Série traz narrativa mais completa e equilibrada sobre os 20 anos pós-11 de Setembro

'Ponto de Virada' é um dos lançamentos recentes no streaming a tratar dos atentados e seus desdobramentos

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Carlos Graieb

Os 20 anos dos atentados de 11 de Setembro, a serem completados neste sábado, trouxeram aos canais de streaming três novas produções sobre o tema, bastante diferentes entre si. Uma delas vale a pena.

"Ponto de Virada: 11/9 e a Guerra Contra o Terror" é um documentário em cinco partes, que pode ser visto na Netflix. Abrange desde a formação da Al Qaeda, o grupo terrorista que atirou os aviões contra as Torres Gêmeas e o Pentágono, até a retirada das tropas americanas do Afeganistão, concluída há poucos dias. Trata-se da mais completa —e equilibrada— narrativa em vídeo dessas duas décadas de medo e guerras.

Nenhum dos grandes debates ensejados pelo 11/9 e pela resposta americana a ele fica intocado. A série enfoca a tese do choque de civilizações, que contraporia o Ocidente ao islã. Fala da legitimidade das políticas antiterrorismo dos Estados Unidos, que abriram espaço para o uso de tortura em interrogatórios. Destrincha as falhas de estratégia militar que levaram à Guerra do Iraque e minaram a confiança dos afegãos nas tropas americanas e nos seus aliados, dando ao Talibã a oportunidade de ressurgir.

O conjunto de entrevistas também é notável. Dos muitos depoimentos já colhidos de sobreviventes das Torres Gêmeas, alguns dos mais tocantes talvez estejam na série. Além disso, os documentaristas tiveram acesso tanto a insiders de Washington, como Alberto Gonzales, um dos principais arquitetos da legislação que deu base à guerra ao terror, quanto a combatentes, políticos e gente comum de países que foram alvo dos Estados Unidos.

O resultado não é uma série que sucumbe ao relativismo, dando o mesmo peso a todos os pontos de vista. Trata-se, antes, de fazer justiça a uma história que, por ser longa demais, complexa demais e por demais repleta de encruzilhadas, precisa ser vista com o máximo de nuances e detalhes.

Em contraste com o amplo painel de Ponto de Virada, o filme "9/11: Inside the President 's War Room" (11/9: na sala de guerra do presidente), disponível na Apple TV, concentra-se nos movimentos de George W. Bush no dia dos atentados. A premissa é interessante, mas não o resultado.

O julgamento da Presidência de Bush não costuma ser generoso. O seu melhor momento teria sido justamente a resposta ao 11/9, logo no começo do mandato. Bush mostrou compaixão ao visitar Nova York três dias depois da tragédia e firmeza ao pôr-se imediatamente no encalço de Osama bin Laden. O propósito do filme, com entrevistas inéditas de Bush e equipe, parece ser o de consolidar essa imagem para a posteridade.

O então presidente americano, George W. Bush, recebe de seu chefe de gabinete, Andrew Card, a informação do choque de aviões contra o World Trade Center, em Nova York, durante evento em uma escola na Flórida - Win McNamee - 11.set.01/Reuters

A célebre cena de Bush, atordoado em uma escola primária da Flórida logo depois de saber do ataque às Torres Gêmeas, é reinterpretada como a de um líder prestes a agir. Insiste-se muito no desejo do presidente de voltar rapidamente a Washington para tomar as rédeas da situação, a despeito da orientação contrária de seus seguranças. Acima de tudo, reitera-se que a falha em antecipar os ataques terroristas deveu-se inteiramente a desencontros entre CIA e FBI que o presidente desconhecia e não tinha como remediar.

Todo esse esforço é meio desajeitado. Transparece a ansiedade para limpar do retrato de Bush qualquer manchinha, inclusive as virtuais. O filme ganha os ares de peça de propaganda.

O terceiro lançamento é um drama, novamente da Netflix, baseado na história de um personagem real, Kenneth Feinberg, o advogado a quem foi entregue a tarefa de gerir o fundo de compensação das vítimas do 11/9. Novamente, o recorte é mais promissor do que o produto final.

Há duas sinopses possíveis para "Worth — Quanto Vale?". A primeira: homem corre contra o tempo para fazer as famílias das vítimas de uma tragédia abrirem mão do direito de processar Deus e o mundo. A segunda: homem descobre que dinheiro não basta para medir o valor de uma vida. Os dois enredos não se encaixam muito bem. O segundo, além disso, descreve uma jornada espiritual fajuta, à qual o ator Michael Keaton se esforça para dar alguma verossimilhança.

Kenneth Feinberg escreveu dois bons livros sobre processos de indenização coletiva, nos quais ele já havia atuado antes do 11/9 e continuou atuando depois. Neles, há uma reflexão madura e sensível sobre os dilemas morais, legais e políticos envolvidos no trabalho de oferecer alguma espécie de justiça a pessoas atingidas por um evento extremo. O filme não precisava ser tolo.

Ponto de Virada: 11/9 e a Guerra Contra o Terror

  • Onde Disponível na Netflix
  • Classificação 16 anos
  • Produção Estados Unidos, 2021
  • Direção Brian Knappenberger

9/11: Inside the President 's War Room

  • Onde Disponível na Apple TV
  • Produção Estados Unidos, 2021
  • Direção Adam Wishart

Worth — Quanto Vale?

  • Onde Disponível na Netflix
  • Classificação 14 anos
  • Produção Estados Unidos, 2020
  • Direção Sara Colangelo
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