Cofundador do Talibã e considerado o número 2 na hierarquia da facção, Abdul Ghani Baradar chegou a Cabul neste sábado (21) e deve liderar as negociações para a formação da estrutura do governo do grupo fundamentalista islâmico, que retomou o poder no Afeganistão nesta semana.
O mulá Baradar, capturado por forças de segurança em 2010 e solto desde 2018, quando passou a comandar o escritório político do Talibã no Qatar, já havia voltado ao país na terça (17), instalando-se inicialmente em Kandahar.
Porta-vozes disseram à agência de notícias Reuters que o grupo deve consolidar a formação de um governo nas próximas semanas, destacando equipes para lidar com finanças e questões de segurança. Haverá ainda um gabinete de gestão de crise, composto também por membros da gestão anterior.
Outro porta-voz, Zabihullah Mujahid, em entrevista coletiva no começo da semana, iniciou uma espécie de ofensiva do grupo extremista para mostrar moderação. Ele negou represálias do Talibã contra antigos adversários e afirmou que os direitos das mulheres serão protegidos —dentro do "arcabouço do islã".
Por outro lado, entrevista do membro da cúpula Waheedullah Hashimi à Reuters destacara, entre os pontos do governo projetado, que ele não seria um sistema democrático, "porque isso não tem base no nosso país; [...] é a lei da sharia".
Baradar, que tem na agenda nos próximos dias encontros com militares, jihadistas, líderes locais e religiosos, também deve se encontrar com dirigentes da rede Haqqani, de acordo com a AFP. A esse grupo radical, considerado terrorista pelos EUA e pela ONU, foi confiada a segurança da capital, Cabul.
A confusão vista ao longo da semana, com registro de ao menos 12 mortos e vários feridos —além de cenas que se tornaram um dos símbolos do noticiário, de afegãos tentando agarrar-se à fuselagem de um cargueiro e ao menos duas pessoas caindo do avião após a decolagem—, permanece.
Neste sábado, o governo suíço informou ter adiado a decolagem de um voo fretado rumo ao Uzbequistão. "A segurança no entorno do aeroporto de Cabul piorou significativamente nas últimas horas. Uma multidão em frente ao terminal e por vezes confrontos violentos impedem acesso ao local", disse em nota o Ministério das Relações Exteriores.
Os esforços dos EUA para a evacuação de Cabul incluem parcerias para receber voos —desafogando a sobrecarregada base militar americana no Qatar— e refugiados. Nesta sexta, o secretário de Estado, Anthony Blinken, anunciou que 13 países, incluindo Chile, Colômbia e México, concordaram em abrigar afegãos retirados pelo país.
Na Europa, a retirada recebeu duas críticas. O ex-premiê britânico Tony Blair, que envolveu o Reino Unido na invasão ao Afeganistão em 2001, escreveu no site de sua fundação um artigo sobre o que chamou de abandono do país. "É algo trágico, perigoso e desnecessário", disse. "Não é do interesse do povo afegão nem do nosso."
E o chefe da diplomacia da UE, Josep Borrell, afirmou, sobre o prazo de 31 de agosto, definido para a saída definitiva das tropas dos EUA: "Querem retirar 60 mil pessoas de hoje até o fim do mês. É matematicamente impossível".
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, por sua vez, disse que a UE não reconheceu o Talibã nem manterá conversas com o grupo neste momento. Ela instou europeus a acolher refugiados afegãos e assegurou que países-membros teriam apoio financeiro do bloco. "Faço um chamado a todos os países que participaram de missões no Afeganistão, principalmente os europeus, que determinem cotas suficientes de admissão de refugiados afegãos." Von der Leyen acrescentou que a UE irá direcionar recursos orçamentários para apoiar quem se dispuser a acolher refugiados.
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