Novo chanceler teve bênção dos olavistas para substituir Ernesto

Carlos França trabalhava com o assessor Filipe Martins e foi aprovado por Eduardo Bolsonaro

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São Paulo

A queda do ícone bolsonarista Ernesto Araújo do Itamaraty é vista com cautela por diplomatas da ativa mais experientes, que afirmam acreditar que os princípios do grupo seguirão a ditar os rumos da política externa brasileira.

O motivo é o fato de que o novo chanceler, Carlos Alberto França, teve sua indicação aprovada diretamente pela verdadeira cúpula do grupo: o deputado e filho presidencial Eduardo Bolsonaro e o assessor de assuntos internacionais da Presidência, Filipe Martins.

O diplomata Carlos França durante seminário em Brasília, em setembro de 2017
O diplomata Carlos França durante seminário em Brasília, em setembro de 2017 - Reprodução

França não é um olavista clássico, para ficar na qualificação dada ao guru intelectual do grupo bolsonarista, Olavo de Carvalho. Não há notícia de que ele concorde com as ideias exóticas associadas ao escritor.

Ele trabalhava no mesmo ambiente, o gabinete pessoal de Bolsonaro, que Filipe Martins —apelidado nos meios diplomáticos de Sorocabannon, um modo derrogatório de associar sua origem no interior paulista com a ligação com Steve Bannon, o ideólogo-mor da direita populista americana.

França havia chegado lá por indicação de Ernesto, de quem, contudo, não consta ser amigo próximo.

Diplomata de pouca expressão, que nunca comandou uma embaixada, França é visto como uma pessoa extremamente polida e hábil no trato interpessoal. Ou seja, o contrário da visão majoritária acerca de Ernesto.

A Folha não localizou o novo chanceler, que será convidado nesta quarta (31) para marcar um depoimento à Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Um senador de oposição afirmou que é preciso dar um tempo para ver o impacto real da influência bolsonarista sobre França. Ele lembra o óbvio: o presidente não escolheria alguém que pensa o contrário de si, mas pode modular o tom.

À reportagem quatro embaixadores da velha guarda, todos enviados a postos secundários pela associação a governos passados, o que na visão de Bolsonaro implica alinhamento político, avaliaram a escolha de França. Para eles, de forma unânime, por ter um perfil menos expressivo e já estar no Palácio do Planalto, França foi ungido para cumprir uma missão. Ele não teria densidade política para dizer não e ficar sem sofrer as consequências, e ele é relativamente novo —tem 56 anos.

Assim, França pode não repetir em público os disparates de Ernesto, que se colocou como inimigo da China, maior parceira comercial do Brasil. Mas tampouco é esperado um cavalo de pau na orientação geral da política externa, que ainda está tateando depois que Donald Trump, ídolo da turma bolsonarista, não conseguiu se reeleger presidente dos EUA.

Quando o Brasil participar da cúpula climática patrocinada pelo sucessor de Trump, Joe Biden, será mais uma continuidade na proximidade com os EUA do que uma adesão ao Partido Democrata do novo líder.

E a China vinha se impondo na agenda brasileira por gravidade, devido à dependência que as duas vacinas formuladas no Brasil têm de insumos vindos do país asiático.

Um dos embaixadores ponderou que o Itamaraty terá bastante dificuldade de se livrar do legado de Ernesto, mesmo que França se mostre proativo de alguma forma.

O problema é que, como se trata de uma carreira de longo prazo, há sempre o temor de cair em algum ostracismo, em especial porque há a possibilidade de o governo Jair Bolsonaro ser reeleito em 2022. Assim, pode haver pragmatismo das gerações mais novas de diplomatas, apesar da ojeriza generalizada ao olavismo.

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