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Pornhub dissemina vídeos de pornografia infantil e de estupros

Site, que tem mais visitas que a Netflix, está infestado com material de exploração e agressão a crianças e mulheres

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Nicholas Kristof
Nova York | The New York Times

O Pornhub se orgulha por ser o rosto brincalhão e amistoso da safadeza, o site que compra um outdoor na Times Square de Nova York e paga por limpa-neves para desobstruir as ruas de Boston. A companhia doa dinheiro a organizações que lutam pela justiça racial e oferece conteúdo sexual gratuito para ajudar as pessoas a passar pelos "lockdowns" da Covid-19.

O supostamente “saudável” Pornhub atrai 3,5 bilhões de visitas por mês, mais que Netflix, Yahoo ou Amazon. O Pornhub fatura com os quase 3 bilhões de anúncios vistos no site a cada dia por visitantes. Um ranking classifica o site da empresa como o 10º mais visitado do planeta.

Pornhub
Logo do site Pornhub - Divulgação

Mas a companhia tem um outro lado: seu site está infestado de vídeos de estupro. Ela ganha dinheiro com vídeos mostrando estupros de menores de idade, pornografia de vingança, vídeos gravados por câmeras clandestinas que mostram mulheres no banho, conteúdo racista e misógino, e imagens de mulheres sendo asfixiadas, com as cabeças envoltas em sacos plásticos. Uma busca por “meninasdemenosde18”, sem espaços, ou “14anos” conduz a mais de 100 mil vídeos, em cada caso. A maioria dos retornos não mostra crianças sendo agredidas, mas muitos o fazem.

Depois que uma menina de 15 anos desapareceu na Flórida, a mãe dela a encontrou no Pornhub —em 58 vídeos pornô. Agressões sexuais a uma menina de 14 anos na Califórnia foram exibidas em vídeos postados no Pornhub e denunciadas às autoridades não pela empresa, mas por uma colega de escola da menina, que viu os vídeos. Nos dois casos, os agressores foram detidos por conta dos ataques, mas o Pornhub escapou de ser responsabilizado por veicular os vídeos e lucrar com eles.

O Pornhub é como o YouTube, no sentido de que permite que o público poste vídeos pessoais. A grande maioria dos 6,8 milhões de novos vídeos que o site lança a cada ano provavelmente envolve maiores de idade que consentiram em que suas imagens fossem usadas, mas muitos mostram abusos contra crianças e violência não consensual. Porque é impossível ter certeza de que a jovem mostrada em um vídeo tem 14 ou 18 anos, nem o Pornhub e nem ninguém mais tem uma ideia clara de que proporção do conteúdo veiculado no site é ilegal.

Diferentemente do YouTube, o Pornhub permite que esses vídeos sejam baixados diretamente de seu site. Assim, mesmo que o vídeo de um estupro seja removido a pedido das autoridades, pode já ser tarde demais: o vídeo persistirá, compartilhado de pessoa a pessoa ou subido repetidamente nos sites pornográficos.

“O Pornhub me traficou”, disse uma mulher chamada Cali. Ela afirma que nasceu na China e foi adotada por uma família americana, que a forçou a participar de vídeos pornográficos quando ela tinha nove anos. Alguns dos vídeos que a mostram sofrendo abusos terminaram no Pornhub e reaparecem regularmente no site, ela diz.

“Continuo a ser vendida, embora já faça cinco anos que deixei aquela vida”, disse Cali. Aos 23 anos, ela agora está na universidade e espera se tornar advogada —mas os vídeos do passado ainda pendem sobre ela.

“Pode ser que eu nunca consiga escapar disso”, ela disse. “Posso ter 40 anos e oito filhos, e as pessoas ainda vão estar se masturbando vendo minhas fotos.”

“Se você fizer uma busca por ‘jovem asiática’, provavelmente encontrará um dos meus vídeos”, ela acrescentou.

Na verdade, talvez não. Uma visita recente ao Pornhub revelou que o site oferecia 26 mil vídeos em resposta àquela busca. E isso não inclui os vídeos que surgem como “buscas relacionadas” sugeridas pelo Pornhub, com termos como “jovem adolescente pequenina”, “adolescente ‘petite’ muito franzina”, “adolescente asiática pequenininha” ou apenas “garota jovem”. E não inclui os vídeos sugeridos em um canal do Pornhub chamado “adolescentes exploradas Ásia”.

