Descrição de chapéu Venezuela

Maduro vence eleições parlamentares na Venezuela em votação esvaziada

Pelo menos 18 países não reconheceram os resultados divulgados pela ditadura

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Buenos Aires

Pelo menos dezoito países manifestaram que não reconhecem o resultado das eleições parlamentares realizadas no último domingo (6) na Venezuela —como previsto, o regime do ditador Nicolás Maduro saiu vitorioso, em um processo marcado pela ausência de candidatos da oposição e pela alta taxa de abstenção.

No pleito para escolher a nova Assembleia Nacional, que tomará posse em 5 de janeiro, a coalizão chavista, formada pelo PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) e seus aliados, recebeu 68% dos votos e terá a maioria dos 227 assentos.

O ditador Nicolás Maduro discursa depois de votar em Caracas - Yuri Cortez/AFP

Segundo dados oficiais fornecidos pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral), o comparecimento foi de 31%. O Observatório Contra a Fraude, vinculado à atual AN, de maioria opositora, discorda desse dado e diz que o comparecimento não passou de 18% dos eleitores.

Nas últimas eleições parlamentares, em 2015, a participação foi de 71%.

Em um comunicado, a União Europeia disse que não reconhece o resultado por "não se tratar de um processo crível, transparente nem inclusivo". O texto chamou a atenção para o impedimento da participação de vários partidos e políticos.

Na manhã desta segunda (7), o Ministério das Relações Exteriores brasileiro rejeitou o resultado em nota assinada com outros 15 países das Américas, incluindo Canadá, Chile e Colômbia.

"Reiteramos que as eleições de 6 de dezembro (...) carecem de legalidade e legitimidade pois foram realizadas sem as garantias mínimas de um processo democrático, de liberdade, segurança e transparência, e sem integridade dos votos, participação de todas as forças políticas ou observação internacional", afirma a declaração.

"Exortamos a comunidade internacional a se unir na rejeição a essas eleições fraudulentas e a apoiar os esforços para a recuperação da democracia, do respeito pelos direitos humanos e do Estado de Direito na Venezuela", continua o comunicado.

O chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, já tinha chamado as eleições de "farsa eleitoral" no Twitter.

Também por meio do Ministério das Relações Exteriores, a Colômbia afirmou que "desconhecerá os resultados da eleição e estimulará a comunidade internacional a apoiar o povo venezuelano na recuperação da democracia".

A baixa presença dos eleitores no pleito ocorre em meio à pandemia da Covid-19 e a uma desconfiança generalizada sobre a classe política. A votação foi boicotada pela maioria das siglas e lideranças opositoras, incluindo Juan Guaidó, reconhecido como presidente interino da Venezuela por dezenas de países, e seus aliados.

"A fraude foi consumada. A rejeição majoritária do povo da Venezuela é evidente. A maioria da Venezuela deu as costas a Maduro e à sua fraude", declarou Guaidó, em referência à abstenção, em um vídeo publicado nas redes sociais.

Guaidó convocou um plebiscito, até sábado (12), para prolongar o mandato do atual Parlamento até que seja possível organizar "eleições livres, verificáveis e transparentes". Será uma consulta simbólica, pois Maduro exerce controle territorial e institucional da Venezuela, com o apoio das Forças Armadas.

A consulta popular teve início de modo eletrônico e deve culminar num ato presencial no sábado.

A Alemanha e os Estados Unidos declararam que vão continuar apoiando Guaidó como líder da oposição.

Já a Argentina e o México, que não consideram Maduro um ditador, não se manifestaram sobre a eleição de domingo.

Entre os eleitos, segundo os resultados oficiais, pela aliança governista, estão Diosdado Cabello (homem-forte do chavismo) e Cilia Flores (mulher de Maduro).

O partido do líder opositor Henri Falcón, o Avanzada Progresista, elegeu um parlamentar, Luis Augusto Romero.

"Nós recuperamos a Assembleia Nacional com a maioria dos votos do povo venezuelano. É uma grande vitória para a democracia", disse Maduro, em um pronunciamento na televisão.

A Rússia foi dos poucos países a elogiar as eleições, que chamou de "transparentes". "O processo eleitoral venezuelano foi organizado de forma mais responsável e transparente do que em alguns países que costumam se apresentar como exemplo de democracia", escreveu o Ministério das Relações Exteriores em um comunicado.

"Partimos do princípio de que a nova Assembleia Nacional será o terreno (...) para um diálogo construtivo entre todas as forças políticas" e ajudará a "superar os desacordos que existem na sociedade venezuelana por meio de negociações".

A votação não teve observadores internacionais independentes, apenas representantes de países aliados ao chavismo, como Irã e Turquia, e amigos pessoais de Maduro, como os ex-presidentes Evo Morales (Bolívia) e Rafael Correa (Equador).

O domingo de votação transcorreu de forma tranquila, com imagens de postos de votação vazios, filas enormes para conseguir combustível —o país passa por uma crise de desabastecimento de gasolina, entre outros elementos— e bares e restaurantes cheios.

A oposição denunciou a presença de quiosques conhecidos como "pontos vermelhos". Depois de votar, famílias pobres puderam comparecer a esses locais para receber caixas de comida extras.

Outro líder opositor e ex-candidato à presidência, Henrique Capriles disse que "depois de todos esses fracassos, temos de abrir-nos para novas alternativas e lançar mão de recursos novos". Capriles, porém, não ofereceu ideias concretas. Ele mesmo teve uma posição titubeante com relação ao pleito.

Primeiro, afirmou que participaria e chamou a oposição a participar. Com isso, negociou com o regime a liberação de presos políticos, como Juan Requesens. Porém, ao não conseguir adesão e não ter convencido a União Europeia a enviar observadores para acompanhar a votação, desistiu de participar. "Os venezuelanos merecem recuperar a confiança, ter uma rota verdadeira para alcançar soluções verdadeiras".

A atual Assembleia Nacional foi eleita em 2015 com maioria opositora, em um pleito considerado justo por observadores internacionais. A maioria opositora na Assembleia, no entanto, foi sufocada por Maduro. Decisões do Legislativo foram barradas no Judiciário, instância na qual há juízes ligados ao regime.

E, em 2017, a ditadura determinou a criação de uma Assembleia Nacional Constituinte, de maioria governista, que suplantou o papel da Assembleia Nacional. Essa Constituinte será encerrada neste mês, sem que uma nova Carta tenha sido criada.

Em janeiro de 2019, a Assembleia Nacional escolheu Guaidó como líder e, na sequência, ele se proclamou presidente interino. A medida teve como base artigos de Constituição que estabelecem que o presidente do Legislativo deve assumir a chefia do Executivo caso o cargo de presidente fique vago.

A oposição considera que isso aconteceu porque o pleito que reelegeu Maduro em 2018 foi marcado por fraudes —assim, Guaidó seria o comandante legítimo do país.

A estratégia até recebeu apoio de parte da sociedade venezuelana e da comunidade internacional, mas não foi suficiente para tirar Maduro do cargo. Agora, com a votação deste domingo, Guaidó e o restante da Assembleia terão que deixar oficialmente seus cargos no próximo dia 5.

A Venezuela vive há anos uma crise econômica grave, agravada por sanções dos EUA, que impedem empresas estrangeiras de fazerem negócios com o país. Com a falta de condições de vida, mais de 5 milhões de venezuelanos deixaram o país.

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