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Tradução em inglês na carteira de identidade incomoda 'guardiões da língua' na França

Academia Francesa pede ao governo que documento saia de circulação e diz que recorrerá aos tribunais caso seja preciso

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Uma atualização promovida na carteira de identidade na França causou furor na Academia Francesa. Composta por 40 membros, a instituição —uma das mais antigas do país— criticou o fato de o documento reformulado ser bilíngue, com traduções para o inglês em campos como nome e data de nascimento.

A presença do inglês fere a Constituição, segundo a qual a língua nacional é o francês, disse ao jornal Le Figaro a historiadora Helene Carrere d'Encausse, 92, eleita imortal em 1990 e secretária permanente da Academia Francesa desde 1999. Os membros da instituição pediram ao premiê Jean Castex que suspenda o documento e disseram que levarão a questão à Justiça caso nenhuma medida seja tomada.

Propaganda da nova carteira de identidade francesa na cidade de Douai, no norte do país
Propaganda da nova carteira de identidade francesa na cidade de Douai, no norte do país - Francois Lo Presti - 16.mar.21/AFP

A modernização da carteira de identidade entrou gradativamente em vigor em março do ano passado e passou a valer para todo o país em agosto. O último modelo vigente era de 1995. Podem obter a nova versão aqueles que fizerem o documento pela primeira vez ou, então, o renovarem.

Segundo o Ministério do Interior francês, as mudanças foram necessárias para mitigar crimes envolvendo o documento —fraudes corresponderam a 45 mil crimes registrados pela polícia em 2019 (1,19% do total).

O caráter bilíngue, explicou o ministério, deve-se ao fato de a carteira de identidade ser aceita não apenas como documento nacional, mas também como documento de viagem quando franceses vão a outro país-membro da União Europeia (UE). A tradução para o idioma facilitaria a compreensão nas fronteiras.

Reclamando que a voz da Academia Francesa não é mais ouvida no debate público, a instituição contratou advogados para escrever ao premiê. "Quem decidiu colocar o francês e o inglês em pé de igualdade neste documento?", questionou d'Encausse, que ocupa a cadeira 14 da academia, ao Figaro.

A posição ecoou para outras esferas, entre as quais a política —o país realiza eleições presidenciais em abril. Marine Le Pen, líder do partido de ultradireita Reunião Nacional, agradeceu, em uma rede social, a Academia Francesa por defender o francês diante do que chamou de invasão contínua do inglês.

"Enquanto isso, Emmanuel Macron [presidente do país] acredita que não existe uma cultura francesa", seguiu. "É hora de eleger um presidente que se orgulhe de falar falar francês e da cultura francesa."

Não é incomum que documentos de identidade europeus contenham traduções. Na Alemanha, há traduções para o inglês e para o francês. Já no Reino Unido, que deixou a União Europeia há dois anos, os passaportes oferecem traduções para o francês. A presença do inglês no novo documento francês já havia sido alvo de outras críticas, com políticos e especialistas alegando que, assim, o governo facilitaria a predominância do inglês, quando, na verdade, deveria proteger o patrimônio linguístico francês.

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