A questão não é de pornografia, mas de estupro. Partamos do pressuposto de que promover agressões sexuais a crianças, ou fazer sexo com qualquer pessoa que não consinta, é inadmissível. O problema nos casos de Bill Cosby, Harvey Weinstein ou Jeffrey Epstein não era o sexo, mas a falta de consentimento. O mesmo se aplica ao Pornhub.

Encontrei no Pornhub muitos vídeos que eram registros de ataques a mulheres e meninas inconscientes. Os estupradores erguiam as pálpebras das vítimas e tocavam em seus globos oculares a fim de demonstrar que elas estavam inertes.

Nos últimos meses, o Pornhub lucrou com um vídeo que mostra uma mulher nua sendo torturada por um grupo de homens na China. A companhia tira vantagem monetária de compilações de vídeos com títulos como “adolescente gritando de dor”, “adolescente degradada” e “sufocação extrema”. Se você assistir a um dos vídeos que mostram mulheres sufocadas, a página sugerirá buscas por “ela não consegue respirar”.

Ser positivo com relação ao sexo e negativo com relação ao Pornhub deveria ser uma posição aceitável.

O Pornhub se recusou a permitir que executivos falassem sobre a situação abertamente, mas ofereceu uma declaração. “O Pornhub tem o compromisso inequívoco de combater material que mostre abusos sexuais contra crianças e estabeleceu uma iniciativa abrangente e pioneira no setor, normas de segurança, com o objetivo de identificar e erradicar material ilegal de nossa comunidade”, a empresa afirmou. O Pornhub acrescentou que qualquer asserção de que a empresa permite em seu site vídeos que exibam crianças “é irresponsável e flagrantemente falsa”.

A história de Serena Fleites

Aos 14 anos, Serena Fleites era uma estudante com ótimas notas em Bakersfield, na Califórnia, e jamais tinha beijado um menino. Mas quando estava na oitava série, ela se encantou com um adolescente um ano mais velho, e ele pediu que Fleites fizesse um vídeo que a mostrasse nua. Ela atendeu o pedido e enviou o vídeo ao garoto, o que mudou sua vida.

Ele pediu outro e depois mais um. Fleites ficou nervosa, mas se sentia lisonjeada. “E de repente começaram a me olhar de um jeito estranho na escola”, ela recorda. O menino havia mostrado os vídeos a outros alunos, e alguém os postou no Pornhub.

O mundo de Fleites implodiu. Ter 14 anos já é complicado; que seus colegas de escola possam vê-la nua, e zombar de você mais tarde por ser “vadia”, só agrava ainda mais as coisas. “Pessoas me mandavam mensagens de texto dizendo que, se eu não fizesse um vídeo para elas, mostrariam os vídeos que estavam online para minha mãe”, ela diz.

O menino foi suspenso, mas Fleites começou a cabular aulas porque a vergonha que sentia era insuportável. Sua mãe convenceu o Pornhub a remover os vídeos, e Fleites mudou de escola. Mas os rumores a acompanharam à nova escola, e os vídeos não demoraram a ser postados de novo, no Pornhub e em outros sites.

Fleites brigou com a mãe e começou a se mutilar. Um dia ela foi ao armário de remédios de sua casa e tomou todos os antidepressivos que encontrou.

Três dias mais tarde, acordou no hospital, frustrada por ter sobrevivido. Ela tentou se enforcar no banheiro; a irmã mais nova a encontrou, e os paramédicos a ressuscitaram.

Aos 16 anos, ela publicou um anúncio no Craigslist e começou a vender fotos e vídeos que a mostravam nua. Era um jeito de ganhar algum dinheiro e talvez também de se punir. Fleites me disse que seu raciocínio era o de que “eu já não valho coisa alguma, porque todo mundo já viu meu corpo”.

Os novos vídeos que ela fez também foram parar no Pornhub. Fleites solicitava sua remoção. E eles eram removidos, em geral, mas terminavam por ser publicados de novo no site, ela diz. Um vídeo que a mostrava nua aos 14 anos foi assistido 400 mil vezes e a faz hesitar em procurar emprego em restaurantes de fast food por receio de que alguém a reconheça.

Assim, Fleites, 19, que deixou de usar drogas um ano atrás mas está desempregada e traumatizada, mora em seu carro em Bakersfield, em companhia de três cachorros que se provaram mais leais e amorosos que os seres humanos. Ela sonha se tornar técnica em veterinária, mas não sabe como chegar a esse objetivo. “É difícil ir à escola quando você mora no carro com seus cachorros.”

