Descrição de chapéu The New York Times

Sistema de vacinação nos EUA faz pessoas com problemas de saúde lutarem por lugar na fila

Elegíveis ao imunizante variam em cada estado devido às regras locais sobre prioridades

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Danielle Ivory Amy Harmon
The New York Times

Enquanto os estados americanos começam a vacinar pessoas com condições médicas que podem aumentar o risco de um caso grave de Covid-19, a definição de regras de prioridades varia muito.

A confusão de diretrizes provocou uma corrida entre pessoas com problemas de saúde como câncer ou diabetes tipo 2 para convencer autoridades estaduais a acrescentar determinadas condições a uma lista de prioridades de vacinação que está evoluindo.

Na cidade de Royal Oak, em Michigan, Megan Bauer, que tem fibrose cística, doença genética que pode causar sérias infecções no pulmão, disse estar grata porque outras pessoas de alto risco estão sendo vacinadas: trabalhadores da saúde, professores, sua avó de 81 anos.

Se Bauer morasse em estados como Montana, Novo México, Virgínia ou em Washington, ela também poderia ser vacinada agora —mas não em Michigan. "A espera parece interminável", disse Bauer. "Com fibrose cística, cada dia é precioso, por isso é difícil perder esse tempo."

Megan Bauer tem fibrose cística e aguarda sua vez na fila da vacinação contra a Covid-19 no estado americano de Michigan
Megan Bauer tem fibrose cística e aguarda sua vez na fila da vacinação contra a Covid-19 no estado americano de Michigan - Elaine Cromie - 7.mar.2021/The New York Times

Nos primeiros meses da vacinação contra a Covid-19, os estados americanos tentaram se equilibrar entre dar prioridade aos idosos, que têm maior probabilidade de morrer pelo vírus, e pessoas em profissões com maior propensão a ser expostas a ele.

Sob recomendações do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês), pessoas com condições médicas associadas a um risco maior de sintomas graves do vírus serão as próximas.

Pelo menos 37 estados, assim como a capital, Washington, hoje permitem que moradores com certos problemas de saúde sejam vacinados, segundo uma pesquisa do New York Times. Mas os problemas de saúde que têm prioridade diferem de estado para estado, e até de município para município.

Algumas pessoas com síndrome de Down podem ser vacinadas em pelo menos 35 estados, por exemplo, mas alguns destes não estão vacinando pessoas com outros problemas de desenvolvimento.

Pelo menos 30 estados permitem que algumas pessoas com diabetes tipo 2 sejam vacinadas, mas só 23 estados incluem pessoas com diabetes tipo 1. Ao menos 19 estados estão disponibilizando a vacina para algumas pessoas com fibrose cística; ao menos 14 incluíram algumas pessoas com doença do fígado; e ao menos 15 consideraram alguns fumantes com direito à vacinação.

Pelo menos 30 estados deram prioridade a vacinar pessoas acima do peso ou obesas, segundo a pesquisa do New York Times, embora eles variem quanto ao índice de massa corporal: 25, 30 ou 40.

Alguns estados exigem que as pessoas provem que têm um problema de saúde, embora pelo menos 16 deles, além da capital, não o façam. E pelo menos 12 estados permitem que pessoas obtenham uma recomendação de um profissional de saúde para receber a vacina, mesmo que seu problema de saúde não seja considerado prioritário pelo estado.

Na ausência de estudos amplos e rigorosos sobre o efeito do coronavírus em pessoas com outros problemas médicos, especialistas afirmam que há poucos princípios claros para determinar uma sequência de prioridades entre muitas condições.

Muitos estados se baseiam numa lista de 12 tipos de condições que o CDC considera ter evidências substanciais para risco elevado de Covid, incluindo obesidade, diabetes tipo 2, tabagismo e síndrome de Down. Autoridades do CDC dizem revisar regularmente a literatura científica e vão expandir a lista conforme for apropriado.

Mas alguns especialistas em ética médica afirmam que a própria lista é enganosa, porque ela sugere que os riscos para todos os diagnósticos foram considerados e classificados. Uma pessoa de 50 anos com diabetes tipo 1 tem maior risco de Covid do que outra de 25 com anemia falciforme ou uma de 35 com deficiências intelectuais?

A questão provocou uma corrida de grupos de defensoria cívica para influenciar líderes políticos e de saúde nos Congressos estaduais para elevar certas condições de saúde na lista de prioridades.

Como as regras de vacinação podem ser definidas pelos governadores —que geralmente consultam autoridades hospitalares e seus próprios grupos de assessores médicos—, muitos pedidos assumiram um tom pessoal. "Governador Mike DeWine", escreveu em suas redes sociais Hanna Detwiler, paciente de transplante de medula em Columbus, no estado de Ohio, sobre sua incapacidade de ser vacinada no mês passado, "trabalhe melhor".

Cerca de 35 grupos de defensoria enviaram uma carta no final de janeiro ao governador Andrew Cuomo, de Nova York, depois de ficarem temerosos de que o estado não inclua explicitamente pessoas com HIV na lista de prioridades.

Os grupos citaram a própria pesquisa do Departamento Estadual de Saúde sobre HIV como um fator de risco para contrair casos graves de Covid-19. Nova York afinal se tornou um dos pelo menos 14 estados, juntamente com a capital, Washington, a anunciar que o HIV está na lista de prioridades para vacinação. Um porta-voz do Departamento de Saúde do estado disse nesta semana que Nova York já pretendia incluir esses pacientes na lista.

Em todo o país, as exigências para ser vacinado são um alvo móvel. Ohio acrescentou à lista pacientes de transplante de medula óssea como Detwiler na semana passada, depois de inicialmente oferecer a vacina somente para os que tinham recebido transplante de órgãos sólidos.

Na próxima semana, a Califórnia, onde apenas alguns municípios ofereciam vacinas a pessoas com problemas de saúde, permitirão a vacinação para milhões de pessoas doentes. Isso inverteu o plano anterior do estado de priorizar vacinas com base apenas na idade, o que provocou a oposição de defensores de direitos dos deficientes que usaram a hashtag #HighRiskCA (Califórnia alto risco).

Connecticut recentemente virou na direção oposta, pondo fim aos planos de estender a elegibilidade para a vacinação a pessoas com condições de saúde preexistentes em favor de prioridades baseadas na idade. E mesmo alguns defensores de pacientes que pressionaram pela inclusão estão desanimados pelo que talvez seja um sistema em que as vozes de pessoas com mais dinheiro ou influência prevalecem.

"Não é assim que nossas políticas públicas deveriam ser decididas, sobre quem é melhor em se defender", disse Kara Ayers, diretora do Centro para Dignidade em Atendimento de Saúde para Pessoas com Deficiências, que criou um painel de prioridades na vacinação com o Centro de Pesquisa de Deficiência de Saúde Johns Hopkins para ajudar pessoas a identificar sua situação.

Autoridades estaduais dizem que suas decisões sobre que condições de saúde incluir muitas vezes se resumem a uma combinação de evidências, logística e realidade política. Em Michigan, um anúncio recente causou confusão de sentimentos em Bauer. Nesta semana, o estado ampliou o direito a ser vacinado a pessoas com fibrose cística e outras condições médicas, desde que tenham mais de 50 anos.

Em 2019, a idade média de morte para pessoas com fibrose cística nos Estados Unidos foi 32, segundo um registro de pacientes mantido pela Fundação Fibrose Cística. "A maioria das pessoas com FC talvez não esteja nesse grupo", disse Bauer, que tem 24 anos.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.