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Guan Yu foi um dos maiores guerreiros da China. Conhecido pelo talento para as estratégias militares, por seu senso de justiça e por ser o inventor da guan dao (uma das armas mais famosas do kung fu), o general foi imortalizado no clássico literário "Romance dos Três Reinos".
O respeito dos chineses por Guan levou a prefeitura de Jingzhou, na província de Hubei, a achar que seria uma boa ideia construir uma estátua de 57 metros de altura, coberta por mais de 4.000 tiras de bronze. Foi na cidade onde o general perdeu uma de suas batalhas mais famosas. O plano era lucrar com turismo após a inauguração da obra.
Acabou não dando certo. Além de não trazer o retorno esperado, a construção desrespeitou a legislação da cidade ao ultrapassar o limite máximo de 24 metros de altura na zona histórica.
Os curadores da estátua tiveram que mover a estrutura para uma área suburbana, a oito quilômetros do local original. O custo da mudança foi orçado em ¥ 155 milhões (R$ 127,5 milhões), quase o mesmo valor necessário para a construção, ¥ 170 milhões (R$ 140 milhões).
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A agência antisuborno da China e a Comissão Central de Inspeção Disciplinar exigiram explicações da prefeitura. Alegam que a estátua representa "um desperdício" e que o próprio projeto "arruinou a aparência histórica da cidade".
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Oficiais do governo nacional pediram que líderes locais sejam mais conscientes quanto ao uso de verba pública para projetos sem retorno financeiro garantido.
À rede de televisão CCTV o vice-diretor do departamento de recursos naturais e planejamento de Jingzhou, Qin Jun, afirmou que a remoção será necessária para se adequar às regras da cidade.
Por que importa: na década passada, a China investiu em obras faraônicas, usualmente com o propósito de aquecer a construção civil e fomentar o turismo doméstico. Esse período parece ter acabado. O líder chinês, Xi Jinping, reforçou em declarações a necessidade de conter gastos excessivos e promoveu uma grande campanha contra a corrupção. O “puxão de orelha” público aos idealizadores da estátua pode significar um alerta contra aventuras dispendiosas no futuro.
o que também importa
Empresas de tecnologia que operam na China podem se ver obrigadas a obedecer a novas regras de otimização de algoritmo. O projeto de regulação foi anunciado pela Administração do Ciberespaço da China (CAC, na sigla em inglês) e visa filtrar as recomendações oferecidas a usuários.
De acordo com o texto, os algoritmos não poderão promover conteúdo que "coloque em risco a segurança nacional ou perturbe a ordem econômica e social". Ao contrário, será necessário "espalhar energia positiva", "exaltar os valores convencionais" e prevenir "maus hábitos", sobretudo em menores de idade propícios a se "viciarem em internet".
As regras proíbem sites das empresas de oferecerem preços ou tratamentos diferenciados de acordo com dados coletados à revelia do usuário. Será possível bloquear informações, impedindo a entrega de anúncios personalizados.
As autoridades determinaram também que empresas protejam entregadores e motoristas de aplicativo com compensações e recompensas baseadas no tempo de trabalho de cada um.
O projeto foi aberto para consulta pública e receberá sugestões até o dia 26 de setembro.
Um blogueiro ganhou as graças da imprensa oficial chinesa após defender a regulação de empresas de tecnologia. Morador da província de Hubei, Li Guangman publicou um longo artigo em que classifica as recentes medidas para conter a adoração a celebridades como parte de uma "revolução profunda" no Estado chinês.
Ele elogiou multas aplicadas a famosos acusados de sonegação e afirmou que a China está “passando por uma transformação profunda na área de economia, finanças, cultura e política".
O texto foi republicado nas edições online de vários veículos proeminentes na China, como a agência de notícias oficial Xinhua e o periódico do PC Chinês, Diário do Povo. Sentindo-se respaldado, Li publicou um segundo artigo, dessa vez se dizendo credenciado pelo governo.
A arrogância não pegou bem, e pelas redes sociais o editor do Global Times, que é associado ao Diário do Povo, acusou o blogueiro de "oferecer descrições imprecisas, usar linguagem exagerada, desviar-se das principais políticas do país e enganar as pessoas". O blogueiro não respondeu.
O Uruguai está perto de concluir um acordo de livre-comércio com a China. De acordo com o presidente do país sul-americano, Luis Lacalle Pou, houve "avanços concretos" nas conversas com os chineses. Ele falou sobre o tema com Xi Jinping e vem defendendo a possibilidade de flexibilizar as cláusulas do Mercosul, permitindo a assinatura de acordos bilaterais.
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A negociação acontece a despeito das regras do bloco que exigem consenso entre membros e negociações comerciais conjuntas.
As tratativas foram reveladas a membros dos partidos da coalizão governista, representantes da oposição e posteriormente informadas aos membros do bloco (Argentina, Brasil, Paraguai e Bolívia).
A novidade não agradou os vizinhos. "O Mercosul se rege pela regra do consenso (...). O Uruguai pode fazer um acordo bilateral com a China por fora do Mercosul ou seguir no Mercosul", afirmou o ministro de Desenvolvimento Produtivo da Argentina, Matías Kulfas.
A China é a principal parceira dos uruguaios, sendo o destino de mais de 27% de todas as exportações do país no ano passado. Pequim compra principalmente laticínios, carne e soja.
fique de olho
Desde que ascendeu ao poder, Xi Jinping respaldou boa parte de sua popularidade em uma cruzada contra a corrupção, com esforços para punir quem recebe subornos. Nesta semana, porém, a Comissão Central de Inspeção Disciplinar percebeu uma brecha na legislação: o parco arcabouço legal para punir o subornador. O órgão anunciou uma série de medidas para sanar o problema, como a exposição de casos publicamente e o aumento de penas para corruptores.
Por que importa: um dos conceitos mais famosos nas relações interpessoais chinesas é o guānxì (关系), que pode ser interpretado como "rede de contatos", mas tem mais relação com troca de favores e influência. Vários empresários dedicam anos a sedimentar relações com membros importantes do PC Chinês, não raro envolvendo compra de presentes e pagamentos de jantares caros. Com as novas regras, esse tipo de comportamento deve se tornar alvo de escrutínio.
para ir a fundo
- A China anunciou que vai abrir uma nova bolsa de valores em Pequim, somando-a às outras duas principais do país (Shenzhen e Shanghai). O Sixth Tone explica quais são as motivações por trás da decisão e como a bolsa de Pequim vai ajudar pequenos e médios investidores. (gratuito, em inglês)
- Em 1981, um membro da Comunidade Judaica de Taiwan enviou uma solicitação comum ao grupo: um amigo judeu chegaria ao território e precisaria de ajuda para se estabelecer. Os membros logo se prontificaram, e Nathan Rabinovitch foi recebido com casa e comida. Ele era, na verdade, um espião dos invasores japoneses. O South China Morning Post conta a história dele. (gratuito, em inglês)
- Quais são as perspectivas para a economia chinesa na era pós-Covid? A diretora de economia do Centro Empresarial Brasil-China, Fabiana D’Atri, fala sobre o tema neste sábado em evento do think tank Observa China. As inscrições são limitadas. (gratuito, em português)
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