“Fui burra”, ela reconhece, dizendo jamais ter imaginado que os vídeos dela seriam distribuídos online. “Foi uma coisinha que uma adolescente faz, e é uma loucura que se torne algo tão maior.”

“Uma vida inteira pode mudar por causa de um pequeno erro”, ela acrescenta.

Milhões de resultados

O problema vai bem além de uma empresa. De fato, um concorrente do Pornhub, o XVideos, que talvez possa ser considerado ainda menos escrupuloso, possivelmente atrai mais visitantes. Imagens de abusos contra crianças também aparecem em sites mais convencionais, como Twitter, Reddit e Facebook. E o Google dá sustentação aos modelos de negócios de companhias que prosperam tirando vantagem financeira da exploração de crianças.

Uma busca no Google com o termo “young porn” (pornô jovem) gera 920 milhões de retornos na rubrica “vídeo”. Alguns dos retornos mais bem posicionados incluem uma “adolescente muito jovem” nua e fazendo sexo, no site do XVideo, e um vídeo do Pornhub cujo título não pode ser mencionado aqui.

Pedi ao National Center for Missing and Exploited Children, uma organização americana de defesa de crianças e adolescentes explorados, que compilasse o número de imagens, vídeos e outras formas de conteúdo relacionados à exploração sexual de crianças reportado a cada ano. Em 2015, a organização recebeu denúncias sobre 6,5 milhões de vídeos ou outros arquivos; em 2017, foram 20,6 milhões; em 2019, 69,2 milhões.

O Facebook removeu 12,4 milhões de imagens relacionadas à exploração de crianças, durante um período de três meses neste ano. O Twitter fechou 264 mil contas em seis meses, no ano passado, por envolvimento na exploração sexual de crianças. Em contraste, o Pornhub aponta que a Internet Watch Foundation, uma organização sem fins lucrativos sediada na Inglaterra que combate imagens que mostrem abusos contra crianças, só registrou 118 casos de imagens relacionadas a abusos sexuais contra crianças em seus sites nos últimos quase três anos, um número aparentemente insignificante. “Eliminar conteúdo ilegal é uma batalha constante para qualquer plataforma moderna de conteúdo, e nosso compromisso é estar na vanguarda desse esforço”, o Pornhub afirmou em comunicado.

A Internet Watch Foundation não foi capaz de explicar por que seus números relativos ao Pornhub são tão baixos. Talvez isso aconteça porque os usuários do site estão acostumados a esse tipo de material, e por isso a probabilidade de que o denunciem é pequena. Mas se você sabe o que procurar, é possível encontrar centenas de vídeos que aparentam retratar abuso sexual contra menores no Pornhub, em 30 minutos. O Pornhub recentemente ofereceu “playlists” com nomes como “abaixo dos 18”, “a melhor coleção de meninos jovens” e “menor de idade”.

O Congresso e sucessivos presidentes dos Estados Unidos quase nada fizeram para combater esse problema, que cresce sem parar. O mundo da tecnologia, que o torna possível, em geral vem sendo passivo, e assume uma postura defensiva. Mas reportagens pioneiras de jornalistas do The New York Times em 2019 levaram o Congresso dos Estados Unidos a começar a debater diversas estratégias para combater a exploração de crianças.

A preocupação com o Pornhub está fervilhando. Uma petição pelo fechamento do site recebeu 2,1 milhões de assinaturas. O senador Ben Sasse, republicano do Nebraska, apelou ao Departamento da Justiça americano que investigue o Pornhub. O PayPal suspendeu seus serviços à empresa, e as companhias de cartões de crédito foram pressionadas a fazer o mesmo.

Uma organização chamada Traffickinghub, liderada por uma ativista chamada Laila Mickelwait, documenta abusos e pedidos pelo fechamento do site. No Canadá, 20 membros do Parlamento apelaram ao governo que reprima o Pornhub, cuja sede operacional fica em Montreal.

“Eles ganharam dinheiro com minha dor e sofrimento”, disse Taylor, uma mulher de 18 anos. Um namorado gravou sem que ela soubesse um vídeo que a mostrava executando um ato sexual, quando ela tinha 14 anos, e o vídeo foi parar no Pornhub, confirmou a polícia. “No dia seguinte, fui à escola e todo mundo ficava olhando para os seus celulares e para mim, enquanto eu andava pelo corredor”, acrescentou, chorando. “As pessoas riam.”

