Descrição de chapéu Governo Biden

Biden fala em 'caos inconstitucional' após Suprema Corte negar suspensão de lei antiaborto

Presidente da Câmara promete pautar tema no retorno do recesso do Congresso

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São Paulo | Reuters

Um "caos inconstitucional" pode se abater sobre os Estados Unidos após a Suprema Corte do país negar a suspensão de uma lei antiaborto aprovada no estado do Texas, afirmou o presidente Joe Biden, elevando o tom da disputa com o tribunal máximo do país, cuja maioria atual é conservadora.

Na noite de quarta (1º), a corte permitiu que o estado do sul dos EUA passe a proibir o aborto após a sexta semana de gravidez, na primeira decisão do tipo desde que o direito à interrupção da gravidez foi garantido para as mulheres americanas, em 1973, decorrente do caso Roe vs. Wade.

Policial da Suprema Corte faz guarda do tribunal em Washington
Policial da Suprema Corte faz guarda do tribunal em Washington - Drew Angerer - 1º.set.21/Getty Images/AFP

Biden subiu o tom nesta quinta (2) ao pedir medidas do Executivo para garantir a conservação do direito no país, uma vez que a decisão da Suprema Corte pode gerar um efeito cascata. O presidente do Senado estadual da Flórida, o republicano Wilton Simpson, por exemplo, disse a uma emissora local que planeja seguir o exemplo do Texas e apresentar uma proibição semelhante na próxima sessão do órgão.

O presidente disse que a Casa Branca vai investigar o que os departamentos de Saúde e Justiça podem fazer como forma de reação.

A nova legislação texana tem uma característica incomum: deixa a fiscalização da aplicação da regra a cidadãos individuais, que poderiam receber recompensas em dinheiro —de pelo menos US$ 10 mil, ou R$ 52 mil, na cotação desta quinta— por processar mulheres que busquem o aborto após a sexta semana de gestação.

O denunciante, que nem precisa morar no Texas ou ter qualquer relação com a grávida, pode também processar quem tiver auxiliado o aborto, a exemplo de quem pagou pelo procedimento ou o motorista de táxi que levou a mulher até a clínica —algo sem precedente no país.

"Isso desencadeia o caos inconstitucional e dá poderes a fiscais autoproclamados, o que pode ter impactos devastadores", disse Biden, em um comunicado em que instrui agências federais a agirem para proteger o direito ao aborto. "Estranhos completos terão o poder de se intrometer nas decisões de saúde mais privadas e pessoais enfrentadas pelas mulheres."

A proibição entrou em vigor nesta quarta e permite que o aborto aconteça apenas num momento em que muitas mulheres não sabem nem sequer que estão grávidas. Assim, a lei equivaleria a uma proibição quase total do procedimento no Texas —o segundo estado mais populoso dos EUA—, já que entre 85% e 90% dos abortos são feitos após a sexta semana de gravidez. Outra consequência seria o provável fechamento de clínicas que realizam a prática, de acordo com grupos ativistas.

A nova regra também não faz diferenciação se a gravidez aconteceu em caso de estupro ou incesto. Pela regra em voga no restante do país, a interrupção da gravidez é permitida enquanto o feto não é viável —até por volta de 22 a 24 semanas.

A decisão do tribunal, por 5 votos a 4, ilustra o impacto das três nomeações conservadoras do ex-presidente Donald Trump para a mais alta corte do país. Um dos seis conservadores do tribunal, John Roberts, porém, juntou-se aos outros três juízes considerados mais progressistas na dissidência.

"A decisão é impressionante", escreveu a juíza Sonia Sotomayor, que votou a favor da suspensão da lei. “Uma lei flagrantemente inconstitucional, projetada para proibir as mulheres de exercerem seus direitos.”

Mesmo garantido há quase 50 anos, o direito ao aborto ainda divide os EUA, de acordo com pesquisa da agência de notícias Reuters com o instituto Ipsos. Cerca de 52% disseram que a prática deveria ser legal na maioria ou em todos os casos, e 36% dizem que deveria ser ilegal na maioria ou em todos os casos.

O número de procedimentos registrados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA vem em queda. Em 2009, por exemplo, foram 790 mil registros. Em 2018, 620 mil.

Como não há legislação federal sobre o assunto, o direito ao aborto se escora na decisão da Suprema Corte de 1973. A presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, criticou a legislação texana e prometeu colocar um projeto de lei em pauta quando a Casa voltar do recesso, no final deste mês.

Os democratas têm ligeira maioria no Congresso, mas a aprovação na Câmara não garantiria o sucesso no Senado, que exige que 60 de seus 100 membros apoiem a legislação —há 50 senadores democratas.

Pelosi afirmou que a lei representa "uma catástrofe para as mulheres no Texas", sobretudo para as que vêm de comunidades mais pobres ou fazem parte de minorias.

Uma opção que alguns democratas defendem é mudar a regra que exige 60 votos no Senado, de modo que a lei possa ser aprovada com maioria simples, de 51 votos —além dos 50 votos de senadores democratas, a vice-presidente Kamala Harris, também democrata, vota em caso de empate.

"Democratas podem ou abolir a regra de obstrução [que exige 60 votos] ou não fazer nada enquanto milhões de corpos, direitos e vidas são sacrificados por uma minoria de extrema direita", disse a deputada Alexandria Ocasio-Cortez no Twitter. "Não deveria ser uma decisão difícil de ser tomada."

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