EUA se tornam democracia 'em retrocesso' e Brasil tem declínio, destaca levantamento

Organização intergovernamental atribui pioras a contestações sem provas dos sistemas eleitorais

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Belo Horizonte

Pela primeira vez, os Estados Unidos foram considerados uma "democracia em retrocesso" pela International Idea, organização intergovernamental que publica, anualmente, relatórios sobre democracia e eleições ao redor do mundo. O levantamento publicado nesta segunda-feira (22) também destaca o Brasil com o maior declínio dos parâmetros analisados.

De acordo com o documento, a piora da democracia americana está relacionada à segunda metade da Presidência de Donald Trump. A organização ressalta que o país continua sendo "uma democracia de alto nível", mas pesaram contra os EUA questões envolvendo liberdade civil e controle governamental.

O relatório cita, por exemplo, os frequentes ataques de Trump ao sistema eleitoral americano, durante e após o pleito de novembro do ano passado, e "a redução das investigações do Congresso sobre as ações do presidente entre 2018 e 2020".

Apoiadores do então presidente dos EUA Donald Trump manifestam em frente ao Capitólio, em Washington, alegando fraudes nas eleições presidenciais
Apoiadores do então presidente dos EUA Donald Trump se manifestam em frente ao Capitólio, em Washington, alegando fraudes nas eleições presidenciais - Oliver Douliery - 14.nov.20/AFP

As ofensivas do ex-chefe de Estado americano serviram de motor para uma mobilização de seus apoiadores no dia 6 de janeiro, que culminou com a invasão da sede do Congresso, para interromper a sessão que certificou a vitória do democrata Joe Biden. O grupo acusava fraude nas eleições –o que nunca foi comprovado.

O ataque, que culminou em cinco mortes, é considerado um dos maiores atentados à democracia dos EUA. Na última quinta (17), Jacob Chansley, que ficou conhecido como "xamã do QAnon" depois de aparecer na invasão usando um chapéu de pele com chifres e com o rosto pintado de vermelho, branco e azul foi condenado a 3 anos e 5 meses de prisão.

Dois dias antes, Steve Bannon, aliado e ex-conselheiro de Donald Trump, entregou-se ao FBI sob acusação de obstruir as investigações sobre o ataque à sede do Legislativo americano. Ele não foi preso, mas teve seu passaporte confiscado.

"A visível deterioração da democracia nos Estados Unidos é demonstrada pela tendência crescente de questionar resultados eleitorais confiáveis, pelos esforços para suprimir a participação e pela polarização desenfreada, que é um dos pontos mais preocupantes para a democracia em escala mundial", disse o secretário-geral da Idea, Kevin Casas-Zamora, à agência de notícias AFP.

Também citando recentes questionamentos relativos ao sistema eleitoral, o relatório aponta o Brasil como a democracia que mais apresentou declínios no ano passado, entre as nações analisadas. Ao se referir ao presidente Jair Bolsonaro, a organização diz que ele "foi ainda mais longe, questionando o sistema de votação que existe há 25 anos e alegando que as eleições podem ser canceladas se [o sistema] não for alterado".

Além disso, são mencionadas declarações do mandatário contra magistrados do Tribunal Superior Eleitoral e ministros do Supremo Tribunal Federal —em uma manifestação de seus apoiadores, ele chegou a dizer que não obedeceria as decisões da mais alta corte do país.

O estudo ainda destaca que a gestão da pandemia de Covid-19 no Brasil foi "atormentada por escândalos de corrupção e protestos, enquanto o presidente Jair Bolsonaro minimizava a pandemia e passava mensagens contraditórias". A instituição lembra que, em resposta, "protestos em massa estouraram, exigindo a remoção do presidente".

Pesa ainda contra o Brasil o andamento de investigações por apropriação indevida em todos os 27 estados.

Com sede em Estocolmo, capital da Suécia, a International Idea acompanha cerca de 160 países e os classifica em três categorias: democracia (incluindo as "em retrocesso"), regimes híbridos e regimes autoritários.

Segundo a organização, mais de um quarto da população mundial vive em democracias em retrocesso, e cerca de 70% está em um regime híbrido ou autoritário. O movimento negativo é percebido desde 2016.

"O número de países que se movem de forma autoritária superou aqueles indo em uma direção democrática. A pandemia prolongou essa tendência negativa existente em um período de cinco anos, o mais longo desde o início da terceira onda de democratização, na década de 1970", frisou.

Além de Brasil e EUA, o grupo de democracias em retrocesso é formado por países como Índia, Filipinas, Polônia, Hungria e Eslovênia.

Ucrânia e Macedônia do Norte também faziam parte da lista, mas a organização avaliou que as duas nações apresentaram melhoras em seus quadros democráticos; já a Sérvia foi excluída porque não é considerada mais uma democracia.

De acordo com a organização, o Partido Progressista da Sérvia, hoje no poder, restringiu a sociedade civil e a mídia livre. O relatório ainda cita irregularidades nas eleições parlamentares de 2020, devido ao "uso indevido de recursos públicos e um campo de jogo desigual".

Ao todo, o levantamento cita 98 democracias, 20 regimes "híbridos" —incluindo Rússia, Marrocos e Turquia— e 47 regimes autoritários. Entre estes estão China, Arábia Saudita, Etiópia e Irã.

Com AFP

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