Descrição de chapéu Financial Times China

Projeto de cidade xodó de Xi Jinping trava por falta de apoio do mercado

Como forma de combater poluição em Pequim, dirigente chinês queria que empresas e estatais da capital se mudassem para Xiong'an

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Sun Yu
Xiong’an (China) | Financial Times

Um projeto de desenvolvimento chinês defendido pelo líder Xi Jinping está emperrado por disputas sobre custos e a relutância de empresas a se mudarem para a área, segundo autoridades locais e moradores.

Xiong'an, situada na província central de Hebei, a apenas 130 km do complexo onde fica o comando do Partido Comunista chinês em Pequim, foi designada como uma nova área prioritária por Xi em 2017.

O projeto é essencial para a visão do líder chinês de uma capital menos congestionada e poluída, e centenas de empresas estatais e agências do governo foram escolhidas para se mudar para Xiong'an.

Linha de trem em Xiong'an, uma das novas obras da cidade
Linha de trem em Xiong'an, uma das novas obras da cidade - Mou Yu - 27.dez.20/Xinhua

A ideia é que a área também funcione como parte do legado de Xi, assim como a transformação de Shenzhen, na província de Guangdong, no sul, fez por Deng Xiaoping (principal dirigente do país do final dos anos 1970 ao fim dos 1980).

Xiong'an, com uma população de 1,3 milhão, já abriga uma das maiores estações de trens do mundo em área, que começou a funcionar em dezembro. Mas economicamente é um lugar atrasado, cheio de estradas de terra, prédios sem graça e obras interrompidas.

Em uma visita num dia de semana recente, apenas 30 dos mais de 2.200 lugares no saguão da estação de Xiong'an, que custou mais de 30 bilhões de yuans (R$ 24,7 bilhões), estavam ocupados.

"Xiong'an é produto do planejamento central que vai contra os princípios do mercado", disse Zhuang Bo, principal economista para a China na consultoria TS Lombard, em Londres. "Ela teve dificuldade para decolar porque a mão invisível [do mercado] tem maior impacto que a intervenção do governo."

Projetos marcados para conclusão no final de 2023, quando Xi deverá iniciar um inédito terceiro mandato como presidente, custarão 146 bilhões de yuans (R$ 120,6 bilhões). Mas o China Xiong'an Group (CXG), o principal veículo de investimento para projetos de infraestrutura local, recebeu apenas 749 milhões de yuans (R$ 619 milhões) em empréstimos de longo prazo nos primeiros nove meses do ano passado.

Pessoas próximas do CXG, controlado pelo governo provincial de Hebei, já altamente endividado, disseram que a firma estava relutante em aumentar a dívida.

A dívida oficial do governo de Hebei, excluindo empréstimos por veículos de financiamento do governo local, era de 1,1 trilhão de yuans (R$ 909 bilhões) no final do ano passado, contra 615 bilhões de yuans (R$ 508 bilhões) em 2017. O governo provincial desprovido de caixa, porém, quer que o governo central financie uma grande parte da construção num momento em que o governo de Xi tenta conter as medidas de estímulo adotadas no ano passado, no pico do surto de Covid-19 na China.

O resultado da batalha é a construção mais lenta que o esperado, segundo uma autoridade de Xiong'an que não quis ser identificada. "Não há garantia de que o CXG possa gerar fluxo de caixa suficiente para pagar a dívida. Hebei teria de entrar em cena se as coisas derem errado."

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Alguns moradores também se queixaram de que o projeto de Xi provocou grandes aumentos nos preços dos imóveis locais. Quando a visão do dirigente foi revelada, em 2017, especuladores de toda a China chegaram a Xiong'an para comprar propriedades.

Em resposta, as autoridades locais suspenderam muitos projetos imobiliários, restringindo a oferta e paralisando os compradores, que pagavam aluguéis altos enquanto esperavam a entrega de suas casas.

Li Yang, funcionário de escritório de 35 anos, disse que seu aluguel mais que triplicou nos últimos quatro anos, enquanto ele espera pela conclusão de um apartamento que comprou em 2016.

"Graças à política do governo, eu gasto a maior parte da minha renda em aluguel e pagamentos da hipoteca de uma casa incompleta e sem data para terminar", disse ele.

As autoridades locais, por sua vez, culparam o governo central pelas dificuldades de Li, dizendo que cabia a Pequim decidir quando suspenderá a proibição. "O presidente Xi disse que não podemos começar a construir até que o uso de cada centímetro de terra esteja planejado", disse ao Financial Times uma autoridade da habitação de Xiong'an que não quis ser identificada.

A proibição de construções também aumentou as pressões fiscais sobre o CXG e o governo local, que depende da venda de terrenos para a maior parte de suas receitas —que chegaram a 3,3 bilhões de yuans (R$ 2,7 bilhões) no ano passado, 25% abaixo da meta.

Outro problema da economia local, antes conhecida por suas indústrias de roupas e plásticos, foi o fechamento forçado ou a realocação de mais de 4.000 fábricas.

As indústrias poluidoras não se encaixam na visão de Xi de uma Xiong'an limpa e verde e tiveram de dar lugar a um fluxo antecipado de empresas estatais e seus empregados vindos de Pequim. Em consequência do fechamento das fábricas, o desemprego disparou. Xiong'an criou menos de 10 mil empregos urbanos em 2019, comparados com a meta oficial de 40 mil.

Em um relatório publicado no ano passado, Lin Shunli, professor na Universidade de Hebei, disse que a reorganização industrial aplicou um "golpe significativo" no emprego local, causando a queda da renda das famílias enquanto os jovens continuam desempregados "por longos períodos de tempo".

"Vamos nos beneficiar pouco da chegada das estatais", disse Ye Shanshan, um lojista. "Eles querem pessoas com diploma de faculdade, que poucos moradores têm."

Muitas empresas estatais e seus empregados, entretanto, continuam relutantes a se mudar para Xiong'an, que não tem serviços públicos no nível de Pequim. "Levará muitos anos para que Xiong'an se equipare a Pequim em termos de boas escolas e hospitais", disse um executivo de uma estatal que recebeu ordem para se mudar. "Estamos preocupados com a perda de funcionários depois que nos mudarmos."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves  

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