial –especialmente as feitas por congressistas estadunidenses e membros do Parlamento Europeu–, “Bukele não deixou de minar os fundamentos da democracia”, enquanto a economia entrou em colapso em 9% ou mais, como indicado pelo Banco Mundial e pelo FMI.

Nesse contexto, “o país começou a ver programas de ajuda externa sendo cancelados, como o Fundo do Milênio dos EUA, e outros programas podem estar em perigo de não serem ratificados...”, conclui o analista.

Nepotismo

O presidente Bukele apelou desde o primeiro dia para alguns de seus irmãos e outros parentes como conselheiros e operadores de sua total confiança.

Nayib tem nove irmãos, mas apenas três deles, os mais jovens, formam o núcleo principal que o cerca, o aconselha e opera em seu nome. São eles: Karim Alberto (33 anos), Yusef Alí e Ibrajim Antonio (gêmeos, de 30 anos), todos filhos de Armando Bukele Kattán, que morreu em 2015, e Olga Marina Ortez.

Nenhum dos três exerce cargo público, o que significa que não são funcionários do governo, mas operam com total facilidade e liberdade com a aprovação explícita ou tácita do presidente.

Como eles não ocupam cargos públicos, não estão sujeitos a nenhuma das leis da Controladoria que permitem a avaliação da conduta dos funcionários; portanto, estão isentos de julgamento político.

Nayib e Karim são os estrategistas que definem a direção da Presidência. Enquanto isso, Yusef e Ibrahim são conselheiros que lidam com áreas específicas.

Enquanto Yusef trabalha no gabinete econômico, Ibrahim está encarregado das negociações com grupos econômicos e das missões especiais de seu irmão Nayib, entre as quais se destacam os projetos de reativação econômica.

Gabriela Rodriguez, esposa do presidente, está a cargo do gabinete social, uma área que geralmente é a favorita das primeiras-damas.

Manifestante contrária ao governo salvadorenho segura cartaz com os dizeres 'Bukele opressor' em protesto no Congresso Nacional, em San Salvador
Manifestante contrária ao governo salvadorenho segura cartaz com os dizeres 'Bukele opressor' em protesto no Congresso Nacional, em San Salvador - Jose Cabezas - 10.fev.2020/Reuters

'Desencanto'

Bukele atingiu o topo da vida política e institucional de seu país graças ao cansaço da população diante da corrupção galopante e da ineficiência da classe dominante, e a uma campanha de mídia muito inteligente.

Entretanto, após um ano e meio de administração, o presidente não se mostrou inclinado a introduzir mudanças profundas e positivas em um país mergulhado na pobreza e no desespero.

“Um povo como o povo salvadorenho, conhecido por sua capacidade de trabalho e iniciativa, não seguirá esse presidente por muito mais tempo, porque ele não responde às necessidades mais urgentes ou não cumpre suas promessas de campanha", diz um diplomata centro-americano em San Salvador, que quer manter sua identidade em sigilo.

E, embora o presidente ainda mantenha altos índices de aprovação, nota-se um declínio que, embora não significativo, “está tomando a forma de desencanto”, conclui o diplomata.

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Tradução de Maria Isabel Santos Lima

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