Putin recebe sanções por guerra na Ucrânia, mas pouco se sabe sobre tamanho de sua fortuna

Extensão dos bens do presidente russo permanece opaca, mas ele é vinculado a bilhões de dólares em propriedades de luxo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Mike McIntire Michael Forsythe
The New York Times

Quando, na sexta-feira (25), governos ocidentais anunciaram a intenção de congelar bens pertencentes a Vladimir Putin como punição pela invasão da Ucrânia, nada indicava que tivessem conhecimento de bens de grande valor que pudessem ser ligados ao presidente russo.

Na realidade, sabe-se pouco sobre o que Putin possui e onde podem estar os bens. Não obstante anos de especulações e rumores, a extensão de sua fortuna permanece opaca, embora bilhões de dólares tenham passado pelas contas de amigos próximos e imóveis de luxo tenham sido vinculados a familiares dele.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante evento no Centro Espacial Nacional em Moscou - Serguei Guneiev/Sputnik/AFP

Oficialmente, segundo suas declarações financeiras públicas, Putin recebe cerca de US$ 140 mil (R$ 722 mil) ao ano e é dono de um pequeno apartamento.

Mas isso não explicaria o chamado "Palácio de Putin", uma propriedade enorme à beira do mar Negro de valor estimado em mais de US$ 1 bilhão (R$ 5,16 bilhões), com histórico de propriedade altamente complexo que não inclui o presidente russo, mas já foi vinculado a seu governo de diversas maneiras.

As informações oficiais tampouco explicariam o "iate de Putin", embarcação de luxo de US$ 100 milhões (R$ 516 milhões) há tempos vinculado a ele em reportagens especulativas. (O iate, chamado Graceful, foi rastreado deixando a Alemanha em direção à Rússia poucas semanas antes da invasão da Ucrânia.)

Há também o apartamento de US$ 4,1 milhões (R$ 21 milhões) em Mônaco comprado por meio de uma empresa offshore por uma mulher que seria amante de Putin. E há a mansão cara no sul da França ligada à sua ex-esposa. O problema dos EUA e seus aliados é que nenhum desses bens pode ser ligado diretamente ao presidente russo.

Os governos ocidentais até agora concentraram sanções contra pessoas suspeitas de atuar como representantes de Putin, na esperança de que isso aumente a pressão sobre ele.

E a maioria das novas penalidades, como as adotadas após a anexação russa da Crimeia em 2014, continua a ser voltada contra oligarcas próximos a Putin. Estes incluem Kirill Shamalov, seu ex-genro e grande acionista numa empresa petroquímica russa, o magnata da construção Boris Rotenberg e o investidor Gennady Timchenko, considerado a sexta pessoa mais rica da Rússia.

As sanções vão impossibilitar as pessoas visadas de acessar bens ou realizar transações financeiras nos Estados Unidos, no Reino Unido e na União Europeia, onde as penalidades foram anunciadas. Elas vão essencialmente congelar dinheiro e bens que possam ser vinculados aos nomes da lista, colocando dinheiro, títulos de dívida e até mesmo a venda de imóveis fora de seu alcance.

Mas as elites russas viveram sob sanções ocidentais pela maior parte dos últimos dez anos e já há tempo escondem seus bens sob um labirinto complexo de donos corporativos, para evitarem ser identificadas. Muitas vezes as negociatas só vêm à tona publicamente quando ocorrem vazamentos de firmas de advocacia offshore ou de bancos que trabalham com clientes interessados em ocultar sua riqueza.

Paul Massaro, assessor sênior da agência americana Helsinki Commission, que vem aconselhando parlamentares sobre as sanções à Rússia, disse que nem sempre fica claro às autoridades americanas quais bens serão afetados. "Quer dizer que as sanções não vão passar muito de comunicados de imprensa enfeitados, já que, sem saber quais são esses bens, não temos como congelá-los", explicou.

