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Guerra na Ucrânia: Estratégia dos EUA envolve retórica, ajuda militar e sanções contra a Rússia

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São Paulo

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Um dia após a promessa da Rússia de reduzir "drasticamente" a atividade militar em Kiev e Tchernihiv, os ataques prosseguiram no território ucraniano nesta quarta (30), inclusive nos arredores dessas cidades.

As ocorrências elevam o ceticismo da Ucrânia e do Ocidente em relação à proximidade do fim do conflito. O governo de Volodimir Zelenski pede a interrupção dos ataques em troca da aceitação de pontos exigidos pela Rússia —como explicamos aqui, Kiev sinalizou estar disposta, em diferentes níveis, a não fazer parte da Otan e a discutir a situação de áreas separatistas.

"Não devemos nos enganar pelos anúncios da Rússia", declarou ainda na terça a Casa Branca, em um tom duro que tem sido dominante entre as autoridades dos Estados Unidos desde o início do conflito.

Além da tática retórica, a atuação dos EUA e do governo Joe Biden em relação à guerra tem sido pautada por:

  • Ajuda militar: só neste ano, Biden anunciou o envio de US$ 1 bilhão (cerca de R$ 5 bilhões) em recursos e armamentos para a Ucrânia;

  • Sanções econômicas: desde 22.fev, os EUA aplicaram 690 restrições e contra a Rússia, incluindo veto a importação de petróleo e gás, o fechamento do espaço aéreo para aeronaves russas e o bloqueio de empresas.

  • Ajuda humanitária: após pressão para facilitar a entrada de ucranianos no país, o governo se comprometeu a acolher até 100 mil refugiados, além de oferecer ajuda financeira a países europeus.

O envio de armamentos do Ocidente é considerado preponderante para a resistência ucraniana e leva Moscou a limitar os objetivos da sua ação militar.

Mas esse reforço na defesa também tem uma relevância econômica importante: o aquecimento do mercado armamentista mundial, que pode favorecer aos EUA:

  • Os EUA são os maiores vendedores de armas do mundo, com 39% do mercado entre 2017 a 2021. A Rússia está em segundo lugar, com 19%;

  • Biden pediu ao Congresso para 2023 o maior orçamento militar em tempos de paz de sua história: US$ 813 bilhões (R$ 3,9 trilhões), 4,5% a mais do que previsto neste ano.

"Boa parte, se não a maior, do que os EUA destinam à Ucrânia tem sido no formato de ajuda militar. E há grupos de interesses muito influentes vinculados a esse setor que estão muito satisfeitos com a situação", afirma Laerte Apolinário Júnior, professor de relações internacionais da PUC-SP. Ele analisa a atuação dos EUA no conflito:

Os EUA e a Otan poderiam fazer mais, como tem cobrado Zelenski? A retórica de Zelenski é perigosa, porque dá a entender que os EUA poderiam intervir militarmente no conflito —e qualquer intervenção de um membro da Otan levaria a um confronto direto com a Rússia. As consequências seriam imprevisíveis.

As sanções econômicas são um meio-termo entre a ação diplomática e a ação militar. São um instrumento útil quando a ação militar é muito custosa e está fora de cogitação, como é o caso.

Por isso temos visto com uma certa frequência o anúncio de novas sanções dos EUA contra a Rússia. O fatiamento das sanções faz parte da estratégia. Se as medidas fossem anunciadas de uma vez, não teria mais como escalar, e um próximo passo seria a ação militar.

Qual é o peso das medidas econômicas em relação às já aplicadas pelos EUA contra outros países? A Rússia se tornou o país com o maior número de sanções aplicadas na história, superando países como Cuba, Irã, Venezuela e Coreia do Norte. Embora esse número seja bastante expressivo quantitativamente, a grande maioria dessas sanções tem sido aplicada contra indivíduos e evita setores mais expressivos da economia russa, como o energético.

A severidade das sanções varia de acordo com os interesses do país que as aplica. No caso dos EUA, eles não dependem das importações de recursos energéticos da Rússia. Não são economias interdependentes, por isso os EUA podem ir além nas suas sanções por serem menos vulneráveis que os países europeus em relação à Rússia.

Como o sr. avalia a atuação dos EUA no conflito? Biden tem buscado escalar a retórica em relação ao conflito por questões domésticas. Ele enfrenta uma baixa popularidade, e os EUA vão passar por eleições legislativas neste ano. Então ele precisa passar uma imagem forte de líder do mundo ocidental contra a Rússia.

Sobre a ajuda militar, o país interesses muito relevantes na Ucrânia —tanto em termos econômicos (em função da importância da Ucrânia para o mercado europeu, como rota de passagem do gás russo e exportador de commodities) quanto pela sua importância como um mercado para fornecimento de armamentos.

Não se perca

Para mostrar a escalada discursiva do presidente Joe Biden contra a Rússia —sobretudo contra Vladimir Putin—, relembramos algumas de suas declarações desde o início da invasão. Em resposta, o Kremlin já clasificou as falas de "alarmantes" e de "retórica inaceitável".

  • "Putin é o agressor. Putin escolheu essa guerra e agora ele e seu país suportarão as consequências" - em 24.fev, ao anunciar sanções no dia em que a Rússia invadiu a Ucrânia
  • "Ele é um criminoso de guerra" - em 16.mar, em declaração a jornalistas
  • "[Putin] é um ditador assassino, um puro bandido que está travando uma guerra imoral contra o povo da Ucrânia" - em 17.mar, ao comentar a posição do Reino Unido e da Irlanda contra o conflito, em um evento pelo dia de são Patrício
  • "Pelo amor de Deus, este homem não pode permanecer no poder" - em 26.mar, durante visita à Polônia. Ao ser repreendido pelo Kremlin, disse que suas declarações são "pessoais" e não políticas. "Não vou pedir desculpas", disse o presidente dos EUA

O que aconteceu nesta quarta (30)

  • Rússia recebeu lista de demandas da Ucrânia, mas diz não ver avanço;

  • Bachelet, da ONU, disse que ataques a civis e a hospitais podem configurar crimes de guerra da Rússia;

  • Ucrânia disse ter encontrado foguete não detonado em escola infantil de Tchernihiv;

  • Após reunião, Rússia e China falaram em "nova era" de relações diplomáticas.

Imagem do dia

Imagem de uma sala de aula destruída, com cadeiras e mesas quebradas e espalhadas. No chão, um globo escolar aparece entre os destroços
Destroços de escola atingida em ataque em Kukhari, na região de Kiev, um dia após a Rússia ter prometido reduzir ação militar na área - Serhii Nuzhnenko/Reuters

O que ver e ouvir para se manter informado

O ator Alexandre Borges fez para a TV Folha a leitura de uma peça ucraniana que retrata a guerra civil no início do século 20. E veja o relato do governador de Tchernihiv, Viatcheslav Tchaus, sobre o ataque da Rússia.

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