Descrição de chapéu China

O que rendeu o grande (e morno) encontro de Xi Jinping e Biden

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Igor Patrick
Xangai

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O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o líder chinês, Xi Jinping, finalmente se "encontraram" para conversar sobre os obstáculos na relação dos dois países. As aspas são justificadas pelo formato da reunião: como Xi não deixa a China desde o surto de Covid em Wuhan (2019/2020), o debate foi online.

Os dois estiveram juntos algumas vezes quando Biden era vice de Barack Obama. O contexto, porém, era outro no bate-papo desta semana: desde a campanha de 2020, o democrata é acusado de ser "fraco com a China", um defeito imperdoável para um número cada vez mais crescente de eleitores.

Talvez pela necessidade de "mostrar serviço", Biden e equipe logo jogaram na mesa alguns dos assuntos mais espinhosos na agenda bilateral.

  • O presidente citou "preocupações com as práticas da República Popular da China em Xinjiang, Tibete e Hong Kong, bem como direitos humanos de forma mais justa", diz o comunicado divulgado pelos EUA. O texto também destaca discordância com "injustas práticas comerciais e econômicas da China".
  • A fala mais grossa, porém, parece ter terminado aí. Biden reafirmou o compromisso com a "política de uma só China", deixou nas entrelinhas que não apoia a independência de Taiwan e expressou o desejo de que os dois países se engajem em uma competição pacífica.

Os dois pediram por mais colaborações na área de combate às mudanças climáticas e houve afagos:

  • Washington anunciou uma nova política de vistos de múltiplas entradas para jornalistas chineses, um entrave nas negociações dos dois países desde que duras regras foram impostas por Donald Trump a correspondentes da China.
  • Pequim indicou que pode relaxar as regras para que empresários americanos com vistos de negócios consigam viajar à China.

Enquanto a imprensa americana destacou de forma ácida a suposta "fraqueza" de Biden ao lidar com Pequim, jornalistas aqui na China repercutiram a cúpula com relativo otimismo. O encontro ocupou a maior parte do Xinwen Lianbo —o telejornal noturno mais assistido do país— e várias manchetes destacavam as falas de Biden sobre Taiwan.

Por que importa: seria irrealista esperar grandes mudanças de ambos os lados. Em grandes eventos da diplomacia chinesa, os temas mais polêmicos são discutidos bem antes do encontro público e a agenda comum é aprovada pelos dois lados com dias de antecedência. Se tivesse tentado parecer durão, Biden seria solenemente ignorado por Xi, como já aconteceu em outras ocasiões em que líderes estrangeiros saíram do script durante uma reunião com ele.

Foto mostra o presidente os Estados Unidos Joe Biden sentado em sua mesa. Ao fundos, às bandeiras de China e Japão e uma televisão com a imagem de Xi Jinping, com quem ele conversava virtualmente.
Joe Biden conversa com Xi Jinping em encontro virtual - Mandel Ngan/AFP

o que também importa

A morte de um cão despertou indignação na China. O animal foi sacrificado pelas autoridades sanitárias enquanto a dona era levada para quarentena em um hotel, em Jiangxi, província localizada no sudeste do país.

De acordo com a dona (identificada apenas como Fu), o condomínio em que ela mora foi bloqueado e todos os residentes colocados em quarentena após um pequeno surto de Covid. Imagens captadas pela câmera de segurança mostram funcionários do combate à Covid entrando no apartamento dela e sacrificando o bicho, agredido com barras de ferro.

  • Autoridades locais disseram que funcionários resolveram "mitigar inofensivamente" uma possível ameaça de Covid.
  • Internautas furiosos tomaram o Weibo (rede similar ao Twitter), com o tópico sobre o assunto atingindo quase 180 milhões de acessos até a última quarta (17).


Em tempo: não há evidências de que gatos e cães sejam capazes de desenvolver a Covid ou de transmitirem o vírus Sars-CoV-2. Em alguns países asiáticos, os animais estão sendo treinados para identificar quem está contaminado.

