Em 3º dia seguido de protestos, mais de 60 mil vão às ruas de Mianmar contra golpe militar

Bloqueio à internet e boatos ajudaram a inflamar revolta popular

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Rangoon (Mianmar) | Reuters

Dezenas de milhares de manifestantes participaram, neste domingo (7), de mais protestos contra o golpe militar deflagrado em Mianmar, pelo qual o Exército tomou o poder e prendeu toda a cúpula do governo do país, há seis dias.

Os manifestantes, que começaram a ir às ruas em grande quantidade na sexta (5), reivindicam o retorno da transição democrática e a libertação de Aung San Suu Kyi, que liderava o país e foi detida.

Manifestantes, de moto, protestam contra golpe militar em Naypyidaw, capital de Mianmar, no domingo (7) - AFP

No sábado (6), a junta militar que assumiu o governo bloqueou o Facebook e outras redes sociais e suspendeu o acesso à internet em diversos pontos do país.

Sem conexão nem informações oficiais, diversos rumores sobre o destino de Suu Kyi e seu gabinete se espalharam. Um boato afirmava que ela havia sido libertada, o que atraiu multidões para comemorar —mas foi rapidamente desmentido pelo advogado da governante.

O acesso à internet foi retomado neste domingo, segundo moradores ouvidos pela agência Reuters. Mas o bloqueio no dia anterior inflamou ainda mais a raiva popular.

Manifestações ocorreram por todo o território de Mianmar, com protestos registrados em várias cidades. Foi o terceiro dia seguido que miamarenses se engajam em atos de resistência contra o Exército.

Uma nota interna da ONU estima que mil pessoas se juntaram ao protesto na capital Naypyidaw, enquanto 60 mil foram às ruas em Rangoon, a maior cidade do país.

Pessoas nas ruas se saudavam com o gesto dos três dedos que se tornou um símbolo dos protestos. Um policial que acompanhava a manifestação foi fotografado fazendo a saudação para a multidão que participava do protesto.

Em Rangoon, policiais armados com escudos antimotim montaram barricadas próximas a Pagoda Sule, no centro da cidade, para onde seguia a multidão. A polícia não impediu o protesto e alguns manifestantes presentearam os agentes com flores.

"Não queremos uma ditadura para a próxima geração", disse Thaw Zin, 21. "Não terminaremos esta revolução até fazermos história. Vamos lutar até o fim."

O vídeo abaixo mostra cenas do protesto de sábado (6):

O golpe da última segunda-feira (1º) desencadeou repúdio internacional. Neste domingo, o papa Francisco expressou solidariedade com o povo do país e pediu aos líderes de Mianmar que busquem "harmonia democrática".

A tomada de poder pelos militares recebeu duras críticas da comunidade internacional. Líderes políticos de diversas nacionalidades, incluindo Estados Unidos e Alemanha, pediram o restabelecimento do governo democraticamente eleito e a libertação de todos os presos civis. ​

Os militares disseram que o golpe foi em resposta a uma fraude eleitoral, mas não apresentaram provas dela. O partido apoiado por eles levou só 33 das 476 cadeiras do Parlamento.

A democracia em Mianmar era algo ainda novo. O país, que já foi chamado de Birmânia, conquistou a independência do Reino Unido em 1948.

O novo regime diz que o poder será transferido após a "realização de eleições livres e justas", mas a promessa é encarada com ceticismo —Mianmar viveu sob uma ditadura militar entre 1962 e 2011.

Esses são os maiores protestos no país desde a Revolução do Açafrão em 2007. À época, manifestações contra o aumento do preço de transportes e combustíveis, lideradas por monges budistas (cujas vestes são da cor do açafrão), ganharam grande adesão dos miamarenses e se transformaram em um movimento geral contra a junta militar que governava o país.

Cronologia da história política de Mianmar

  • 1948: Ex-colônia britânica, Mianmar se torna um país independente
  • 1962: General Ne Win abole a Constituição de 1947 e instaura um regime militar
  • 1974: Começa a vigorar a primeira Constituição pós-independência
  • 1988: Repressão violenta a protestos contra o regime militar gera críticas internacionais
  • 1990: Liga Nacional pela Democracia (LND), de oposição ao regime, vence primeira eleição multipartidária em 30 anos e é impedida de assumir o poder
  • 1991: Aung San Suu Kyi, da LND, ganha o Nobel da Paz
  • 1997: EUA e UE impõe sanções contra Mianmar por violações de direitos humanos e desrespeito aos resultados das eleições
  • 2008: Assembleia aprova nova Constituição
  • 2011: Thein Sein, general reformado, é eleito presidente e o regime militar é dissolvido
  • 2015: LND conquista maioria nas duas Casas do Parlamento
  • 2016: Htin Kyaw é eleito o primeiro presidente civil desde o golpe de 1962 e Suu Kyi assume como Conselheira de Estado, cargo equivalente ao de primeiro-ministro
  • 2018: Kyaw renuncia e Win Myint assume a Presidência
  • 2020: Em eleições parlamentares, LND recebe 83% dos votos e derrota partido pró-militar
  • 2021: Militares alegam fraude no pleito, prendem lideranças da LND, e assumem o poder com novo golpe de Estado
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