Mesmo com repressão violenta, milhares voltam a protestar em Mianmar

Mais de 50 pessoas morreram desde o início das manifestações contra o golpe militar

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Rangoon (Mianmar) | AFP

Milhares de manifestantes voltaram às ruas em diversas cidades de Mianmar neste domingo (7) contra a junta militar que tomou o poder no país. Os protestos ocorrem mesmo com forte repressão da polícia e incursões noturnas, que mataram um membro do partido da líder presa Aung San Suu Kyi, 75.

Em Bagan, no centro do país, perto de um famoso sítio arqueológico, detonações foram ouvidas.

"Um adolescente de 18 anos levou um tiro na mandíbula", disse à agência de notícias AFP o socorrista Ko Ko. A mídia local noticiou "pelo menos cinco pessoas feridas".

Em Rangoon, a polícia fez disparos para dispersar os manifestantes que gritavam: "Vamos tirar o ditador!", referindo-se ao chefe da junta militar, Min Aung Hlaing.

Manifestantes pedem a libertação da líder Aung San Suu Kyi durante um protesto contra golpe militar em Mianmar, realizado neste domingo (7) em Yangon
Manifestantes pedem a libertação da líder Aung San Suu Kyi durante um protesto contra golpe militar em Mianmar, realizado neste domingo (7) em Rangoon - AFP

Durante a noite, a polícia e o Exército realizaram operações na capital econômica do país contra a Liga Nacional para a Democracia (LND), partido de Suu Kyi, derrubada em 1º de fevereiro e detida em local secreto.

"Não sabemos quantas pessoas foram presas", disse Soe Win, um dos responsáveis do partido.

Um chefe local da LND, Khin Maung Latt, 58, morreu. "Ele foi espancado e levado de sua casa. Aparentemente não sobreviveu ao duro interrogatório a que foi submetido", afirmou Tun Kyi, um ex-prisioneiro político.

Outro alvo era um advogado do partido, mas um ex-deputado afirma que, como não o encontraram, as forças de segurança torturaram o irmão dele.

A mídia estatal alertou os deputados que não reconhecem a legitimidade do governo militar —e que criaram uma comissão para representar o governo civil—, dizendo que eles cometem "alta traição", um crime que pode levar à pena de morte ou 22 anos de detenção.

Afirmou também que os funcionários públicos em greve "serão demitidos a partir de 8 de março". As greves têm um grande impacto na já fragilizada economia do país, com bancos incapazes de funcionar, hospitais fechados e gabinetes ministeriais vazios.

Ignorando as ameaças do governo, uma aliança de influentes sindicatos de Mianmar convocou uma greve nacional a partir desta segunda-feira (8), para causar um completo e extenso apagão da economia do país, em uma tentativa de encerrar o golpe.

Em um comunicado, nove organizações de trabalhadores pediram que todo o povo de Mianmar pare de trabalhar. Moe Sandra Myint, presidente da Federação de Trabalhadores de Vestuário de Mianmar, afirmou que acredita que a maioria deve aderir à paralisação. “Estamos pedindo para continuar a greve até que a ditadura seja extirpada”, afirmou.

O diretor do Programa Nacional de Mianmar e especialista regional do Solidarity Center, uma organização de direitos dos trabalhadores baseada nos EUA, Andrew Tillett-Saks, afirmou que a greve “aumenta a possibilidade de que muitos outros do setor privado respondam ao chamado nos próximos dias e semanas”. “Essa é uma estratégia que pode realmente colocar pressão sobre os militares.”

O movimento pró-democracia também convocou uma mobilização em massa nesta segunda-feira (8).

"Se apelarmos à desobediência civil e à greve sem sair às ruas, não é suficiente. Temos que manter a nossa luta no mais alto nível [...] Estamos prontos para morrer", declarou à AFP Maung Saungkha, um dos líderes da contestação.

Mais de 50 pessoas morreram desde o início da insurreição pacífica contra o golpe de 1º de fevereiro.

Nas imagens que circularam nas redes sociais, forças de segurança são vistas disparando contra a multidão e retirando cadáveres de manifestantes.

O Partido União, Solidariedade e Desenvolvimento (PUSD), apoiado pelo Exército, participa dos ataques aos manifestantes.

Membros do PUSD mataram na sexta-feira (5) um representante local da LND e um adolescente de 17 anos, de acordo com a Associação para Assistência a Prisioneiros Políticos.

Neste sábado (6), as forças de segurança usaram munição letal contra os manifestantes, ainda de acordo com a ONG mianmarense. A imprensa estatal nega que a polícia e o Exército estejam ligados a essas mortes.

Entre autoridades locais, políticos, jornalistas, ativistas a artistas, centenas de pessoas foram presas desde fevereiro.

As pessoas detidas em Rangoon muitas vezes acabam na prisão de Insein, onde muitos presos políticos cumpriram penas em ditaduras anteriores.

Diante da deterioração da situação, alguns mianmarenses fogem do país. Cerca de 50, incluindo oito policiais que se recusaram a participar da repressão, chegaram à Índia.

Mianmar exigiu que o país vizinho repatriasse os oito policiais "para preservar as boas relações entre os dois países", em uma carta a que a agência de notícias AFP teve acesso.

Cerca de cem mianmarenses ainda estão na fronteira, na esperança de que tenham permissão para entrar no país.

Os generais ignoram os protestos da comunidade internacional, dividida sobre como responder.

Os Estados Unidos e a União Europeia anunciaram medidas coercitivas, mas alguns observadores pedem um embargo internacional ao fornecimento de armas, decisão que requer a concordância de todos os membros do Conselho de Segurança da ONU.

A China e a Rússia, tradicionais aliadas do Exército mianmarense e exportadoras de armas ao país, se recusam a falar em golpe.

Em Bancoc, milhares de trabalhadores mianmarenses na Tailândia se manifestaram neste domingo em frente à representação da ONU, pedindo à comunidade internacional que aja com mais firmeza.

Protesto em Bancoc, na Tailândia, contra o golpe militar em Mianmar
Protesto em Bancoc, na Tailândia, contra o golpe militar em Mianmar - Mladen Antonov/AFP
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