A China anunciou regras ainda mais duras para quem viajar a Pequim. Os visitantes precisam apresentar um teste PCR realizado em, no máximo, 48 horas antes da viagem. Voos provenientes de áreas consideradas de médio risco serão cancelados ou sujeitos a redução de capacidade. Os provenientes de áreas de alto risco não estão autorizados a decolar.

  • As medidas são parte de um arcabouço de estratégias do governo para controlar o mais recente surto da variante Delta no país, responsável pelo pico de 100 infecções domésticas diárias no final de outubro.

Pequim não escapou ao surto e ainda luta para zerar os casos a menos de 100 dias de sediar os Jogos Olímpicos de Inverno.

Os esforços parecem estar funcionando. Depois de semanas reportando dezenas de casos sintomáticos todos os dias, os números começaram a cair significativamente.

O Partido Comunista Chinês aprovou uma resolução em que chama a Revolução Cultural de "uma catástrofe" e culpa diretamente Mao Tsé-tung pela tragédia. O tema foi discutido na reunião da Plenária do Comitê Central do PC Chinês na semana passada, mas divulgado apenas agora.

Oficialmente nomeado "Principais realizações e experiência histórica do Partido Comunista dos últimos 100 anos", o texto atribui a Revolução Cultural a "uma avaliação errada do camarada Mao que trouxe o mais sério revés ao país desde 1949".

  • A Revolução Cultural foi um movimento de perseguição política lançado em 1966, que só foi encerrado quando Mao morreu, em 1976. Houve destruição de livros e monumentos históricos, prisão de intelectuais, milhões de cidadãos perseguidos, tortura e mortes violentas e por suicídio.

O documento também menciona o massacre da Praça da Paz Celestial em 1989, atribuindo o evento a uma "agitação política" promovida por forças internas e estrangeiras para desestabilizar o governo. Estimativas oficiais calculam que 200 civis morreram na repressão aos protestos estudantis daquele ano. Manifestantes dizem que o número pode ter chegado a 3.400.

fique de olho

Uma pesquisa mostrou que, para 63% dos cidadãos em mais de 34 países africanos, a influência econômica e política da China é positiva. O levantamento produzido pelo Afrobarometer liga o resultado à escalada de investimentos chineses na região.

  • O volume de capital da China na região saltou de US$ 11 bilhões em 2000 para US$ 192 bilhões em 2019.

Os resultados não são muito diferentes para os Estados Unidos: 60% dos entrevistados consideram a influência americana positiva, enquanto 33% dizem preferir o modelo de desenvolvimento americano ao chinês.

Por que importa: a África é a principal aposta chinesa de promoção do soft power, com financiamento de bolsas para estudantes e investimentos bilionários. O caminho, porém, será árduo. O Afrobarometer mostra que os americanos são os mais admirados em 23 dos 34 países onde a pesquisa coletou respostas, embora os chineses tenham assumido o favoritismo de cidadãos no Níger, Botswana, Mali, Burkina Faso e Benin.


para ir a fundo

  • Dias depois de chegar a Shanghai, fui informado que testes realizados no desembarque tinham identificado que um passageiro no meu voo tinha recebido o diagnóstico de Covid-19. No meu blog na Folha, vou detalhar como a situação foi conduzida por todos os envolvidos no combate da pandemia no meu entorno e que pistas o episódio traz sobre o futuro da política de Covid zero por aqui. (paywall poroso, em português)
  • A Observa China recebe neste sábado (20) o ministro-conselheiro para o comércio da embaixada da China, Qu Yuhui. Considerado o principal membro da equipe chinesa no trato com governos e parlamentares brasileiros e profundo conhecedor dos acordos entre os dois países, Qu vai falar sobre diplomacia chinesa e civilização ecológica. As inscrições são limitadas e podem ser feitas aqui. (gratuito, em português)
  • Já está disponível no serviço de streaming Disney+ o filme com o primeiro herói chinês da Marvel: Shang-Chi. Estrelada pelo sino-canadense Simu Liu, a produção faz um mix interessante do universo dos Vingadores e de várias referências às lendas tradicionais chinesas. Boa pedida para o fim de semana. (pago, vários idiomas disponíveis)
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