Para ele, porém, mesmo que os EUA tenham apenas uma visão limitada da fortuna de Putin, vale a pena impor sanções "para congelar o que podemos, congelar o que conhecemos e comunicar às pessoas que essa gente não é bem-vinda em nosso sistema". Um diplomata europeu destacou o valor simbólico do esforço, descrevendo-o como "sinal politicamente importante".

Ao ter seu nome incluído na lista de "Cidadãos Estrangeiros de Designação Especial", Putin ingressa num subgrupo pequeno, mas notório, de chefes de Estado que inclui Nicolás Maduro, da Venezuela, Kim Jong-un, da Coreia do Norte, e Bashar Al-Assad, da Síria. O chanceler russo, Serguei Lavrov, também está sujeito às sanções. "Estamos unidos com nossos aliados e parceiros internacionais para assegurar que a Rússia pague um preço econômico e diplomático pesado por sua invasão da Ucrânia", disse a secretária americana do Tesouro, Janet Yellen, em comunicado na sexta-feira.

As estimativas sobre a fortuna de Putin variam muito. Uma das afirmações mais sensacionais veio de Bill Browder, financista nascido nos EUA que em 2005 foi proibido de entrar na Rússia após se desentender com oligarcas do país. Em 2017, no Congresso, disse acreditar que a fortuna pode passar de US$ 200 bi (R$ 1,03 tri), um montante extraordinário que teria feito dele na época o homem mais rico do mundo.

Anders Ashlund, professor adjunto na Universidade Georgetown e autor de "Russia’s Crony Capitalism", estimou a fortuna do presidente russo em cerca de US$ 125 bi (R$ 645 bi). Ele argumentou que boa parte dela pode estar escondida numa teia de paraísos fiscais, sob o controle de aliados, amigos e parentes.

Em algumas ocasiões raras, pessoas próximas do círculo interno de Putin falaram publicamente sobre sua fortuna. Em 2010, Serguei Kolesnikov, que se disse um associado de negócios de um aliado de Putin, escreveu uma carta aberta ao então presidente russo Dmitri Medvedev, dizendo que Putin estava construindo uma mansão enorme no litoral do mar Negro que seria conhecida como o Palácio de Putin.

Na carta, que enviou depois de deixar a Rússia, Kolesnikov disse que a mansão custara mais de US$ 1 bilhão (R$ 5,16 bilhões), dinheiro acumulado por meio de "corrupção, subornos e roubo".

O Kremlin insiste que Putin é um homem de gostos simples. Frequentemente distribui imagens dele acampando nas florestas da Sibéria e nega que ele possua algum palácio.

Vazamentos de informações financeiras também oferecem indícios interessantes sobre a proximidade de Putin com a riqueza, embora ele próprio não apareça nos dados. Os Panama Papers, um grande conjunto de arquivos de uma firma de advocacia offshore exposto em 2016, revelaram a riqueza secreta de muitas pessoas próximas de Putin, incluindo o violoncelista Sergei Roldugin, amigo de longa data do presidente russo, que, segundo documentos apresentados a um banco suíço, recebia mais de US$ 8 milhões (R$ 41 milhões) por ano (ele havia dito anteriormente ao New York Times: "Não tenho milhões").

No ano passado, um novo vazamento de arquivos de firmas especializadas em paraísos fiscais offshore, conhecido como Pandora Papers, mostrou que uma mulher que seria amante de Putin comprara o apartamento em Mônaco. Foi um entre vários bens que ela acumulou e que valiam conjuntamente estimados US$ 100 milhões (R$ 516 milhões).

Mas, segundo o pesquisador Nate Sibley, da Iniciativa de Cleptocracia do Instituto Hudson, em última análise Putin não precisa possuir uma fortuna imensa, isso porque ele é um autocrata "que controla tudo".

"Quando as pessoas dizem que ele possui este ou aquele tanto, o que isso significa?", perguntou. "Será que estão querendo dizer que ele vai vender seus bens, aposentar-se e ir viver em St. Tropez?"

Tradução de Clara Allain

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.