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Itália aperta restrições, e Natal da pandemia fica sem viagens e ceias

Novo decreto, que passa a valer na sexta (4), concentra as medidas mais rígidas na época das festas

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Milão

Quando o ministro italiano Francesco Boccia (Relações Regionais) disse, na semana passada, que neste ano o menino Jesus precisaria nascer duas horas antes, estava dado o sinal de que este será um Natal bem diferente dos outros.

A confirmação veio na noite desta quinta (3), quando o premiê Giuseppe Conte anunciou duras regras para conter a propagação do coronavírus no período de festas. E, como antecipado, a Missa do Galo, em que o nascimento de Jesus é encenado por volta da meia-noite, terá que começar mais cedo em todo o país, para que o toque de recolher noturno seja obedecido.

Decoração de Natal em loja em Milão, na Itália - Flavio Lo Scalzo - 1.dez.20/Reuters

O novo decreto, que passa a valer a partir de sexta (4), concentra as medidas mais rígidas entre os dias 21 de dezembro e 6 de janeiro, com a intenção de inibir viagens, aglomerações e festas. Isso num dos países mais católicos do mundo e onde a convivência familiar intergeracional é intensa.

Está mantido o veto a deslocamentos sem justificativa depois das 22h, e as viagens entre regiões serão proibidas nesse período, mesmo para quem tiver parentes em outro estado ou segunda casa. Nos dias 25 e 26 de dezembro e 1º de janeiro, a limitação sobe um degrau, e os italianos não poderão nem transitar entre cidades da mesma região.

Nas áreas menos afetadas, os restaurantes poderão abrir para almoços de Natal, Santo Estêvão (26/12), Ano Novo e Dia de Reis (6/1), para no máximo quatro pessoas por mesa. No jantar, devem estar fechados.

Ceias e festas de Réveillon estão vetadas inclusive em hotéis, que só poderão oferecer serviço de quarto. As estações de esqui ficam fechadas, e os navios de cruzeiros, proibidos de partir, chegar e fazer escala. Os moradores que estão fora do país podem retornar, mas devem cumprir quarentena, obrigatória também para quem fizer viagem internacional.

"A estrada para sair da pandemia é ainda longa. Devemos evitar o risco de uma terceira onda, que poderia chegar em janeiro e ser não menos violenta que a primeira e a segunda", afirmou Conte, em transmissão ao vivo por TV e redes sociais.

O premiê reconheceu que é impossível controlar o que acontece dentro das casas, mas fez um apelo para que os italianos evitem encontros entre núcleos familiares.

"Temos que entender que em um sistema liberal-democrático não podemos entrar nas casas das pessoas e impor restrições rigorosas. Mas recomendamos fortemente que não sejam recebidas em casa pessoas com quem não se convive, sobretudo nessas ocasiões, nas quais o festejamento se torna mais intenso", declarou Conte.

O anúncio aconteceu no mesmo dia em que a Itália viu o número de mortes da Covid-19 superar a mais alta marca já registrada desde o início da epidemia. Nesta quinta, foram 993 vítimas, 24 a mais que o pico anterior, de 969 óbitos, em 27 de março.

O país, que soma 58 mil mortes —e é o sexto mais afetado do mundo, em números absolutos—, conseguiu controlar a transmissão no primeiro semestre com um severo "lockdown" nacional. Depois de uma reabertura contida a partir de maio, os casos ficaram sob controle até metade de outubro, quando voltaram a subir de forma acelerada.

Para contar o repique de infecções, o governo dividiu o país, no início de novembro, em três zonas —vermelha, laranja e amarela—, e novas restrições foram aplicadas de acordo com o risco de transmissão. Dessa vez, mesmo nas áreas mais afetadas, as atividades produtivas da economia e as escolares para as crianças não foram interrompidas.

Apesar do recorde de mortes, a curva de contágio desceu nos últimos dias —o índice de infecção (RT) nacional está em 0,91—, mas a preocupação é que o período festivo deixe de novo as contaminações fora de controle. E, para isso, chegam restrições que são um balde de água fria em muitos costumes italianos.

Antes de as reuniões familiares e as viagens de férias receberem sinal vermelho, outras tradições já tinham sido derrubadas. Os mercadinhos artesanais, presentes em cidades grandes e pequenas, foram proibidos. Em Milão, neste ano, em vez das barraquinhas com ideias de presentes e comidas, a praça do Duomo, o ponto mais famoso da cidade, hospeda uma insólita tenda de vacinação contra gripe.

A cidade, onde nasceu o panetone, tem forte ligação com o Natal, e dezembro costuma ser marcado por pencas de turistas, parques temáticos, pistas de patinação no gelo e apresentações de corais. Nada disso pode acontecer agora. Também a abertura da temporada lírica do teatro Scala, outro símbolo local, foi cancelada, algo que só tinha acontecido nos anos de 1944 e 1945, devido aos bombardeios da Segunda Guerra Mundial.

Além de mexer nos rituais, as limitações da pandemia também vão comprometer a economia típica da estação. Segundo a Coldiretti, que reúne os produtores agrícolas italianos, os vetos às ceias e aos almoços de fim de ano terão impacto drástico no consumo de bebidas e comidas. No ano passado, quando em média se reuniram em volta da mesa nove pessoas, foram abertas 74 milhões de garrafas de espumantes no Natal e Ano Novo e devorados 70 milhões de quilos de panetones e pandoros.

"Do ponto de vista econômico, será um desastre. Um golpe no setor de vinhos, que já perdeu 1,4 bilhão de euros neste ano. Todas as limitações vão resultar em pequenos grupos ou pessoas sozinhas, como os idosos. E isso vai afetar o nível de consumo de anos anteriores. Tudo terá uma dimensão muito mais reduzida", diz Lorenzo Bazzana, responsável econômico da associação. "Na cabeça de muitos não se imaginava chegar a dezembro em uma situação assim. Esperamos que tudo isso fique para trás com 2020."

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