Descrição de chapéu oriente médio

Netanyahu ataca coalizão que pode pôr fim a sua era de poder em Israel

Premiê faz alerta sobre 'perigoso governo de esquerda' e associa bloco opositor ao terrorismo

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Jerusalém | Reuters

Com sua era como líder do governo de Israel por um fio, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu adotou em suas redes sociais uma estratégia de combate ao bloco de oposição que pode pôr fim a seu período de 12 anos no cargo.

Nesta quinta-feira (3), em publicações no Twitter, Bibi, como ele é conhecido, disse que "todos os legisladores eleitos por votos da direita devem se opor a este perigoso governo de esquerda".

O premiê se refere à coalizão anunciada nesta quarta-feira (2), depois de 28 dias de negociações, por Yair Lapid, líder do partido Yesh Atid e cabeça do bloco que agora busca sustentação no Parlamento para formar um novo governo.

O premiê israelense, Binyamin Netanyahu, chega ao Parlamento no fim de maio - Yonatan Sindel - 30.mai.21/AFP

Embora tenha, sim, membros da esquerda radical, como os do partido Meretz, a coalizão também é formada por legendas de espectros que vão do centro à direita nacionalista. Em comum, apenas a vontade de afastar Netanyahu, o mais longevo primeiro-ministro da história israelense e o primeiro a enfrentar acusações criminais corrupção, suborno e fraude— durante o mandato.​

Lapid é o atual chefe da oposição, mas quem vai assumir o cargo de primeiro-ministro nos primeiros dois anos do novo governo será Naftali Bennett, líder da legenda de ultradireita Yamina e antigo aliado de Netanyahu.

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Em outra publicação no Twitter, Bibi destacou os vínculos da nova aliança com Mansour Abbas, líder da Lista Árabe Unida (ou Ra'am), partido que representa a minoria árabe em Israel e também compõe a coalizão. A postagem inclui um vídeo em que Bennett aparece dizendo que Abbas "visitou terroristas assassinos na prisão" após um ataque em 1992 no qual cidadãos árabes de Israel mataram três soldados.

A tentativa de associação pejorativa reitera, ainda que de forma indireta, posturas de Netanyahu que lhe renderam acusações de racismo. No passado, o premiê instou seus partidários a votarem usando o argumento de que "os árabes estavam indo às urnas em massa" —algo que soa como uma ameaça para a direita nacionalista.

Durante anos, Netanyahu afirmou que nunca faria alianças políticas com essa minoria e, em campanhas anteriores, também recorreu a uma retórica racista associando árabes ao terrorismo fundamentalista. No último ciclo eleitoral, porém, visitou comunidades árabes para pedir votos para o Likud, já que sua permanência no governo parecia depender justamente do apoio do Ra'am.

"Digo aqui com clareza e franqueza: quando o próprio estabelecimento deste governo for baseado em nosso apoio, seremos capazes de influenciá-lo e realizar grandes coisas para nossa sociedade árabe", disse Abbas durante um pronunciamento a apoiadores.

Nesta quinta, Joe Biden e Kamala Harris parabenizaram o presidente eleito de Israel, Isaac Herzog. Ele foi escolhido durante uma eleição indireta na quarta e deve substituir o atual presidente, Reuven Rivlin, no próximo mês, após o fim do mandato de sete anos. Ambos os líderes americanos elogiaram Herzog como alguém capaz de promover o diálogo, proteger Israel e aprofundar os laços com os EUA.

No total, a coalizão que deve afastar Netanyahu será formada por oito partidos: Yamina, Israel Nossa Casa, Nova Esperança (as três de direita), Yesh Atid, Azul e Branco (ambas de centro), Trabalhista, Meretz (dupla de esquerda) e Ra’am. Inicialmente, a expectativa era a de que o Ra’am apenas apoiasse a aliança no Parlamento, sem fazer parte formalmente do governo. No início da semana, no entanto, Abbas afirmou que irá fazer parte do grupo e que espera indicar alguns nomes para o segundo escalão —será a primeira vez na história que uma legenda árabe vai integrar o governo israelense.

A união entre diferentes forças do espectro político foi a única maneira encontrada para pôr fim à atual crise política em Israel, que já dura mais de dois anos. Nesse período foram realizadas quatro eleições, mas todas terminaram com resultados inconclusivos, com um bloco de apoio a Netanyahu e, outro, de oposição —nenhum dos dois lados tinha cadeiras suficientes para governar sozinho, criando um impasse.

O próximo passo é a aprovação do novo gabinete pelo Knesset, o Parlamento de Israel. Apenas quando todo esse processo for concluído, o novo primeiro-ministro tomará posse, e Netanyahu deixará o cargo.

