Descrição de chapéu The New York Times

Ao mesmo tempo diminuído e dominador, Trump ensaia próximo ato

Em convenção do partido, ex-presidente volta a repetir teorias de manipulação das eleições e promete voltar à Casa Branca

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Annie Karni Maggie Habberman
Greenville (Carolina do Norte) | The New York Times

Donald Trump, o ex-presidente dos Estados Unidos, vai de seu clube de golfe em Nova Jersey até a cidade de Nova York para trabalhar em seu escritório na Trump Tower pelo menos uma vez por semana, entrando e saindo de Manhattan sem chamar muita atenção.

O lugar não está como ele o deixou. Vários de seus antigos funcionários se foram, assim como a maioria dos parentes que trabalhavam lá com ele e algumas peças fixas do lugar, como seu ex-advogado Michael Cohen, que desde então se voltou contra ele. Trump trabalha ali quase sozinho, com duas secretárias e alguns guarda-costas.

Sua operação política também encolheu para uma equipe de ex-assessores que continuam em sua folha de pagamentos, reminiscentes do elenco básico de personagens que ajudaram a levantar um neófito político à sua improvável vitória em 2016. A maioria deles passa dias ou semanas sem interagir com Trump pessoalmente.

O ex-presidente dos EUA Donald Trump durante convenção do Partido Republicano em Greenville, na Carolina do Norte - Jonathan Drake - 5.jun.21/Reuters

Mas quando ele falou no sábado (5) à noite na convenção republicana na Carolina do Norte, no que foi anunciado como a retomada de seus comícios e discursos, Trump era ao mesmo tempo uma figura reduzida e uma presença gigante na vida americana, com um poder notável —e, segundo muitos, perigoso— sobre seu partido.

Mesmo sem seus megafones preferidos e os acessórios do cargo, Trump paira sobre a paisagem política, animado pela mentira de que ele ganhou a eleição de 2020 e por sua própria fúria pela derrota.

Ao contrário de outros queixosos, ele conseguiu impor sua raiva e versão preferida da realidade a uma fatia substancial do eleitorado americano —com o potencial de influenciar a política do país e enfraquecer a fé em suas eleições pelos próximos vários anos.

Ainda bloqueado no Twitter e no Facebook, ele lutou para encontrar uma maneira de influenciar a cobertura da mídia depois de deixar o cargo e promover a invenção de que a eleição de 2020 foi roubada.
Alguns líderes do partido, como o líder da minoria no Senado, Mitch McConnell, fingem que ele não existe mais, mas prestam deferência quando Trump não pode ser ignorado.

Outros, como o senador Rick Scott, da Flórida, tentaram obter favores presenteando Trump com prêmios inventados para alisar seu ego e mantê-lo envolvido na tentativa de levar os republicanos a recuperar a maioria no Senado em 2022.

O historiador presidencial Michael Beschloss disse que Trump desafiou o modelo de ex-presidentes que perdem a eleição e tendem a desaparecer, e a experiência de Richard Nixon, que foi tratado como um pária de uma forma que Trump conseguiu evitar.

Quanto a ser simultaneamente grande e pequeno, disse Beschloss, "ele é grande se a métrica for que os políticos o temem, que é uma métrica de poder em Washington". "Muitos líderes republicanos ficam aterrorizados com ele e se diminuem na sua frente."

Jason Miller, um assessor do ex-presidente, concorda sobre o controle de Trump sobre o partido. "Há dois tipos de republicanos no círculo de Washington", disse Miller. "Os que percebem que o presidente Trump é o líder do Partido Republicano e os que são negacionistas."

Mesmo na derrota, Trump continua sendo o primeiro colocado para a nomeação presidencial do Partido Republicano em 2024 em todas as pesquisas públicas feitas até agora.

Os legisladores que contestaram sua predominância no partido, como Liz Cheney, de Wyoming, que implorou que seus colegas o rejeitassem depois do tumulto causado por seus seguidores no Capitólio em 6 de janeiro, foram expulsos da liderança republicana.

De seu estranho poleiro de irrelevância e dominação, Trump se concentrou em três coisas: repetidas afirmações falsas de que a eleição de 2020 foi "manipulada" e o apoio a tentativas de derrubar os resultados; as investigações estaduais e locais das práticas da Organização Trump; e a situação da sua empresa.

Trump, que segundo duas autoridades da Casa Branca assistiu com prazer quando seus apoiadores invadiram o Capitólio em 6 de janeiro e perturbaram a certificação do voto do Colégio Eleitoral, disse a várias pessoas que acredita ser possível uma "recondução" à Casa Branca em agosto, segundo três pessoas inteiradas de seus comentários.

Ele vem repetindo uma teoria promovida por apoiadores como Mike Lindell, executivo-chefe da My Pillow, e Sidney Powell, advogado que está sendo processado por difamação por companhias de urnas eletrônicas por divulgar teorias da conspiração sobre a segurança das votações.

A vitória do presidente Joe Biden, com mais de 80 milhões de votos, foi certificada pelo Congresso depois que o tumulto em 6 de janeiro foi contido. Não há mecanismo legal para reinstalar um presidente, e as tentativas dos republicanos no Senado do Arizona de recontar os votos no maior condado do estado foram recusadas como falsas e inadequadas por autoridades republicanas locais, que dizem que o resultado é um circo partidário que está desgastando a confiança nas eleições.

De todo modo, Trump se concentrou no esforço no Arizona e em um processo na Geórgia para insistir que não só ele será restaurado no cargo, como também os republicanos vão retomar a maioria no Senado por meio dos mesmos esforços, segundo pessoas informadas sobre o que ele disse.

Alguns de seus assessores não estão ansiosos para se envolver com ele em suas teorias da conspiração e gostariam de vê-lo promover uma agenda voltada para o futuro que poderia ajudar os republicanos em 2022. Pessoas em seu círculo brincam que a mais antiga assessora do ex-líder do mundo livre é Christina Bobb, uma correspondente da One America News Network, de ultradireita, eternamente pró-Trump, a quem ele pede regularmente informações sobre a auditoria no Arizona.

Em seu discurso de 90 minutos no sábado (5), Trump repetidamente atacou a China pelo coronavírus, desfiou uma litania de questões da guerra cultural conservadora e terminou com um longo ataque frontal à votação e à democracia americana, em que ele endossou uma longa lista de propostas republicanas de supressão de eleitores.

Trump levantou denúncias elaboradas e sem fundamento de fraude generalizada e "milhares" de pessoas mortas que votaram em Biden, pediu que a votação seja limitada em quase todos os casos ao voto pessoal no dia da eleição e rejeitou os resultados da eleição de 2020 como produto do "crime do século".

"Não sou eu que tenta solapar a democracia americana", disse Trump a uma multidão entusiasmada, depois de acusar falsamente os democratas de roubar a eleição de 2020 e criticar os votos por correio e em trânsito. "Eu sou quem está tentando salvá-la. Por favor, lembrem-se disso."

O ex-presidente estava acompanhado de sua nora, Lara Trump, que estava de olho em uma vaga no Senado de seu estado natal, a Carolina do Norte, mas saiu da disputa no sábado à noite.

"Estou dizendo 'não' por enquanto, não para sempre", disse Lara à multidão. Trump disse que estava esperando que ela tomasse uma decisão e endossou do palco o deputado Ted Budd, que contestou a contagem do Colégio Eleitoral em 6 de janeiro.

O primeiro comício de Trump após o período na Presidência está marcado para este mês, seguido de mais aparições públicas em benefício próprio, pagas por seu supercomitê de ação política, e em nome dos deputados republicanos que apoiam sua agenda, disseram assessores.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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