Descrição de chapéu terrorismo

França condena 14 cúmplices de ataques a Charlie Hebdo e supermercado

Eles foram considerados culpados por apoio a atentados; pena chega a prisão perpétua

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Paris e São Paulo | AFP e Reuters

Em um julgamento histórico que durou mais de três meses e foi diversas vezes interrompido devido à pandemia de coronavírus, a Justiça da França condenou os 14 envolvidos nos atentados contra o semanário satírico Charlie Hebdo e um supermercado de produtos kosher em Paris em janeiro de 2015.

Eles foram considerados culpados por terem prestado apoio logístico aos irmãos Said e Cherif Kouachi —que mataram 12 pessoas no jornal no dia 7— e a Amedy Coulibaly —que atirou contra uma policial no dia 8 e contra quatro judeus no dia 9 no mercado.

As sentenças vão de quatro anos a prisão perpétua e foram divulgadas quando os franceses enfrentam uma nova onda de terrorismo islâmico, com a decapitação de um professor e a morte de três pessoas em um ataque a faca na basílica de Nice, no sul do país, em outubro.

Os irmãos Kouachi invadiram a Redação do Charlie Hebdo armados, disseram que representavam um braço da organização terrorista Al Qaeda e dispararam gritando "Allahu akbar!" (Deus é maior), segundo relatos de sobreviventes. Mataram 12 pessoas, incluindo alguns dos chargistas mais célebres da França.

O jornal tinha publicado charges que ridicularizavam Maomé —os muçulmanos consideram uma blasfêmia desenhar a figura do fundador do islã.

O ataque foi o mais mortífero na França desde 1961, e os irmãos franceses de origem argelina foram mortos pela polícia. Um dia após o ataque ao jornal, Coulibaly matou uma policial municipal em uma troca de tiros e, no dia seguinte, mais quatro judeus feitos reféns em um supermercado kosher em um subúrbio de Paris. Ele também acabou morto pela polícia.

A pena mais dura, de prisão perpétua, foi para Mohamed Belhoucine, considerado mentor religioso de Coulibaly. Ele foi julgado à revelia —acredita-se que ele tenha sido morto na Síria após os atentados.

Hayat Boumeddiene, namorada de Coulibaly e também julgada à revelia, foi condenada a 30 anos de prisão. Acredita-se que ainda esteja viva e fugindo de um mandado de prisão internacional —os promotores se referem a ela como uma “princesa do Estado Islâmico”.

Ali Riza Polat, apresentado como o braço direito do atirador, era o único dos três principais réus presente no julgamento e recebeu pena de 30 anos de prisão.

Polat admitiu no tribunal que praticou crimes como tráfico de drogas, mas negou ter qualquer conhecimento de um complô terrorista. "Não fiz todas as coisas que dizem que eu fiz", afirmou.

A advogada que o representa disse que vai recorrer da sentença. Os advogados de defesa consideram que as provas não são convincentes e advertiram contra a tentação de querer transformar os acusados em exemplo para atenuar a ausência dos autores materiais dos ataques.

A promotoria também solicitou penas entre 5 e 20 anos de prisão para os demais acusados, suspeitos de fornecer armas e equipamentos "com conhecimento do compromisso jihadista" dos autores dos atentados, segundo o procurador-geral.

Entre eles, Amar Ramdani recebeu a sentença de 20 anos de prisão, Nezar Mickael Pastor Alwatik foi condenado a 18 anos, e Willy Prévost, a 13 anos.

As acusações relacionadas com o terrorismo foram retiradas para seis dos réus considerados culpados de crimes menores —ainda assim, as penas variam entre 4 e 10 anos de prisão.

“O fato de escolher as vítimas precisamente por serem jornalistas, ou membros das forças de segurança, ou de religião judaica, demonstra em si mesmo o desejo de semear o terror nos países ocidentais”, disse o juiz presidente ao tribunal.

Durante o julgamento, sobreviventes prestaram depoimentos e voltaram a evidenciar o horror dos ataques. A colunista Sigolene Vinson, que estava no Charlie Hebdo durante o massacre, descreveu o "silêncio mortal" na Redação, enquanto os colegas estavam mortos ao seu redor.

Zarie Sibony, ex-caixa do supermercado Hyper Cacher, descreveu como caminhou sobre corpos nos corredores durante o confronto de quatro horas entre Coulibaly e a polícia.

Na capa de sua edição mais recente, o jornal satírico publicou um desenho de Deus sendo levado em um carro de polícia com a legenda "Deus colocou em seu lugar".

“Hoje [quarta-feira] será encerrado finalmente o ciclo de violência que começou há quase seis anos na Redação do Charlie Hebdo”, escreveu em um artigo o diretor do semanário satírico, Laurent Sourisseau, também conhecido pelo pseudônimo Riss, sobrevivente do ataque. “Ao menos no plano penal porque, no humano, as consequências nunca serão apagadas.”

Na véspera do início do julgamento, o jornal republicou as caricaturas do profeta Maomé que transformaram a Redação em alvo dos terroristas. Três semanas depois, um paquistanês feriu duas pessoas diante da antiga Redação da revista em um ataque com faca.

O governo do presidente Emmanuel Macron apresentou, em outubro, um projeto de lei para combater o que ele chama de "islamismo radical" e que pretende endurecer o controle sobre os locais de culto e proibir algumas práticas.

Macron anunciou medidas como a obrigatoriedade da assinatura de uma carta de laicismo a qualquer associação que solicitar subvenção pública, uma supervisão maior de escolas religiosas privadas e uma limitação estrita do ensino em casa.

As restrições serão apresentadas em um projeto de lei baseado em uma regra de 1905 que oficialmente separa a igreja do Estado na França. O país europeu já proíbe o uso do véu islâmico nas escolas e para funcionárias públicas no ambiente de trabalho.

As declarações do presidente foram criticadas nas redes sociais por alguns acadêmicos islâmicos radicados na Europa, que afirmaram que suas palavras vão fortalecer o sentimento antimuçulmano.

Os 14 condenados

  • Mohamed Belhoucine, condenado à revelia a prisão perpétua por "cumplicidade em crimes terroristas", dado como morto na Síria
  • Ali Rizat Polat, 35, condenado a 30 anos de prisão por “cumplicidade em assassinatos terroristas”
  • Hayat Boumedienne, condenada à revelia a 30 anos de prisão por "associação terrorista criminosa" e "financiamento do terrorismo", em fuga
  • Mehdi Belhoucine, condenado à revelia a 20 anos de prisão por "cumplicidade em crimes terroristas", dado como morto na Síria
  • Amar Ramdani, 39, condenado a 20 anos de prisão por “participação em associação criminosa terrorista”
  • Nezar Pastor Alwatik, 35, condenado a 18 anos de prisão por “participar de uma associação criminosa terrorista”
  • Willy Prevost, 34, condenado a 13 anos de prisão por “participar de uma associação criminosa terrorista”

Condenados por “participação em uma associação criminosa não terrorista”

  • Abdelaziz Abbad, 36, condenado a dez anos
  • Metin Karasular, 50, condenado a oito anos
  • Saïd Makhlouf, 30, condenado a oito anos
  • Mohamed Fares, 31, condenado a oito anos
  • Miguel Martinez, 38, condenado a sete anos
  • Michel Catino, 68, condenado a cinco anos
  • Christophe Raumel, condenado a quatro anos
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