"O Taleban ganhou a guerra; teremos que negociar com eles", afirmou nesta terça-feira (17) o responsável por Relações Exteriores e política de segurança da União Europeia, Josep Borrell, após reunião com ministros da área dos 27 países-membros do bloco.
Borrell disse que estabelecer o diálogo com o grupo é a única forma de conseguir tirar do país estimados 380 afegãos e familiares que trabalhavam em instituições da UE, além de um número ainda impreciso de cidadãos europeus de diferentes missões e órgãos.
“Não se trata de reconhecer governo, mas de olhar para o futuro e lidar com as autoridades, sejam quais forem, para obter o respeito aos direitos humanos, principalmente de mulheres e crianças, e garantir que o terrorismo seja combatido”, disse.
Grupo que foi sinônimo de radicalismo fundamentalista islâmico no final do século 20, o Taleban derrubou o governo do Afeganistão no último domingo (15), numa rápida campanha militar em meio à retirada das tropas dos Estados Unidos do país.
O chefe da diplomacia da UE afirmou que o colapso do governo afegão e a tomada de poder pelos talebans terá “grande impacto na segurança regional e internacional”: “É o mais importante evento desde que a Crimeia foi arrebatada pela Rússia, com grandes consequências para o mundo ocidental”.
De acordo com Borrell, o Ocidente precisará refletir sobre o fracasso de duas décadas de intervenção e investimentos na construção de uma nova sociedade no país asiático.
A luta contra a organização Al Qaeda no Afeganistão foi bem-sucedida nesse período, segundo ele, mas o processo de construção da nação falhou, "apesar da enorme quantidade de recursos direcionados ao país".
A União Europeia, um dos principais doadores para programas de desenvolvimento afegão, afirmou que esses repasses estão suspensos, mas que ajuda humanitária será mantida.
Nesta segunda, em discurso sobre a vitória do Taleban, o presidente americano, Joe Biden, lamentou a situação, mas foi taxativo ao dizer que o objetivo dos EUA no Afeganistão nunca foi construir um país.
A reunião desta terça da UE também discutiu como evitar que a crise afegã resulte em milhões de refugiados chegando às portas da Europa, como aconteceu em 2015 e 2016.
O tema será assunto de novo encontro, marcado para esta quarta, entre os ministros do Interior —que também discutirão a crise imigratória na Lituânia e em vizinhos, provocada pelo que o bloco chama de “guerra híbrida” promovida pela Belarus.
Segundo Borrell, uma das formas de lidar com o fluxo migratório afegão será apoiar países limítrofes, como Paquistão e Irã.
Fora da UE, países europeus como Albânia e Kosovo aceitaram pedido dos Estados Unidos para abrigar em seus territórios refugiados afegãos que procuram asilo na América do Norte.
Questionado sobre se acreditava que o Taleban de hoje pudesse ser diferente do que foi vencido 20 anos atrás, Borrell respondeu que a tomada de poder era ainda muito recente para qualquer avaliação. “Aparentemente são os mesmos. Mas falam inglês melhor”, acrescentou.
Ainda nesta terça, o secretário-geral da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), Jens Stoltenberg, criticou o que chamou de "fracasso das autoridades afegãs" ante o Taleban e a rapidez com que os rebeldes ocuparam Cabul.
"Os aliados sabiam que a alternativa não seria continuar [no Afeganistão] com presença militar limitada, mas provavelmente continuar com presença ampliada de tropas da Otan e mais uma vez se envolver em combates", disse, em Bruxelas.
Para Stoltenberg, as forças da Otan "combateram com coragem", mas não conseguiram "controlar o país" por causa do fracasso das autoridades locais em se opor aos talebans e chegar a uma solução pacífica.
Depois de tomar o poder, o grupo lançou uma ofensiva nesta terça para se mostrar mais tolerante, que incluiu uma entrevista na TV para uma apresentadora mulher.
Em outra conversa com jornalistas, o porta-voz Zabihullah Mujahid disse que o Taleban quer paz, negou represálias contra antigos adversários e afirmou que os direitos das mulheres serão protegidos —dentro do "arcabouço do Islã".
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.