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Eleições em Honduras têm esquerda na liderança em pleito marcado por crises

Xiomara Castro, esposa do ex-presidente Manuel Zelaya, sustenta 20 pontos de vantagem contra candidato governista

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Guarulhos

As mais importantes eleições presidenciais da história recente de Honduras podem ter a primeira mulher como vencedora. Com cerca de 51,45% da votação deste domingo (28) apurada, a esquerdista Xiomara Castro de Zelaya (Libertad y Refundación), 62, soma 53,61% dos votos. Líder da oposição hondurenha, ela é esposa do ex-presidente Manuel Zelaya, deposto por um golpe de Estado em 2009.

O governista Nasry Asfura está em segundo lugar, com 33,87% dos votos, e o empresário Yani Rosenthal vem em terceiro, com pouco mais de 9%. Como não há segundo turno no país centro-americano, aquele que conseguir a maioria dos votos ao fim da apuração comandará Honduras até janeiro de 2026.

A principal candidata das eleições em Honduras, Xiomara Castro - Yoseph Amaya - 20.nov.21/Reuters

Ao longo do horário de votação, jornalistas independentes compartilharam nas redes sociais relatos de confusão nos centros eleitorais e forte policiamento nas ruas, o que aumentou o temor de que repressão semelhante à adotada pelo Estado em 2017 se repetisse. Naquele ano, 23 hondurenhos morreram em meio a protestos contra a eleição do atual presidente, Juan Orlando Hernández, de direita.

Ainda que apenas metade dos votos tenha sido apurada, a principal candidata já declarou vitória e promoveu eventos com os apoiadores na capital Tegucigalpa. Em discurso na noite de domingo, Xiomara afirmou ter vencido a disputa e prometeu promover um governo de reconciliação. "Estendo a mão a meus opositores porque não tenho inimigos. Vou convocar o diálogo com todos os setores de Honduras", disse.

O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, aliado de Xiomara e Zelaya, fez coro às palavras de vitória. O venezuelano felicitou a candidata em uma rede social e disse que, após 12 anos de golpe de Estado, "o povo retomou o caminho da esperança dando uma histórica vitória à presidente eleita".

O presidente do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), Kelvin Aguirre, disse, porém, que nenhum candidato pode se declarar vencedor "até que a última ata seja processada". Segundo o órgão, o pleito teve participação de 68% dos mais de 5,1 milhões habilitados a votar —o país tem 9 milhões de habitantes.

Apesar das críticas do chefe do órgão eleitoral, ao menos até o fim da tarde desta segunda os números da apuração da eleição hondurenha estavam paralisados desde as 6h55 do horário local (9h55 em Brasília).

A demora para atualizar as cifras gerou questionamentos em redes sociais. No começo da apuração, o site do órgão oficial chegou a ficar fora do ar, o que lembrou problema parecido nas eleições de 2017, disse Augusto Aguilar, ex-presidente do CNE, ao canal de TV CNN En Español.

"Essa preocupação existiu durante toda a campanha eleitoral, porque nas eleições de 2017 a transmissão foi interrompida mais de 600 vezes. É necessário investigar se existe alguma intenção de provocar irregularidades", disse. Pouco depois, o site voltou ao ar, mas a apuração passou o dia paralisada. No Twitter, a conselheira do CNE Rixi Moncada pediu "responsabilidade e paciência" à população.

Até o momento, o órgão eleitoral também não divulgou resultados preliminares da eleição de 128 deputados para o Congresso —se o Partido Nacional, governista, mantiver o controle do Legislativo e Xiomara realmente for eleita, como aponta a apuração inicial, ela deve ter dificuldades para assegurar a governabilidade. No mesmo pleito, os hondurenhos também votaram para eleger 298 prefeitos.

Além de enfrentar problemas domésticos como denúncias recorrentes de corrupção nos postos de poder e a presença do narcotráfico, o próximo presidente de Honduras terá a missão de lidar com a pobreza crônica —pesquisas sugerem que mais de 50% da população hondurenha vive abaixo da linha da pobreza.

Pesa também a responsabilidade de fomentar oportunidades em território nacional, em especial para os mais jovens, que têm emigrado em massa. O desemprego subiu mais de 5 pontos percentuais em 2020, chegando a 10,9%, em grande parte devido ao coronavírus, que matou 10,4 mil pessoas no país.

Durante o discurso de domingo, Xiomara voltou a afirmar que tem o compromisso de "garantir aos jovens que, em sua terra natal, eles encontrarão o que precisam para gerar oportunidades e bem-estar para sua família". Um dos principais destinos da migração partindo de Honduras, que, ao lado da Guatemala e de El Salvador, compõe o chamado Triângulo do Norte, são os Estados Unidos.

Hondurenhos só estão atrás dos mexicanos como principal nacionalidade a tentar entrar de maneira ilegal na fronteira sul do país. Pelo menos 309 mil deles foram detidos por agentes na fronteira dos EUA com o México durante o ano fiscal de 2021, quando 1,7 milhão foram detidos na região, número recorde.

Por essa razão, a governabilidade que o futuro presidente de Honduras conseguirá também tem sido ponto de preocupação de Washington. Um alto funcionário do Departamento de Estado americano disse a repórteres, na última semana, que o resultado do pleito "é um momento importante não apenas para os hondurenhos, mas também para a América Central e todo o hemisfério", segundo o Washington Post.

Xiomara também consolidou seu favoritismo na reta final da campanha com uma agenda que inclui a legalização dodo casamento homossexual e do aborto em casos de estupro —hoje, o procedimento é proibido no país em quaisquer circunstâncias.

Asfura, seu principal adversário, é o atual prefeito da capital do país, Tegucigalpa, e chegou a ser considerado favorito durante a corrida eleitoral, em especial por contar com o apoio do Partido Nacional, tradicional e ligado a figuras politicamente expressivas.

A legenda, assim como Xiomara, chegou a celebrar uma suposta vitória –ainda que, desde o início da contagem, ele estivesse atrás da adversária. "A vontade dos hondurenhos foi demonstrada nas urnas, e 'papi a la ordem' [como é conhecido] é o novo presidente", publicou o partido no Facebook.

O eleito também terá de lidar com as altas cifras de assassinatos de ativistas ambientais no país que, historicamente, lidera o ranking per capita mundial de líderes sociais mortos. O nome mais conhecido é o de Berta Cáceres, vencedora do prêmio ambiental Goldma, assassinada em 2016 em meio a uma disputa com uma hidrelétrica. Em 2020, 17 ativistas foram mortos no país, segundo a ONG Global Witness.

Durante a corrida eleitoral, pelo menos 31 pessoas ligadas às eleições foram assassinadas, de acordo com monitoramento do Observatório da Violência da Universidade Nacional Autônoma de Honduras.

Com AFP

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