Descrição de chapéu Folhajus Ásia talibã

Juízas afegãs ameaçadas pelo Talibã chegam ao Brasil após operação de resgate

Grupo de 26 pessoas inclui dez juízes, sete mulheres e três homens, além de seus filhos e outros familiares

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São Paulo

O Brasil recebe nesta semana um grupo de dez magistrados afegãos e suas famílias que obtiveram o visto humanitário e foram resgatados por uma operação conjunta entre associações de classe nacionais e internacionais. Muitos deles julgaram casos envolvendo membros do Talibã e estavam ameaçados de morte após a tomada do poder no país pelo grupo fundamentalista.

No total, são 26 pessoas: sete juízas —três das quais com maridos que também são juízes—, além de seus filhos e outros parentes próximos. A primeira família chegou ao Brasil nesta segunda-feira (18), outra veio na terça (19) e as cinco restantes chegam nesta quarta.

Detalhes sobre a operação de resgate não podem ser divulgados por razões de segurança, mas os voos que os trouxeram para o Brasil vieram da Turquia, da Macedônia do Norte e da Grécia.

A presidente da Grécia, Katerina Sakellaropoulou, em encontro com magistradas afegãs que deixaram o país em Atenas, na semana passada - Alkis Konstantinidis - 12.out.21/Reuters

Quem encabeça a operação é a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), atendendo a um pedido da Associação Internacional de Mulheres Juízas, que informou que 270 mulheres atuavam como magistradas no Afeganistão e buscavam países dispostos a acolhê-las.

As famílias que chegam nesta semana irão morar inicialmente em Brasília, em uma hospedagem provisória. A AMB fez tratativas com o governo para facilitar a concessão dos vistos para esses profissionais. Preparou também um plano de atendimento aos recém-chegados, que inclui parcerias com planos de saúde, escolas, atendimento psicológico e outros serviços de assistência.

A entidade afirma que lançará nesta quarta-feira (20) uma campanha para arrecadar fundos que ajudem a mantê-los financeiramente por um período.

“Eles deixaram muito claro que querem independência, querem trabalhar, prosseguir nos estudos”, conta Renata Gil, presidente da AMB. “Acho que vão conseguir retomar a vida rapidamente, porque são muito qualificados. Até lá, vamos dar um suporte.”

Segundo Gil, o grupo tem poucas informações sobre o Brasil, mas está grato pela acolhida. “Eles estão assustadíssimos, mas na expectativa de saber como é a vida no país. É muito bonito e elegante o jeito como eles agradecem. Eles falam que estamos realmente salvando a vida deles.”

Em sua ofensiva para retomar o poder em meio à retirada das tropas ocidentais do Afeganistão, o Talibã abria as portas das prisões de cada cidade conquistada, libertando seus combatentes e outros criminosos; muitos iam atrás de quem os condenou para se vingarem. Segundo relatos das associações internacionais, os juízes e suas famílias estavam tendo que se mudar de uma casa para outra ou passar dias em esconderijos precários em busca de segurança.

O visto humanitário para afegãos foi anunciado pelo Brasil em 3 de setembro. Em dezembro de 2020, o país havia reconhecido a situação de “grave e generalizada violação de direitos humanos” na nação da Ásia Central, algo que agiliza o processo de obtenção de refúgio por cidadãos desse país.

Só é possível fazer essa solicitação, porém, estando já no Brasil, e, para a viagem, os afegãos precisam de visto. Até então, era preciso pleitear o documento de turismo ou o destinado a reunião familiar, mais difíceis de serem obtidos, especialmente para quem sai às pressas de uma situação de crise humanitária.

A nota conjunta da Justiça e do Itamaraty que anunciou a portaria do visto humanitário afirmava que o país levaria em conta, entre as prioridades, "a situação particular das magistradas afegãs que foi trazida ao conhecimento do governo brasileiro". Em discurso no mês passado na Assembleia-Geral da ONU, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) também destacou a categoria ao dizer que o país acolheria "cristãos, mulheres, crianças e juízes afegãos".

Os alertas para o risco corrido pelas juízas já vinham desde antes de as tropas americanas deixarem o Afeganistão e cresceram após o assassinato de duas juízas do Supremo Tribunal local em um ataque em janeiro deste ano.

Atualmente, são poucos os refugiados afegãos em território brasileiro: no total, há 162 já reconhecidos e 49 processos em andamento, segundo dados recentes do Ministério da Justiça.

Há outras iniciativas para trazer refugiados afegãos para o Brasil, desenvolvidas por voluntários, empresas e organizações não governamentais. Em algumas, porém, há confusão em relação ao passo a passo para a obtenção do visto. As dificuldades em que esbarram, como uma longa lista de exigências das embaixadas, praticamente inviabiliza o processo.

Entre as exigências estão plano de saúde e odontológico, comprovação de renda mensal, hospedagem, alimentação, transporte, teste PCR para Covid-19 e custos para revalidação de diplomas, por exemplo.

Segundo a Defensoria Pública da União (DPU), esses requisitos são ilegais. A entidade enviou uma petição ao Ministério das Relações Exteriores solicitando modificação dos critérios e mais transparência nas informações sobre o processo.

O Itamaraty, por sua vez, disse que as orientações em questão não são obrigatórias e que foram repassadas às embaixadas apenas para casos em que o pedido de visto humanitário se dê por meio de instituições privadas ou ONGs e envolva grupos numerosos de pessoas.

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