A sessão parlamentar na qual a nova coalizão pode ser aprovada por maioria simples, no entanto, pode estar a até 12 dias de distância, disse nesta quinta Avigdor Lieberman, líder conservador do Israel Nossa Casa. Qualquer tentativa de antecipar a votação deve ser barrada pelo presidente do Parlamento, Yariv Levin, aliado de Netanyahu, o que gera a expectativa de que o premiê deve seguir tentando reverter o cenário que lhe é desfavorável.

A reviravolta é possível, já que o bloco formado pela oposição tem apenas 61 das 120 cadeiras no Legislativo. Assim, caso um deputado se rebele, a aliança perde a maioria e não consegue remover o atual premiê.

A grande questão no país agora é o que Netanyahu, um político conhecido pelo instinto de sobrevivência, vai fazer. Da outra vez em que foi removido do cargo de premiê, em 1999, ele anunciou que se aposentaria da vida pública e passou a trabalhar como executivo de uma empresa de telecomunicações —apenas para retornar à política alguns anos depois. Desta vez, porém, a expectativa é a de que, enquanto se defende das acusações na Justiça, ele siga no Parlamento como líder do Likud e da oposição, preparando o terreno para tentar reassumir o cargo nas próximas eleições, daqui a quatro anos.


QUAIS PARTIDOS INTEGRAM O NOVO GOVERNO DE ISRAEL

Yesh Atid (17 cadeiras) Liderado por Yair Lapid, antigo apresentador de um dos principais telejornais do país, é o maior partido do novo governo e se situa na centro-direita do espectro político

Azul e Branco (8) Centrista, a sigla liderou a oposição a Netanyahu entre 2019 e as últimas eleições, em março, quando perdeu espaço para o Yesh Atid. Seu líder e fundador é Benny Gantz, ex-comandante do Exército israelense e atual ministro da Defesa

Yamina (6) Sigla de direita radical que tem como principal bandeira a luta pelos assentamentos israelenses na Cisjordânia. É liderada por Naftali Bennett, filho de imigrantes dos EUA que ficou milionário quando vendeu sua empresa de software e que deve ser o novo premiê

Israel Nossa Casa (7) A sigla une discurso nacionalista de direita e um forte sentimento secular, opondo-se ferozmente à presença de ortodoxos na política. Seu líder é o controverso Avigdor Lieberman, que nasceu na União Soviética e migrou para Israel aos 20 anos de idade

Nova Esperança (6) O partido de direita foi criado pelo advogado e ex-ministro Gideon Sa'ar e por outros ex-integrantes do Likud que estavam insatisfeitos com a liderança de Netanyahu na sigla

Trabalhista (7) De centro-esquerda, é historicamente o principal partido israelense, com raízes no movimento sionista e importante participação na fundação do país. Nos últimos anos, porém, perdeu força. Sua líder é a jornalista Merav Michaeli

Meretz (6) Partido de esquerda radical que tem ganhado força nos últimos anos, com a perda de apoio dos trabalhistas. Liderado pelo jornalista Nitzan Horowitz, faz duras críticas às ações israelenses na Cisjordânia e na Faixa de Gaza

Ra’am (4) Sigla islâmica conservadora que no início do ano decidiu romper a aliança que mantinha com os outros partidos árabes, mais progressistas. Liderada por Mansour Abbas, será a primeira legenda árabe a fazer parte oficialmente do governo israelense


O CAMINHO PARA A FORMAÇÃO DO NOVO GOVERNO

23.mar Israel realiza sua quarta eleição em dois anos, e, assim como nos demais pleitos, nenhum partido conquista maioria do Parlamento. A sigla Likud, de Netanyahu, tem o maior número de assentos, com Yesh Atid (Lapid) em segundo lugar

6.abr Presidente do país dá o prazo de 28 dias para que o atual premiê forme um governo. Ele tenta atrair partidos religiosos e de direita menores, incluindo o Yamina, mas acaba falhando

5.mai Rivlin dá o mesmo prazo a Lapid, que busca unir partidos de lados opostos do espectro político, como os árabes que normalmente se opõem à agenda mais à direita de alguns membros da coalizão

10.mai Conflito entre Israel e Hamas começa em Gaza, e protestos eclodem em muitas cidades com população judia e árabe em Israel, pausando as negociações

21.mai Negociações voltam com a declaração de um cessar-fogo

30.mai Bennett anuncia que irá aderir à coalizão ao lado de rivais centristas para tirar Netanyahu do poder

2.jun O prazo para o acordo de um novo governo ser fechado encerra às 23h59, e Lapid informa Rivlin que conseguiu formar a coalizão cerca de uma hora antes do horário limite

Meados de junho O novo governo deve tomar posse

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