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Cúpula do Clima testa liderança global dos EUA sob Biden

Líder americano quer usar evento para superar isolacionismo de Trump, recuperar prestígio do país na área ambiental e se contrapor à China

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Washington

Joe Biden vestiu seu figurino conciliatório para enfrentar o que considera a grande empreitada de seu governo. Na abertura da Cúpula do Clima, nesta quinta-feira (22), o presidente americano tem o desafio de mostrar que os EUA são confiáveis na missão de liderar o mundo para uma economia mais justa e sustentável, após quatro anos de isolacionismo sob Donald Trump.

Desde que tomou posse, em janeiro, Biden decidiu fazer do debate das mudanças climáticas a oportunidade de seu país redesenhar a geopolítica global, deixando a China para trás. Como anfitrião de 40 líderes mundiais no encontro virtual desta semana, o democrata vai testar o tamanho da credibilidade que os EUA ainda têm no palco multilateral, e o Brasil pode ser personagem-chave nessa missão histórica.

O presidente americano, Joe Biden, deixa o palco após discursar na Casa Branca, em Washington
O presidente americano, Joe Biden, deixa o palco após discursar na Casa Branca, em Washington - Brendan Smialowski - 21.abr.21/AFP

De acordo com a imprensa americana, Biden vai anunciar uma nova e ambiciosa meta de cortar pela metade as emissões de gases do efeito estufa nos EUA até 2030 e espera que a latitude de seu compromisso estimule outros países a fazerem o mesmo. Seu objetivo é frear o aquecimento global em 1,5 ºC e, para isso, o planeta precisa neutralizar as emissões de carbono até 2050.

Em segundo lugar na lista de maiores poluentes, com 12,6% das emissões (a China emite 26,7%), os EUA precisam provar que vão cumprir o prometido e enfrentar obstáculos de grandes economias.

Se conseguir um comprometimento claro e mais amplo do governo Jair Bolsonaro sobre o fim do desmatamento ilegal, por exemplo, Biden pavimenta sua imagem como líder global na agenda climática —cerca de 60% da floresta amazônica ficam em território brasileiro. Caso o país não coopere, dizem assessores da Casa Branca, o democrata ainda tem como antagonizar com Bolsonaro e seguir com seu plano ao lado dos demais países da América Latina que detêm parte do bioma.

Reduzir em pelo menos 50% as emissões de poluentes nos EUA nesta década é quase o dobro do que havia sido acordado anteriormente pelos americanos no âmbito do Acordo de Paris. Em 2015, Barack Obama, de quem Biden era vice, prometeu reduzir de 26% a 28% das emissões até 2025, em relação aos índices de 2005. Dois anos depois, Trump retirou os EUA do acordo, mas Biden retomou a posição em seu primeiro dia de governo. Agora, o democrata quer mostrar que é preciso ir além das metas estabelecidas há seis anos para evitar catástrofes ambientais ainda maiores.

Biden e sua vice-presidente, Kamala Harris, vão fazer a abertura da primeira sessão da cúpula, intitulada "Aumentando nossas Ambições Climáticas", na qual falarão também os líderes das principais economias do globo —e mais poluentes— e dos países com importantes credenciais ambientais, como Brasil, China, Índia, Rússia, Reino Unido, Alemanha e França —com três minutos de discurso cada um.

Devido ao formato virtual, não haverá espaço para reuniões ou fechamentos de acordos bilaterais, segundo diplomatas envolvidos nas negociações. Integrantes do Departamento de Estado americano dizem ainda que o encontro desta quinta e sexta (23) não é considerado "uma resposta final" das nações sobre as metas ambientais, mas "parte de uma conversa" para revisar os compromissos que serão formalizados na COP26, a conferência da ONU sobre o clima, marcada para novembro, na Escócia.

Nas últimas semanas, o enviado especial para o clima de Biden, John Kerry, fez uma turnê que incluiu viagens a Reino Unido, China, Índia e Coreia do Sul para tratar da agenda verde —enquanto outro auxiliar da Casa Branca, Juan González, foi à América do Sul com o mesmo objetivo, mas deixou o Brasil de fora.

Em suas apresentações na cúpula, Canadá e Japão devem seguir o roteiro esperado pelo americano, mas China e Índia não querem estabelecer metas mais ambiciosas para 2030.

Os chineses assinaram um acordo com Washington no qual concordam em trabalhar juntos sobre o clima. No entanto, não especificaram números nem deixaram de provocar os americanos. Autoridades de Pequim compararam a volta dos EUA ao Acordo de Paris ao retorno de um estudante que faltava às aulas, ressaltando que ainda precisam mostrar como compensarão o que não fizeram nos últimos quatro anos.

Além da negligência de Trump, historicamente há razão para o ceticismo internacional sobre os EUA quando o assunto é aquecimento global. Essa é a segunda vez que o país retoma as tratativas ambientais em duas décadas. Nos anos 1990, os EUA foram um dos poucos países que não ratificaram o Protocolo de Kyoto, primeiro grande pacto para a redução global das emissões de poluentes.

Em 2015, Obama assinou o Acordo Climático de Paris —apesar de não ter avançado com metas mais ousadas em razão das divisões políticas no Congresso, que existem até hoje—, mas viu seus esforços derreterem dois anos depois, quando Trump tirou o país do tratado.

A desconfiança e a pouca vontade política de alguns países dificultam o plano de Biden de ver todos os participantes da cúpula assumindo compromissos para neutralizar todo o carbono emitido até 2050 —o Brasil disse que o faria até 2060, mas poderia se antecipar caso tivesse ajuda financeira externa.

Os americanos, por sua vez, condicionam a liberação de recursos a resultados tangíveis. "Se [países como o Brasil] não agirem por conta própria, é muito difícil a comunidade global se envolver", disse um diplomata americano em conversa com jornalistas na véspera da abertura da cúpula.

A alternância entre democratas e republicanos à frente da Casa Branca abala a confiança internacional dos EUA em relação a metas de longo prazo, mas Biden quer mostrar que está atuando para deixar marcas definitivas e uma herança mais sustentável aos americanos —o que inclui um pacote trilionário de infraestrutura com a criação de novas bases de produção e criação de empregos.

A mensagem de Biden é pragmática: com esforço conjunto, é possível estabelecer metas mais contundentes para frear o aquecimento global, modernizando a cadeia de produção dos países ricos e ajudando as nações mais pobres a mostrarem resultados na agenda ambiental. Resta saber se o mundo vai acreditar nas suas promessas e deixá-lo reconfigurar a política do globo sob a pressão do clima.


Cúpula do Clima

Quando quinta (22) e sexta (23)

Quem além do anfitrião Joe Biden, foram convidados 40 líderes, incluindo Jair Bolsonaro (Brasil), Xi Jinping (China) e Angela Merkel (Alemanha)

Horário A partir das 9h de Brasília a cada dia (a ordem dos discursos não foi anunciada)

Onde acompanhar Será possível assistir aos discursos pelo site do evento (em inglês)

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