Taylor disse ter tentado o suicídio duas vezes por causa da humilhação e do trauma. Como outras pessoas mencionadas aqui, ela concordou em contar sua história e ajudar a documentá-la porque acredita que isso poderia ajudar outras meninas a evitar sofrimento que ela sentiu.

Donos ocultos

O Pornhub é controlado pela Mindgeek, um conglomerado de pornografia de capital fechado que opera mais de cem sites, produtoras e marcas. Os sites incluem Redtube, Youporn, XTube, SpankWire, ExtremeTube, Men.com, My Dirty Hobby, Thumbzilla, PornMD, Brazzers e GayTube. Há outras grandes empresas no ramo de pornografia além da Mindgeek, com destaque para a XHamster e XVideos, mas a Mindgeek é o titã do setor. Se ela operasse em outro ramo, o Departamento da Justiça provavelmente estaria discutindo abrir um processo antitruste contra a empresa.

O Pornhub e a Mindgeek também se destacam pela influência. Um estudo conduzido neste ano por uma companhia de marketing digital concluiu que o Pornhub era a empresa de tecnologia com o terceiro maior impacto sobre a sociedade no século 21, abaixo do Facebook e do Google, mas adiante da Microsoft, Apple e Amazon.

Nominalmente sediada no Luxemburgo, por motivos tributários, a Pornhub é uma empresa de capital fechado cuja sede operacional fica em Montréal. A companhia não revela quem é seu dono, mas ela é comandada por Feras Antoon e David Tassillo, ambos canadenses, que recusaram entrevistas.

O primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, se define como feminista e se orgulha dos esforços de seu governo para empoderar as mulheres em todo o mundo. Com isso, cabe uma pergunta a Trudeau e a todos os canadenses: por que o Canadá abriga uma empresa que inflige vídeos de estupro ao mundo?

Os moderadores da Mindgeek têm a tarefa de eliminar vídeos que mostrem crianças, mas o modelo de negócios da empresa gera lucros com vídeos de sexo estrelados por pessoas jovens.

“O objetivo de um moderador de conteúdo é permitir que o máximo possível de conteúdo seja veiculado”, disse um antigo empregado da Mindgeek. Ele disse acreditar que os executivos da empresa não fossem malignos, mas que o foco para eles seja maximizar a receita.

O Pornhub não revela quantos moderadores emprega, mas um deles revelou que existiam cerca de 80 pessoas exercendo essa função nos sites da Mindgeek em todo o planeta (em comparação, o Facebook informou que conta com 15 mil moderadores). Com 1,36 milhão de horas de vídeos novos subidas a cada ano no Pornhub, isso significa que cada moderador teria de rever centenas de horas de conteúdo a cada semana.

Os moderadores assistem aos vídeos novos em ritmo acelerado, mas muitas vezes é difícil determinar se as pessoas retratadas têm 14 ou 18 anos, e se as torturas retratadas são verdadeiras ou falsas. A maioria do conteúdo relacionado a menores de idade envolve adolescentes, disse o moderador, mas parte dele vem de câmeras de vigilância posicionadas em banheiros ou vestiários e pode mostrar crianças de 8 a 12 anos.

“É um emprego que destrói a alma”, disse o moderador.

O Pornhub parece estar cada vez mais preocupado com a possibilidade de processos que o responsabilizem civil ou criminalmente. Há advogados investigando, e nove mulheres abriram processos contra a empresa em um tribunal federal americano quando vídeos registrados por câmeras de espionagem foram postados no Pornhub. Os vídeos foram gravados em um vestiário do Limestone College, na Carolina do Sul, e mostravam mulheres tomando banho e trocando de roupa.

Os executivos do Pornhub pareciam presumir, no passado, que desfrutavam de imunidade nos termos da seção 230 da Lei de Decência na Comunicação dos Estados Unidos, que protege as plataformas de internet nas quais membros do público veiculam conteúdo. Mas em 2018, o Congresso americano limitou a aplicação da Seção de 230, de modo que ela pode não bastar mais para proteger a companhia, o que levou a Mindgeek a se esforçar para promover um comportamento melhor.

O número de moderadores foi dobrado, nos dois últimos anos, segundo o moderador, e neste ano o Pornhub começou a denunciar voluntariamente material ilegal para o National Center for Missing and Exploited Children. Antes a empresa criava dificuldades para remover imagens de crianças e conteúdo não consensual, mas agora está respondendo mais rapidamente.

