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Justiça argentina retira acusação contra Cristina Kirchner em caso ligado a atentado à Amia

Ataque ocorreu em 1994, mas não houve condenações até hoje; promotor que indiciou atual vice-presidente morreu em 2015

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Buenos Aires | AFP e Reuters

A Justiça argentina encerrou nesta quinta (7) um processo ligado ao atentado contra a Associação Mutual Israelita Argentina (Amia), em 1994, livrando a atual vice-presidente do país, Cristina Kirchner, da acusação de acobertar os supostos responsáveis pelo ataque que deixou 85 mortos e 300 feridos.

A ação contra Cristina e vários de seus funcionários foi aberta pelo já falecido promotor Alberto Nisman. Para ele, ao assinar em 2015 o Memorando com o Irã para interrogar fora da Argentina os acusados, a então presidente tentava livrar ex-autoridades iranianas de acusações em troca de benefícios comerciais.

O tribunal, no entanto, teve uma interpretação diferente do caso. “O Memorando de Entendimento com o Irã, independentemente de ser considerado um acerto ou um erro político, não constituiu um crime nem um ato de acobertamento”, assinalou em sua decisão.

Mulher tira cabelo da frente dos olhos enquanto fala ao microfone
Cristina Fernandez de Kirchner, vice-presidente da Argentina - Natacha Pisarenko/Reuters

Em sua argumentação na corte, Cristina descreveu a acusação como “um disparate, um escândalo judicial e político, obra de um instrumento de perseguição aos opositores políticos do governo de Mauricio Macri [2015-19].” Ela chegou a ter um pedido de prisão feito pela Justiça.

A autoria do ataque de 1994 foi atribuída a governantes iranianos, liderados pelo então presidente do país, Ali Rafsanjani. O episódio, até hoje, não gerou condenações, e o memorando, assinado em 2013, com o aval do Congresso argentino, nunca foi ratificado pelo Legislativo em Teerã.

Nisman indiciou Cristina em janeiro de 2015, quando ela cumpria o último ano de seu segundo mandato como presidente. Dias depois, quando seria interrogado no Congresso, ele foi encontrado em sua casa morto com um tiro na cabeça. O caso chocou o país e levantou suspeitas de que teria sido assassinado.

Assim como até hoje não se sabe quem atacou a Amia —a maior suspeita recai sobre o grupo libanês Hizbullah com apoio do Irã— nem a razão, tampouco é conhecido o contexto da morte de Nisman, se ele se suicidou ou se foi assassinado. Neste caso, por quem e por quê.

Todos os réus na ação por suspeita por acobertamento, incluindo o já falecido ex-ministro das Relações Exteriores Héctor Timerman, foram dispensados nesta quinta, mas ainda é possível recorrer da decisão na Câmara de Cassação Penal. A vice-presidente argentina já foi dispensada de vários processos por corrupção durante seus dois mandatos presidenciais (2007-15), mas ainda responde a seis.

Nesta sexta (8), o advogado que representou Cristina na corte, Gregorio Dalbón, disse que a Delegação de Associações Israelitas Argentinas —organização que moveu a ação contra a dirigente— deveria pedir desculpas, assim como dois dos juízes que participaram do caso, Mariano Borinsky e Gustavo Hornos.

“Esses personagens sinistros entraram com um processo que era claramente incoerente e não atendia aos requisitos formais. Em vez de apelar [entrar com recurso], eles deveriam se desculpar, porque não houve crime e havia pessoas presas. Para eles, justiça é apenas o que lhes convém”, afirmou, pedindo a renúncia dos dois magistrados.

Já o senador peronista Oscar Parrilli, outro dos réus dispensados, afirmou que não descarta processar juízes e promotores do caso. “Quando você lê todos os fundamentos, percebe a grande mentira que foi montada.”

O ataque à Amia em 1994 teve, além de consequências sociais e políticas, desdobramentos diretos na área de segurança da região. Apenas dois anos antes, em 1992, outro ataque em território argentino —daquela vez na embaixada de Israel— deixou 22 mortos e feriu mais de 240 pessoas.

Os episódios foram prontamente associados pelo governo de Carlos Menem, com apoio dos Estados Unidos, à comunidade árabe que reside na região da Tríplice Fronteira —onde se encontram os territórios de Brasil, Argentina e Paraguai. Nunca houve, porém, comprovação do argumento.

Os atentados do 11 de Setembro, poucos anos depois, que deram início à chamada guerra ao terror, porém, fizeram com que o governo americano depositasse ainda mais interesse na região, vista como possível financiadora do terrorismo do grupo islâmico xiita Hizbullah.

O conjunto dos episódios e a pressão internacional fizeram com que a segurança aumentasse na região —com presença militar ostensiva—, o preconceito recaísse sobre a comunidade árabe local e leis antiterrorismo fossem, paulatinamente, rascunhadas pelos legislativos de Argentina, Paraguai e Brasil.

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