Insatisfeitos com Trump, ex-republicanos se articulam para criar partido dissidente

Enquanto maior parte dos correligionários dá sinais de lealdade ao ex-presidente, grupo se reúne para criar 3ª via política

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Reuters

Dezenas de ex-membros do Partido Republicano, que consideram a legenda relutante em enfrentar o ex-presidente Donald Trump e suas tentativas de minar a democracia dos Estados Unidos, estão em fase de negociação para formar um partido dissidente, de acordo com a agência de notícias Reuters.

Segundo a agência, as discussões incluem ex-republicanos que já ocuparam cargos eletivos e ex-funcionários dos governos dos presidentes Ronald Reagan (1981-1989), George H. W. Bush (1989-1993), George W. Bush (2001-2009) e Trump (2017-2021), além de antigos embaixadores e estrategistas do partido.

De acordo com quatro interlocutores envolvidos na negociação, mais de 120 pessoas participaram de uma videoconferência na semana passada para discutir a criação do partido dissidente.

O objetivo é que ele funcione como uma plataforma de "conservadorismo de princípios", incluindo a adesão à Constituição e ao Estado de Direito —ideais que eles dizem ter sido destruídos por Trump.

O ex-presidente dos EUA Donald Trump durante visita a Cookeville, no Tennessee, no ano passado - Jim Watson - 6.mar.20/AFP

O plano inclui apresentar candidaturas em algumas eleições. Quando o novo partido não estiver na disputa, a ideia é endossar nomes de centro-direita que não fazem parte da sigla —republicanos, democratas e independentes podem receber esse tipo de apoio, disseram os envolvidos à Reuters.

A única pessoa que aceitou ser identificada na reportagem foi Evan McMullin. Ex-agente da CIA e ex-republicano, ele concorreu à Presidência dos EUA em 2016 como candidato independente e recebeu 0,53% do total de votos populares.

À Reuters, McMullin afirmou que foi um dos coordenadores da videoconferência em que houve demonstrações de preocupação com o controle e a influência de Trump sobre o Partido Republicano. Outras três pessoas confirmaram a reunião e as discussões sobre a dissidência, mas pediram para não serem identificadas.

Entre os participantes da chamada, realizada pelo Zoom, estavam pelo menos três ex-funcionários do Departamento de Segurança Interna do governo Trump: John Mitnick, consultor jurídico, Elizabeth Neumann, vice-chefe de gabinete, e Miles Taylor, criador de um movimento de resistência a Trump dentro do Partido Republicano. Charlie Dent, ex-deputado pela Pensilvânia, também teve sua participação confirmada na videoconferência.

Segundo os envolvidos, a reunião teve como tópicos principais a ampla divisão intrapartidária provocada pelas falsas alegações de Trump a respeito de uma suposta fraude generalizada no sistema americano e pela incitação do ex-presidente à invasão do Capitólio no mês passado.

A maioria dos republicanos dá sinais de que permanece ferozmente leal a Trump, mas outros buscam uma nova direção para o partido.

Uma semana após o ataque ao Congresso, a Câmara dos Representantes, liderada pelo Partido Democrata, aprovou o início do processo de impeachment de Trump sob a acusação de que o ex-presidente incitou uma insurreição ao sugerir a milhares de apoiadores que marchassem ao Capitólio no dia em que os congressistas se reuniam para certificar a vitória de Joe Biden.

Segundo o pedido de impeachment, o segundo que tem Trump como alvo, o ex-presidente "fez, deliberadamente, declarações que encorajaram ações ilegais" e "continuará sendo uma ameaça à segurança nacional, à democracia e à Constituição se for autorizado a permanecer no cargo".

"Incitados pelo presidente, membros da multidão à qual ele se dirigiu violaram e vandalizaram o Capitólio, feriram e mataram equipes de segurança, ameaçaram membros do Congresso e o vice-presidente e se engajaram em atos violentos, mortais, destrutivos e sediciosos", diz o documento.

Depois do tumulto, que durou horas e deixou cinco mortos, a sessão foi retomada e certificou a eleição de Biden, mas não sem a contestação dos opositores.

De acordo com a reportagem da Reuters, os membros do grupo que agora querem criar o novo partido disseram estar particularmente consternados com o fato de que mais da metade dos republicanos no Congresso —oito senadores e 139 deputados— votaram contra o reconhecimento da vitória do democrata.

A maioria dos senadores correligionários de Trump também indicou que não apoiará sua condenação no julgamento do segundo processo de impeachment, que deve ocorrer nesta semana.

“Grande parte do Partido Republicano está radicalizando e ameaçando a democracia americana”, disse McMullin à Reuters. “O partido precisa se comprometer novamente com a verdade, a razão e os ideais fundadores ou claramente precisa haver algo novo.”

Questionado sobre as discussões acerca da criação de um novo partido, Jason Miller, porta-voz de Trump, disse que "esses perdedores deixaram o Partido Republicano quando votaram em Joe Biden".

O Comitê Nacional Republicano, por meio de um representante, respondeu com uma referência à fala de Ronna McDaniel, presidente do partido.

"Se continuarmos a atacar uns aos outros e nos concentramos em atacar os colegas republicanos, se tivermos divergências dentro de nosso partido, estaremos perdendo de vista [as eleições de] 2022", disse McDaniel em entrevista à Fox News no mês passado. "A única maneira de vencermos é se nos unirmos."

Segundo McMullin, pouco mais de 40% dos participantes da videoconferência apoiaram a ideia de criar uma legenda dissidente. Os nomes em consideração incluem "Partido da Integridade" e "Partido de Centro-Direita".

Outra opção em discussão seria a formação de uma "facção" dentro ou fora do atual Partido Republicano, que poderia se chamar "Republicanos de Centro-Direita".

Embora estejam cientes de que o cenário político dos EUA está repleto de fracassadas tentativas anteriores de fazer frente ao tradicional bipartidarismo, um dos participantes afirma que "há uma fome muito maior por um novo partido político do que eu jamais experimentei em toda a minha vida".

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