Descrição de chapéu The New York Times

Atos de caminhoneiros no Canadá têm cúpula organizada e movimento errático

Ex-policiais e ativistas conservadores são líderes autodenominados de massa antivacina com ideias variadas

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Sarah Maslin Nir Natalie Kitroeff
Ottawa | The New York Times

Desde que os grandes semirreboques entrincheirados no centro da capital do Canadá chegaram, há quase três semanas, eles se arranjaram numa quase ordem, estacionando em fileiras uniformemente espaçadas. Seus motoristas permaneceram aquecidos e são alimentados por voluntários e, embora tenham ideias pessoais variadas, parecem cuidadosamente no mesmo tom: "Liberdade!" é o refrão dos últimos 19 dias.

Não é por acaso: bem acima do aglomerado de caminhões na Colina do Parlamento em Ottawa, em quartos de hotel próximos da confusão, estão as salas de guerra por trás da operação. A partir delas, uma equipe de líderes autonomeados, alguns com histórico militar e em organizações de direita, orquestrou uma ocupação disciplinada e altamente coordenada.

Caminhões nas ruas de Ottawa, capital do Canadá, nesta quarta-feira (16)
Caminhões nas ruas de Ottawa, capital do Canadá, nesta quarta-feira (16) - Chris Helgren - 16.fev.22/Reuters

Eles passaram as semanas amontoados em salas de conferência transmitindo entrevistas coletivas nas redes sociais. É uma equipe que inclui ex-policiais, veteranos militares e ativistas conservadores, colaboração que ajudou a transformar uma manifestação contra a obrigatoriedade das vacinas em uma força que desestabilizou a cidade e enviou ondas de choque por todo o Canadá.

O principal bloqueio que paralisou o comércio e o tráfego de mercadorias durante quase uma semana na principal travessia de fronteira entre o Canadá e os Estados Unidos foi liberado nesta semana, mas a maioria dos manifestantes em Ottawa não se moveu.

As autoridades canadenses, que não têm o poder de dizer como a polícia deve atuar, ficaram cada vez mais frustradas com a ocupação e veem a coordenação não como uma manifestação bem cuidada, mas sim como uma ameaça perigosa.

"O que impulsiona esse movimento é um grupo muito pequeno e organizado, movido por uma ideologia para derrubar o governo", disse Marco Mendicino, ministro da Segurança Pública, nesta terça-feira (15). "Através de qualquer meio que queiram usar."

Os esforços dos manifestantes pareciam recompensados com a renúncia do chefe de polícia de Ottawa, que enfrentou críticas por sua reação morna às manifestações desde o início. Quando a notícia chegou, buzinas animadas ecoaram pela cidade.

Peter Sloly renunciou um dia depois que Trudeau deu o raro passo de declarar uma emergência pública nacional, que estendeu medidas de policiamento mais firmes a todo o país. A invocação da Lei de Emergências também visou os esquemas de arrecadação de fundos para os manifestantes, que foram considerados atividade criminosa, e contas bancárias pessoais e comerciais.

A nova ordem pública ameaça revelar um grupo que já tem dificuldade para projetar credibilidade. Seus fundamentos —uma miscelânea de pessoas mergulhadas em sistemas de crença diversos, teorias da conspiração e raiva mal contida— frequentemente aparecem através do verniz oficial.

Em uma entrevista coletiva no hotel Sheraton na segunda-feira (14), aberta a outros meios de comunicação que não exclusivamente conservadores, como antes, havia um ar de gravidade numa sala que ecoava com a tosse constante de dezenas de apoiadores sem máscaras.

"Alguns de vocês podem se opor às nossas queixas", disse Tamara Lich às equipes de TV. "No entanto, a sociedade democrática sempre terá divergências e dissidentes justos."

Mas quando um repórter perguntou sobre um grande volume de armas encontrado naquele dia em um protesto em Alberta, outros na sala se enfureceram, empurrando o repórter e pedindo sua expulsão aos gritos de "Como você se atreve?". Tom Marazzo, um porta-voz, posteriormente defendeu a ação.

A disciplina de mensagens vem da primeira face pública da iniciativa, Tamara Lich, segundo Jay Hill, líder interino do Partido Maverick, pequeno grupo de centro-direita com sede em Calgary criado para promover a separação de três províncias do resto do país. Lich tem laços profundos com o grupo.

Mesmo antes de o comboio se reunir, a comunicação era a preocupação dela. "Tivemos várias conversas sobre manter a mensagem, ter uma mensagem muito claramente definida que seja compreensível e simples", diz. "Tamara claramente entende isso."

Lich desempenhou um importante papel na organização de uma campanha no site GoFundMe que arrecadou US$ 7,8 milhões (R$ 40,3 milhões) para os protestos antes que o site de vaquinhas a fechasse, após receber "relatos policiais de violência e outras atividades ilegais".

Anteriormente, Lich trabalhou como instrutora pessoal de ginástica em Medicine Hat , cidade apelidada de "Porão do Inferno" pelo escritor Rudyard Kipling, por sua localização sobre um enorme campo de gás natural. Ela não respondeu a pedidos de entrevista.

B.J. Dichter, porta-voz oficial do comboio, disse que se juntou ao esforço depois que Lich procurou ajuda para gerenciar o aumento de doações na página do GoFundMe. Ele tem um histórico de divulgar visões anti-islâmicas e disse uma vez que o "islã político" está "apodrecendo nossa sociedade como a sífilis".

Ele negou a acusação de racismo alegando em entrevista que é judeu. "Tenho família em valas comuns na Europa. E aparentemente sou um supremacista branco."

Os organizadores comandaram grande parte da logística de sustentar a ocupação que chega à terceira semana, porém não está claro quanto poder eles têm sobre os manifestantes —que compartilham uma ampla gama de motivações e teorias— se e quando chegar a hora de negociar sua partida.

"Eles geralmente falam por todos, mas todos têm suas próprias ideias", diz Guy Meister, caminhoneiro acampado em frente ao Senado. Essa fratura ficou clara recentemente, quando se espalhou a notícia de que os organizadores estavam negociando com o prefeito de Ottawa para remover alguns caminhões.

"Eu acredito neles, mas sou eu mesmo", afirma Meister. "A única pessoa que vai decidir quando sairei sou eu."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves 

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