Descrição de chapéu África chuva clima

Escorpiões no Egito picam mais de 500 pessoas após inundações em região desértica

Assuã foi atingida por chuva raríssima e infestada de escorpiões-negros, que podem matar um adulto em uma hora

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

BAURU (SP)

Mais de 500 pessoas foram hospitalizadas no Egito depois de terem sido picadas por escorpiões levados para dentro das casas pelas inundações na cidade de Assuã, no sul do país, a cerca de 950 km do Cairo.

De acordo com o jornal egípcio Al Ahram, os moradores foram transferidos para hospitais locais para receber doses do antídoto contra o veneno dos escorpiões.

A espécie identificada —o escorpião-negro, também conhecido como escorpião de cauda gorda— é considerada uma das mais letais. Ele mede geralmente entre oito e dez centímetros, tem até seis pares de olhos e emite um ruído oriundo das vibrações de seu corpo para localizar suas presas.

Cientista tenta capturar escorpião em laboratório de Dakhla, no Egito - Khaled Desouki - 4.fev.21/AFP

O veneno do animal pode matar um adulto sem tratamento em uma hora, motivo pelo qual o animal foi classificado pelos cientistas de Androctonus crassicauda, que pode ser traduzido como "matador de homens", segundo a rede Al Jazeera.

O Ministério da Saúde egípcio disse ter garantido que todas as unidades de saúde estavam bem abastecidas com os antídotos. Os moradores que foram picados relataram sintomas como dor intensa, febre, vômito, diarreia, tremores musculares e espasmos na região da cabeça.

Os escorpiões foram forçados a sair de suas tocas no deserto após uma tempestade raramente vista em Assuã, cidade que recebe, em média, 1 milímetro de chuva por ano. Na última sexta-feira (12), porém, chuvas torrenciais inundaram a região, e moradores relataram ter visto escorpiões às centenas.

Com seus vastos desertos, o Egito é considerado um paraíso para esses animais. Eles habitam a área há milhares de anos, de modo que dois reis egípcios tomaram seus nomes emprestados. A mitologia conta ainda que Ísis, a mais poderosa das deusas egípcias, escapou da morte com a ajuda de sete escorpiões enviados por Serket, deusa das criaturas venenosas e representada pela figura de um escorpião.

Dessa vez, porém, o risco provocado pelas inundações agitou os aracnídeos. Embora a população local já esteja acostumada a lidar com escorpiões —dezenas de picadas são registradas anualmente—, as centenas de ocorrências surpreenderam a todos, assim como a intensidade das chuvas.

Segundo o governador de Assuã, Ashraf Attia, a tempestade foi a pior dos últimos 11 anos na cidade. Oficialmente, as autoridades contabilizaram 103 casas parcial ou totalmente destruídas, mas, segundo os moradores, o número real é muito maior. O jornal estatal Al Ahram noticiou que as autoridades convocaram médicos que estavam de férias para trabalhar no atendimento às vítimas, e os hospitais da região estão em alerta máximo. As aulas foram suspensas, houve vários relatos de quedas de energia e até o tráfego marítimo no rio Nilo foi interrompido temporariamente.

Ainda segundo a publicação, três pessoas morreram em decorrência das picadas dos escorpiões, mas a informação foi negada pelo Ministério da Saúde egípcio. De acordo com o governo local, os mortos eram três policiais eletrocutados por fios soltos na enchente.

Uma tempestade dessa dimensão é mais um exemplo do aumento da ocorrência de eventos extremos em decorrência das mudanças climáticas. A ciência aponta que o aquecimento global gera um acúmulo de energia na atmosfera que se dissipa por meio de eventos extremos, que, por sua vez, tendem a se tornar cada vez mais frequentes e mais intensos.

Meteorologistas e cientistas egípcios falaram publicamente sobre a relação entre os episódios do fim de semana e a mudança climática, que, no país, já prejudicou as colheitas de oliveiras e tâmaras, transformou vastas áreas de cultivo em deserto e tornou verões já escaldantes ainda mais quentes.

Nesta segunda-feira (15), muitos moradores de Assuã ainda não tinham onde dormir. Em uma rara demonstração pública de descontentamento no Egito, onde a maioria dos dissidentes é reprimida pelas forças de segurança, cerca de uma dúzia de manifestantes protestou em frente ao gabinete do governador devido à falta de recursos como água e eletricidade e ao déficit da assistência do Estado.

Mourad Abazid, 56, funcionário do governo da vila de Kobaniya, na margem oeste do Nilo, disse ao jornal The New York Times que as enchentes inundaram sua casa, forçando ele e sua família a se abrigarem numa mesquita. Ele agora estava dormindo na rua ao lado dos escombros de casa, enquanto a esposa e três filhos ficaram com vizinhos. "Graças a Deus, ninguém morreu; resgatamos as pessoas, mas nossas casas se foram. Não sabemos o que vamos fazer. Foi só uma hora de chuva, mas estragou tudo."

Em meio à pobreza generalizada que atinge Assuã e outras cidades do Alto Egito, há moradores locais que se arriscam como caçadores de escorpião para levantar algum dinheiro com a extração de veneno.

Um único grama da substância pode ser exportado pelo valor de até US$ 3.000 (R$ 16,5 mil), embora para chegar a essa quantia seja preciso extrair o veneno de até 3.000 escorpiões, segundo Mohamed Abdel-Rahman, professor de toxicologia da Universidade do Canal de Suez.

Em entrevista ao jornal americano, ele explicou que as toxinas, depois de isoladas em laboratório, podem auxiliar pesquisas científicas e até no tratamento de câncer, no qual podem ser utilizadas para realçar células tumorais no cérebro durante cirurgias, destacando-as para facilitar sua remoção.

Com New York Times

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.