A empresa também compilou uma lista de conteúdo proibido. O New York Times obteve uma cópia da lista, que supostamente bloqueia vídeos descritos por termos como “estupro”, “pré-adolescente”, “pedofilia” e “bestialidade” (as diretrizes são prestativas e explicam que “isso inclui enguias peixes, polvos e insetos”). Fraldas são aceitáveis, “mas não escatofilia”. Mutilação depende do contexto, mas “porções do corpo não podem ser decepadas diante das câmeras”.

Assim, embora já não seja possível realizar buscas em inglês por termos como “menor de idade” ou “estupro”, a companhia não se esforça demais para eliminar esse tipo de vídeo. Um membro cujo apelido é “13yoboyteen” [menino de 13 anos] está autorizado a veicular vídeos. Uma busca por “est*pro” gera 1.901 resultados. “Menina com aparelho ortodôntico” gera 1.913, e as sugestões de busca complementares incluem “exxxxxtra small tens”. Uma busca por “13yo” gera 155 mil vídeos. É bom deixar claro que nem todos eles mostram adolescentes de 13 anos, mas o fato de que haja autorização para usar essa linguagem em sua promoção reflete um esforço para atrair pedófilos.

Além disso, alguns vídeos parecem contradizer a lista de conteúdo proibido. “Menina fugitiva recebe ultimato: anal ou rua” é o título de um vídeo disponível no Pornhub. Outro usuário posta vídeos de sexo com adolescentes que choram, protestam e gritam de dor.

Embora o Pornhub esteja tomando mais cuidado com vídeos que envolvem cidadãos americanos potencialmente litigiosos, continua a tratar as vítimas estrangeiras com extrema irresponsabilidade. Um vídeo indonésio é intitulado “menina de segundo grau depois da aula” e mostra o que parece ser uma adolescente bem jovem fazendo sexo. Um vídeo chinês de sexo que acaba de ser removido tinha o título “bela garota de segundo grau enganada por colegas e levada ao topo de um edifício onde é humilhada e estuprada”.

“Eles ganham dinheiro com o pior momento da minha vida, do meu corpo”, disse uma adolescente colombiana que pediu para ser identificada como Xela, seu apelido. Dois americanos pagaram por um encontro sexual quando Xela tinha 16 anos. O encontro foi filmado e postado no Pornhub. Ela foi uma das diversas sobreviventes do Pornhub que contaram ter pensado em, ou tentado, suicídio.

Nos últimos dias, dois novos vídeos mostrando meninas menores de idade sendo atacadas foram postados, bem como um vídeo de sexo de uma menina de 15 anos, que quis se suicidar quando as imagens chegaram à internet. Não vejo como moderadores poderiam ter aprovado esses vídeos se estivessem agindo de boa fé.

Sofrimento sem fim

“Eles sempre vão estar online”, disse Nicole, uma mulher britânica que viu vídeos que a mostram nua retornando diversas vezes ao Pornhub. “É meu grande medo caso tenha filhos —que eles encontrem isso.”

O tema é recorrente entre os sobreviventes: um ataque um dia termina, mas o Pornhub torna o sofrimento interminável.

Vídeos que mostravam Nicole nua foram postados no Pornhub quando ela tinha 15 anos. Agora ela tem 19 anos e tenta há dois anos removê-los.

“Por que vídeos gravados comigo quando eu tinha 15 anos e estava sendo chantageada, o que constitui pornografia infantil, continuam a ser postados no site?”, protestou Nicole em uma mensagem de queixa ao Pornhub no ano passado. “Vocês precisam de um sistema melhor... tentei me matar diversas vezes, depois de ver meus vídeos subirem de novo em seu site.”

A advogada de Nicole, Dani Pinter, diz que ainda existem três vídeos que mostram Nicole nua, aos 15 e 16 anos, circulando no Pornhub, e que elas continuam tentando remover. “Jamais vai acabar”, disse Nicole. “Eles ganham muito dinheiro com o nosso trauma.”

O Pornhub adotou um software que supostamente pode traçar as “impressões digitais” de um vídeo de estupro e impedir que ele volte a ser publicado. Mas o site noticioso Vice mostrou como é fácil contornar essa tecnologia no Pornhub.

Um escândalo no Pornhub envolveu a produtora Girls Do Porn, que recrutava jovens mulheres como modelos para comerciais de roupas e depois as pressionava a fazer vídeos pornográficos, afirmando que eles seriam vendidos como DVDs no exterior e nunca seriam colocados para a internet. Depois de receber a garantia de que ninguém saberia dos vídeos, algumas mulheres concordaram —e sofreram as consequências quando os vídeos foram comercializados agressivamente no Pornhub.

