Vacinação rápida faz de Israel espécie de laboratório para o mundo

Casos e hospitalizações por Covid-19 caem, e dados sugerem que imunizantes funcionam tão bem quanto nos testes

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Isabel Kershner Carl Zimmer
Jerusalém | The New York Times

No mais amplo teste feito até agora no mundo real, Israel demonstrou que um programa robusto de vacinação contra o coronavírus pode ter um impacto rápido e poderoso, mostrando ao mundo uma maneira plausível de sair da pandemia.

Os casos de Covid-19 e as hospitalizações caíram drasticamente entre pessoas que foram vacinadas, num prazo de poucas semanas, segundo novos estudos feitos em Israel, onde a rápida distribuição da vacina transformou o país numa espécie de laboratório de testes para o mundo. E os primeiros dados sugerem que as vacinas estão funcionando quase tão bem na prática quanto funcionaram nos testes clínicos.

"Dizemos com cautela, a mágica começou", escreveu Eran Segal, um biólogo no Instituto Weizmann de ciência e coautor de um novo estudo sobre o efeito da vacina em Israel, no Twitter.

A notícia esperançosa sobre a vacina não significa um ingresso grátis para um futuro pós-pandêmico.

Profissional da saúde aplica imunizante contra Covid-19 em centro de vacinação em Tel Aviv
Profissional da saúde aplica imunizante contra Covid-19 em centro de vacinação em Tel Aviv - Gideon Markowicz - 10.fev.21/Jini/Xinhua

Enquanto o mundo corre para conter o vírus antes que mutações mais perigosas se disseminem, a escassez de vacinas pode impedir outros países de replicar o sucesso de Israel ou o surgimento de novas variantes.

Mesmo Israel, que superou todos os países na vacinação de sua população, não está totalmente livre do problema. O país estendeu seu lockdown nacional na quinta-feira (11).

Ainda assim, pesquisadores encontraram esperança na capacidade da vacina de rapidamente reduzir os casos entre os israelenses imunizados.

"Acho isso bastante convincente de que estamos vendo efeitos reais da vacinação em nível de população", disse William Hanage, pesquisador de saúde pública na Universidade Harvard, que não participou do estudo em Israel.

A notícia de Israel no mundo real se soma a outros sinais de esperança depois de meses de aridez. Um número crescente de vacinas está mostrando forte eficácia contra a Covid-19, protegendo especialmente contra a doença grave. Alguns testes sugerem que as vacinas podem até ter o potencial de desacelerar a transmissão do vírus.

O novo estudo em Israel examinou estatísticas de saúde nacionais para pessoas de 60 anos ou mais, que receberam primeiro a vacina da Pfizer-BioNTech por serem de alto risco. Analisando dados de seis semanas da campanha de vacinação, quando a maioria das pessoas dessa idade tinha sido vacinada, eles descobriram que o número de novos casos de Covid-19 caiu 41% em comparação com três semanas antes.

Esse grupo também experimentou uma redução de 31% em hospitalizações pelo coronavírus e uma queda de 24% nos que adoeceram criticamente.

O estudo é importante, em parte, porque os autores puderam isolar outros fatores, incluindo lockdowns, que também reduzem o número de infecções. Os pesquisadores descobriram que mesmo levando em conta esses fatores as vacinas tiveram um efeito importante.

O tamanho desse efeito ainda não foi determinado.

Mas novos dados divulgados na quinta por uma das maiores redes de saúde de Israel sugerem que a proteção das vacinas na prática pode ser quase tão boa quanto foi no teste clínico.

O imunizante teve um índice de eficácia de 95% nos testes clínicos. Pesquisadores advertiram em novembro que esses números podem não se manter no mundo real.

As pessoas que foram voluntárias nos testes podem não representar a população como um todo, por exemplo. Também, a vacina Pfizer-BioNTech é difícil de administrar em escala nacional, porque deve ser mantida congelada até pouco antes da administração.

Mas os Serviços de Saúde Maccabi relataram na quinta que das 416.900 pessoas que vacinou somente 254 pegaram Covid uma semana depois da segunda dose. Além disso, todos os casos foram brandos. Comparando esse índice com o das pessoas não vacinadas, os pesquisadores estimaram que a vacina teve uma eficácia de 91%.

Os resultados são ainda mais surpreendentes, disseram especialistas, porque Israel enfrenta uma preocupante nova cepa do coronavírus. A variante B.1.17 hoje responde por 80% das amostras testadas no país.

Primeiramente identificada no Reino Unido em dezembro, a variante se espalhou para 72 outros países e pode ser até 50% mais transmissível que outras variantes.

Israel lidera o mundo na vacinação de cidadãos. Até agora, mais de um terço da população de mais de 9 milhões recebeu a primeira dose da vacina da Pfizer-BioNTech, e quase 2 milhões de pessoas receberam a segunda dose.

O primeiro alvo foram os cidadãos de mais de 60, faixa etária que responde por 95% ou mais das mais de 5.000 mortes por Covid-19 em Israel. Segundo o Ministério da Saúde, 84% desse grupo foram vacinados.

Como um país relativamente pequeno com um sistema de saúde universal e altamente digitalizado, Israel se tornou um campo de testes interessante para a Pfizer. Em consequência, o país fez um acordo com a companhia de oferecer dados em troca de um fluxo constante de vacinas.

Apesar de seus sucessos, Israel continua vulnerável. Depois de uma queda de novos casos no final de janeiro, a taxa média está voltando a subir. A transmissibilidade da variante B.1.17 pode ser parcialmente culpada, juntamente com a menor adesão ao atual lockdown, comparada com os anteriores.

E quase todos os palestinos nos territórios ocupados ainda esperam por vacinas, deixando-os e aos israelenses menos protegidos de qualquer novo surto.

Também não há como saber o que aconteceria se uma nova variante mais preocupante começasse a se disseminar em Israel. Uma variante primeiro identificada na África do Sul é não somente mais contagiosa, como também pode tornar as vacinas menos eficazes.

Ao mesmo tempo, o muito elogiado programa de vacinação de Israel parece ter chegado a um impasse conforme o número dos vacinados caiu drasticamente na semana passada, sugerindo que o entusiasmo inicial dos israelenses pode estar diminuindo. A desaceleração deixou alguns centros de vacinação desertos nesta semana.

O programa de imunização encontrou resistência entre alguns grupos, particularmente os judeus ultraortodoxos e os cidadãos árabes, duas comunidades que foram duramente atingidas pelo vírus.

Especialistas também indicaram lacunas no estudo do Instituto Weizmann, que devem ser preenchidas.

Hagai Levine, pesquisador de saúde pública na Universidade Hebraica Hadassah em Jerusalém, advertiu que os cientistas observaram apenas tendências gerais no país e não rastrearam indivíduos que foram vacinados.

Em consequência, o estudo levanta diversas perguntas que não pode responder. Não está claro, por exemplo, por que os pesquisadores só viram a redução de casos, doenças graves e hospitalizações três semanas após o início da campanha. No teste clínico da vacina da Pfizer-BioNTech, pesquisadores observaram os primeiros sinais de proteção aproximadamente dez dias depois da primeira dose.

É possível que o efeito tenha sido mais lento em Israel porque a campanha de vacinação foi dirigida basicamente a pessoas idosas, cujo sistema imune pode levar mais tempo para criar uma defesa.

"A mensagem ao mundo é que mesmo que você esteja vacinando em um ritmo louco, como Israel, precisa ter paciência", disse Hagai Rossman, coautor do estudo do Weizmann. "Não há varinha mágica."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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