Descrição de chapéu Governo Trump

Livro relata como cúpula militar dos EUA se preparou para barrar possível golpe de Trump

Em resposta, ex-presidente afirma que, se fosse forçar insurreição, chefe do Estado-Maior Conjunto seria última pessoa com quem iria contar

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São Paulo

A cúpula militar dos EUA planejou diferentes estratégias para lidar com uma possível aventura golpista de Donald Trump após a derrota na eleição presidencial no ano passado. O relato faz parte do livro “I Alone Can Fix It” (sozinho consigo consertar), cujos trechos foram obtidos pela emissora americana CNN.

A obra, dos vencedores do prêmio Pulitzer e repórteres do Washington Post Carol Leonnig e Philip Rucker, com lançamento marcado para a próxima terça-feira (20), conta que os integrantes do Estado-Maior Conjunto e seu chefe, o general Mark Milley, chegaram a discutir uma renúncia coletiva para não terem de cumprir ordens consideradas por eles ilegais, perigosas ou imprudentes.

O general Mark Milley, à esq., conversa com o ex-presidente Donald Trump no Capitólio, em Washington
O general Mark Milley, à esq., conversa com o ex-presidente Donald Trump no Capitólio, em Washington - Livier Douliery - 4.fev.20/AFP

A assistentes, segundo relata a CNN a partir dos trechos obtidos, o general deixou claro que Trump e seu entorno até poderiam tentar um golpe, mas não teriam sucesso. “Você não consegue fazer isso sem os militares. Você não consegue fazer isso sem a CIA e o FBI. Somos os caras com as armas.”

O relato mostra como o chefe dos militares, cujo papel é aconselhar o presidente, preparou-se para um confronto com o líder do país, uma atitude inédita na história moderna americana. Milley, segundo o livro, via Trump como um “clássico líder autoritário sem nada a perder” e enxergava similaridades entre a retórica de Adolf Hitler e as falsas alegações de fraude nas eleições feitas pelo republicano.

Assim, nos dias que antecederam a invasão do Capitólio, em 6 de janeiro, o temor do general era o de que houvesse um “momento Reichstag”, em referência ao incêndio à sede do Parlamento alemão, crucial para o estabelecimento da ditadura nazista no país europeu.

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Milley fez outros paralelos com o nazismo. Antes de uma marcha realizada em novembro, em protesto ao resultado do pleito, o chefe dos militares disse temer que o ato se tornasse o equivalente americano aos “camisetas marrons nas ruas”, a milícia pró-nazista que estimulou a chegada de Hitler ao poder.

Depois da invasão, o general falava todos os dias com o então chefe de gabinete de Trump, Mark Meadows, e o secretário de Estado, Mike Pompeo. Segundo o relato de um alto funcionário, o tema das conversas era que, “faça chuva ou faça sol”, haveria transferência pacífica de poder, como ocorreu.

O clima de tensão seguiu até a cerimônia de posse, em 20 de janeiro. Os integrantes do Estado-Maior Conjunto discutiram não só o ataque ao Congresso, mas também especularam uma série de cenários, que incluíam protestos nos Legislativos estaduais e a possibilidade de Trump se recusar a deixar o cargo.

Para a posse, Washington ficou em lockdown para evitar que grupos de extrema direita perturbassem o evento. Milley não dourou a pílula ao alertar sobre a ameaça iminente. “É o seguinte: esses caras são nazistas, são boogaloo boys, são Proud Boys. Essas são as mesmas pessoas contra quem lutamos na Segunda Guerra. Vamos colocar um anel de aço em volta dessa cidade, e os nazistas não vão entrar.”

Um funcionário próximo ao general afirmou à CNN que Milley não tratará publicamente das questões trazidas na obra, mas tampouco contestou o relato de que se envolveu em atividades que não fazem parte do seu papel tradicional. Disse ainda que o general não estava chamando Trump de nazista, mas sentiu não haver escolha a não ser reagir, dado o temor em torno do que aquela retórica poderia provocar.

O ex-presidente, por sua vez, divulgou um longo comunicado, no qual afirma que nunca ameaçou ou falou com ninguém sobre um golpe no governo. “[Isso é] tão ridículo!” O republicano disse ainda que a “eleição é minha forma de ‘golpe’” e que, se fosse fazê-lo, Milley seria a última pessoa com quem iria contar.

O então presidente dos EUA Donald Trump segura Bíblia em frente à igreja de St. John, em Washington
O então presidente dos EUA Donald Trump segura Bíblia em frente à igreja de St. John, em Washington - Tom Brenner - 1º.jun.20/Reuters

Na obra, os autores, que ouviram mais de 140 pessoas, a maioria das quais sob condição de anonimato, citam o general várias vezes como alguém que tentou defender a democracia americana em um momento de tensão no país. O militar, no entanto, também é lembrado como a figura que esteve ao lado de Trump na operação para que o ex-presidente tirasse uma fotografia em frente à igreja St. John, com uma bíblia na mão, após forças federais dispersarem violentamente manifestantes pacíficos em frente à Casa Branca.

Após o episódio, o militar se desculpou e disse que não deveria estar lá. Ainda assim, o chefe do Estado-Maior Conjunto manteve o cargo após a posse de Biden. Na cerimônia de posse, a vice-presidente Kamala Harris agradeceu a atuação de Milley nos bastidores, afirma o livro, enquanto o general expressou alívio ao casal Obama. “Ninguém tem um sorriso maior do que eu hoje”, teria dito ele.

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