A Girls Do Porn foi processada por tráfico sexual e forçada a fechar. Mas os vídeos continuavam a ressurgir periodicamente no Pornhub, e a empresa continua a lucrar com eles.

Uma das mulheres cujos vídeos para a Girls Do Porn estava no Pornhub morreu. Foi assassinada aos 20 anos, supostamente por um ex-namorado que vai ser julgado. Seu nome não será revelado porque é melhor que seja lembrada como uma vibrante atleta universitária e não por um vídeo de sexo que representou o momento mais perturbador de sua vida.

Qual é a solução, portanto?

Eu acreditava que os sobreviventes desejassem ver o Pornhub fechado, e os executivos da empresa na cadeia. Isso procede no caso de algumas delas, mas outras têm posições mais nuançadas. Lydia, que hoje tem 20 anos, foi explorada sexualmente quando criança e muitos vídeos que a mostram sendo estuprada foram postados no site. “Meu estômago dói o tempo todo” por causa da tensão, ela disse, mas Lydia não quer ser vista como hostil à ideia de pornografia.

“Não quero que as pessoas leiam minha posição como um não à pornografia”, disse Lydia. “O importante é que eles parem de machucar crianças.”

Susan Padron disse que presumia que os vídeos pornográficos fossem todos consensuais até que um namorado a filmou fazendo sexo, aos 15 anos, e postou o vídeo no Pornhub. Ela vem enfrentando dificuldades desde então, e acredita que só pessoas que confirmem suas identidades deveriam estar autorizadas a postar vídeos.

Jessica Shumway, que foi vítima de exploração sexual e teve um cliente que postou um de seus vídeos de sexo no Pornhub, concorda. “Eles precisam aprender a identificar os menores de idade nos vídeos e garantir que haja consentimento de todos os envolvidos.”

Perguntei a Leo, 18, que teve vídeos de sexo gravados quando ele tinha 14 anos postados no Pornhub, qual seria sua sugestão.

“É difícil”, ele disse. “Minha solução seria deixar a pornografia para as produtoras profissionais”, porque elas requerem prova de idade e consentimento.

No momento, essas empresas não conseguem competir com sites em geral gratuitos como o XVideos e o Pornhub.

“O Pornhub já destruiu o modelo de negócios dos sites pornô pagos”, disse Stoya, atriz e roteirista de filmes adultos. Ela também acredita que todas as plataformas —do YouTube ao Pornhub— deveriam exigir prova de consentimento das pessoas retratadas antes de subir vídeos.

Colunistas deveriam oferecer respostas, mas eu tenho dificuldade para pensar em soluções. Se o Pornhub tivesse uma curadoria mais rigorosa para os vídeos, o material mais ofensivo terminaria transferido à dark web ou a sites de países menos regulamentados. Mas no mínimo ele não seria normalizado em um site de grande acesso.

Mais pressão e menos impunidade também ajudariam. Já vimos que a limitação da impunidade conferida sob a Seção 230 leva a maiores esforços de autopoliciamento.

E podem me chamar de pudico, mas não entendo por que serviços de busca, bancos e empresas de cartões de crédito deveriam facilitar as operações de uma empresa que monetiza agressões sexuais contra crianças ou mulheres desacordadas. Se o PayPal suspendeu a cooperação com o Pornhub, American Express, Visa e Mastercard podem fazer o mesmo.

Não vejo uma solução simples. Mas, além de limitar a imunidade para que as empresas tenham incentivo para se comportar melhor, há três passos que poderiam ajudar. 1. Permitir que apenas usuários verificados subam vídeos; 2. Proibir downloads; 3. Reforçar a moderação.

As medidas não acabariam com a indústria da pornografia ou incomodariam demais os seus consumidores. O YouTube prospera sem downloads. Siri Dahl, proeminente estrela pornô que trabalha com o Pornhub, me disse que minhas três propostas são “insanamente razoáveis”.

O mundo costuma ignorar os abusos sexuais contra crianças, como aconteceu tantas vezes no caso da Igreja Católica ou do escotismo. Terminamos por processar tarde demais indivíduos como Jeffrey Epstein ou R. Kelly. Mas deveríamos resistir a empresas que exploram crianças sistematicamente. No Pornhub, o que temos é Jeffrey Epstein multiplicado por mil.

Tradução de Paulo Migliacci

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