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André Guimarães e Marcello Brito

Abrigar a maior floresta tropical do mundo não garante ao Brasil lugar no banco da frente

País precisa mostrar responsabilidade, comprometimento, transparência e bons resultados

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Marcello Brito

Presidente da ABAG (Associação Brasileira de Agronegócio)

André Guimarães

Diretor-executivo do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia)

As florestas são peça-chave para controlar as mudanças climáticas globais. Só a Amazônia, que representa cerca de 50% das florestas tropicais do mundo, estoca algo como dez anos de emissões de carbono. Se cortada, pioraria inexoravelmente o efeito-estufa. Preservada, absorve uma enorme quantidade dos gases de efeito-estufa e contribui para diminuir o problema.

Sem que as florestas sejam mantidas, o mundo terá muita dificuldade para evitar os piores cenários das mudanças climáticas nos próximos anos. Por isso, o anúncio feito por Noruega, Reino Unido e EUA durante a Cúpula do Clima promovida pelo governo de Joe Biden, de destinar inicialmente US$ 1 bilhão para projetos de preservação de florestas tropicais e subtropicais no mundo, é extremamente necessário.

A Coalizão Leaf, baseada em mecanismos de REDD+, sigla para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal, junta governos e empresas para apoiar países, estados e municípios que reduzem com sucesso e ambição as emissões de gases associadas ao desmatamento e à degradação florestal em todo o planeta. É uma peça importante na consolidação do novo mercado global de commodities verdes, que apresenta rápida expansão.

O Brasil seria um candidato óbvio ao programa, com totais condições para liderar com folga esse novo mercado. Mas nosso imenso estoque florestal e a comprovada capacidade de reduzir o desmatamento na Amazônia são atualmente eclipsados por uma posição anacrônica do governo federal sobre o que significam liderança e responsabilidade nos debates climáticos.

O aumento da derrubada da floresta é consequência da inoperância ou da baixa eficiência de ações no setor ambiental, e elas não passam despercebidas do restante do mundo. Em vez de condicionar a preservação ao envio de recursos, como se as florestas brasileiras fossem reféns e propriedade exclusiva de Brasília, o governo federal deveria reforçar medidas de comando e de controle e ampliar a capacidade das populações tradicionais, do setor privado, de estados e municípios na conservação desse ativo.

Para pleitear a bela fatia que caberia ao Brasil num mercado de commodities verdes, precisamos retomar e fortalecer medidas que, num passado recente, permitiram ao país derrubar o desmatamento da Amazônia em mais de 80% —sempre bom lembrar, dobrando a produção de soja e de carne na região e quebrando definitivamente o ultrapassado paradigma entre conservação versus expansão rural.

Podemos repetir esse feito com engajamento da sociedade em geral. Cientistas, ONGs, empresas e governos precisam trabalhar juntos para que populações tradicionais e produtores do campo tenham sua contribuição para o controle das mudanças climáticas reconhecida, e o Brasil dê um bom exemplo para o restante do mundo.

Tal qual acontece na política, no mercado de commodities nenhum espaço fica vazio, e não será diferente no campo dos ativos florestais. Ter a maior floresta tropical do mundo não garante lugar no banco da frente —é preciso mostrar responsabilidade, comprometimento, transparência e bons resultados.

Ainda não é tarde para mudar a direção, mas ela deve acontecer mais cedo do que mais tarde para não perdermos as oportunidades que surgem.

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