Ernesto e principal diplomata de Biden conversam em novo esforço de aproximação

Americano convidou Bolsonaro a participar de cúpula do clima planejada para abril

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Brasília

No primeiro contato de alto nível entre os governos de Jair Bolsonaro e Joe Biden, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, conversou no final da manhã desta quinta-feira (11) com o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken.

A chamada telefônica vinha sendo solicitada pelo Itamaraty, que busca abrir interlocução com as novas autoridades americanas —muitas delas críticas a Bolsonaro.

O Ministro de Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, durante evento no Itamaraty em janeiro
O ministro de Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, durante evento no Itamaraty em janeiro - Adriano Machado - 8.jan.21/Reuters

Os temas abordados pelas duas autoridades foram cooperação regional, ações de combate à pandemia de Covid-19 e conservação ambiental, entre outros itens da agenda bilateral.

De acordo com interlocutores, Blinken aproveitou o telefonema para convidar o presidente Bolsonaro a participar da cúpula sobre mudanças climáticas que Biden deve organizar em 22 de abril. Ernesto disse ao americano que o líder brasileiro pretende fazer parte do evento. Diante da crise sanitária, a expectativa é que esse encontro de líderes internacionais ocorra de forma virtual.

"Tive hoje longa e produtiva conversa com o Secretário de Estado Antony Blinken. Agenda 100% positiva. Ficou claro que há excelente disposição e amplas oportunidades para continuarmos construindo uma parceria profunda entre o Brasil e os Estados Unidos", escreveu Ernesto no Twitter.

"Encontramos convergência de visões sobre a centralidade da democracia e grande empenho em trabalhar juntos nas questões do comércio, do clima e promoção dos direitos humanos. EUA seguem sendo parceiro-chave na transformação do Brasil em torno da liberdade econômica e política", disse o chanceler brasileiro.

Na tarde de quinta, Blinken também comentou sobre a ligação com Ernesto. "Um prazer falar hoje com o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Eu estou ansioso para trabalhar com o Brasil para expandir nossas parcerias nas áreas econômica, de segurança e de democracia", escreveu o americano no Twitter.

Como mostrou a Folha, apesar da pressão da ala mais à esquerda do Partido Democrata e de ativistas que pedem medidas punitivas dos EUA contra o governo Jair Bolsonaro, as primeiras ações de Biden sobre a preservação da Amazônia não vão incluir sanções ao Brasil.

A ordem na Casa Branca é apostar em um plano colaborativo para a proteção da floresta, antes de aplicar qualquer punição ao Brasil. Até segunda ordem, o Planalto seguirá tratado como aliado dos americanos.

Já o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, disse que, durante a reunião, Blinken e Araújo "expressaram seu compromisso em combater a pandemia da Covid-19 e as mudanças climáticas, bem como aumentar a cooperação regional, apoiando a conservação ambiental e os direitos humanos."

A conversa entre os dois já estava sendo esperada para esta semana, período que Blinken reservou para tratar de assuntos com países da América Latina.

A vitória de Biden foi um revés para Bolsonaro, que apoiou abertamente a reeleição de Donald Trump na corrida pela Casa Branca.

O líder brasileiro foi um dos últimos a cumprimentar Biden pela vitória e, poucos dias antes da posse, deu declarações mal vistas por aliados do americano.

Bolsonaro repetiu acusações de Trump —sem provas— de que houve fraude no pleito dos EUA. Em outra frente, Ernesto se referiu aos manifestantes pró-Trump que invadiram o Congresso americano como "cidadãos de bem".

Após a posse de Biden, no entanto, o tom do governo brasileiro mudou e Bolsonaro passou a enviar sinais de conciliação e moderação.

No dia da posse nos EUA, o presidente do Brasil enviou uma carta a Biden na qual defendeu parcerias entre os dois países "em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção do meio ambiente".

"Estamos prontos, ademais, a continuar nossa parceria em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção do meio ambiente, em especial a Amazônia, com base em nosso Diálogo Ambiental, recém-inaugurado. Noto, a propósito, que o Brasil demonstrou seu compromisso com o Acordo de Paris com a apresentação de suas novas metas nacionais", escreveu Bolsonaro.

A ênfase dada ao tema não foi ao acaso, uma vez que diplomatas preveem que Biden deve colocar forte pressão sobre o Brasil em assuntos ligados à sustentabilidade. O americano elegeu o tema como prioridade e indicou John Kerry, ex-candidato a presidente e ex-secretário de Estado, como seu enviado especial para o clima.

Entre políticos do Partido Democrata, Bolsonaro é visto como um líder de tendências autoritárias que não tem compromisso com a preservação da Amazônia.

No final de janeiro, Ernesto também enviou uma mensagem a Blinken. Na correspondência, o chanceler destacou a agenda e os interesses em comum entre os dois países em áreas como a econômica, a comercial e a ambiental.

O secretário de Estado é o chefe da diplomacia americana, e o cargo tem funções semelhantes ao de ministro de Relações Exteriores no Brasil.

A preocupação no Itamaraty é impedir que as diferenças de opinião entre as administrações Bolsonaro e Biden levem o governo brasileiro a perder interlocução com Washington.

Auxiliares do presidente sabem que setores da sociedade civil críticos a Bolsonaro estão tentando estabelecer diálogo com a administração Biden.

No início de fevereiro, um documento elaborado por professores de universidades e diretores de ONGs internacionais foi entregue a membros da administração americana. O informe defende o congelamento de acordos, negociações e alianças políticas com o Brasil enquanto Bolsonaro estiver na Presidência.

No Itamaraty, o dossiê tem sido tratado como uma proposta elaborada fora do governo americano, mas ele reforçou a necessidade de fazer chegar a Washington os argumentos do governo Bolsonaro.

Assessor próximo a Biden, Blinken foi confirmado no cargo pelo Senado em 26 de janeiro.

Especialistas destacam que a agenda da diplomacia americana deve estar centrada nas relações com China e Rússia, além da reaproximação com aliados tradicionais na Europa. Mas o Brasil foi tema recentemente de uma fala da secretária de Imprensa da Casa Branca, Jen Psaki.

Ela foi questionada sobre o relatório produzido pelas ONGs, mas deu ênfase à parceria comercial entre Estados Unidos e Brasil.

"Nós permanecemos fortemente empenhados numa relação econômica significativa. Somos [os EUA] de longe o maior investidor no Brasil, inclusive em muitas das empresas brasileiras que são mais inovadoras e focadas em crescimento. E nós vamos continuar, nos próximos meses, a fortalecer nossos laços econômicos e a aumentar nossa grande relação comercial, que segue em expansão", disse.

Colaborou Marina Dias, de Washington

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