Descrição de chapéu Guerra na Ucrânia Rússia

Hospitais próximos à capital da Ucrânia se preparam para agravamento da guerra

Sirenes que avisam sobre ataques ganham força em meio a relatos de outras cidades; Exército busca conter avanço de coluna russa

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Kiev

A menos de 5 quilômetros do hospital de Brovari, o Exército ucraniano luta para impedir que a maior coluna militar russa dentro da Ucrânia consiga entrar na cidade e, dali, seguir os 25 quilômetros em linha praticamente reta até o centro da capital, Kiev.

Os civis que moram em vilas e pequenos municípios da região e que foram deixados para trás por serem muito velhos, doentes ou pobres para escapar por conta própria estão agora sendo retirados. O entorno de Brovari não é atendido por serviços ferroviários, e muitas das vias vicinais estão sob comando russo ou dentro da faixa de alcance da artilharia do Exército de Moscou.

Os combates que continuam ao longo da estrada principal, que liga Kiev à Belarus, têm afetado civis como Ivina, 76, que sobreviveu a um bombardeio que atingiu sua casa na madrugada do dia 17.

O ortopedista Serguei Omelchenko em abrigo no porão do hospital de Brovari, próximo a Kiev - André Liohn/Folhapress

"Minha cama ficou toda coberta de vidro —que cortou meu corpo, meus braços, minhas costas. Uma parte do teto caiu sobre meu rosto, eu não entendia o que estava acontecendo quando acordei sentindo muita dor", conta. "Então me lembrei: estamos em guerra."

Sua filha, Izabella, que a acompanhou até o hospital usando uma fita adesiva amarela enrolada no braço direito, em sinal de lealdade ao governo ucraniano, diz que parte de sua família é russa e não entende o propósito da guerra. Ela mostra em seu telefone as fotos dos efeitos da bomba que poderia ter tirado a vida da mãe.

Enquanto negociações por um cessar-fogo correm em paralelo a novos ataques, uma forma dos russos de manter a pressão, no cotidiano da Ucrânia o poder de convencimento das sirenes que alertam sobre possíveis ataques aéreos parece ter ganhado força.

A informação de que um teatro que servia de abrigo para centenas de pessoas —inclusive crianças— foi atingido por um ataque aéreo em Mariupol renovou a preocupação da equipe do hospital de Brovari. O lugar recebe principalmente soldados e milicianos feridos na linha de frente, e os médicos temem que a Rússia possa atacar o prédio a qualquer momento.

A cada alarme das sirenes, eles fogem para o abrigo antibombas improvisado nos porões, onde estão as tubulações de água, gás e esgoto. A temperatura, como a altura do teto, é baixa, forçando as pessoas a caminharem curvadas por corredores estreitos e por vezes mal cheirosos.

Apenas um elevador de serviço chega a uma parte isolada do porão, que não pode ser usada como abrigo. Com isso, os médicos ficam impossibilitados de transferir pacientes a cada vez que o alarme dispara.

A solução encontrada é levá-los para os corredores, o mais distante possível das janelas —e de preferência o mais próximo possível das escadas que levam ao porão.

Para que ninguém seja deixado absolutamente sozinho em caso de um ataque aéreo, os médicos decidiram que as equipes que cuidam dos casos mais graves devem ficar com seus pacientes independentemente do que acontecer. Elas só são autorizadas a deixar seu posto depois de uma ordem expressa da chefia.

Até aqui, a direção do hospital tem conseguido transferir quase que imediatamente todos os pacientes graves para hospitais de Kiev.

"Ontem [quarta, 16], recebemos muitos que precisaram passar por cirurgia. Pessoas feridas durante bombardeios, com estilhaços, algumas com amputações. Assim que foram estabilizadas, elas foram levadas a um hospital militar de Kiev", disse o ortopedista Serguei Omelchenko, que trabalha numa clínica privada da capital, mas que agora ajuda a equipe de Brovari.

O risco de o hospital se tornar um alvo é tido como real sob o contexto dos acontecimentos mais recentes em Kiev. Nos últimos dias, três dos piores ataques na capital foram a prédios residenciais —entre milhares de edifícios esvaziados, os atingidos estavam cheios de civis que por algum motivo não haviam deixado a cidade.

Na região oeste de Kiev, próximo ao front onde ucranianos e russos combatem em Butcha ​e Irpin, na terça-feira (15) o hospital de base da região 7 —que recebia civis feridos retirados dessas duas cidades— foi atingido por um morteiro que destruiu a entrada de emergência.

A entrada da administração, inapropriada para o trânsito de macas, tornou-se a porta em que equipes de socorro em ambulâncias deixam seus pacientes. Com praticamente todos os civis tendo deixado a região, o hospital agora também recebe muitos soldados feridos.

De frente ao pequeno balcão onde duas secretárias trabalham, muitos outros soldados chegam nervosos, ofegantes e armados. Mencionam na recepção o sobrenome da pessoa que querem visitar. Apressados em entrar o quanto antes, são parados e orientados por seguranças a deixar suas armas com um policial que guarda a entrada e verifica os documentos de todos os que chegam.

Visivelmente alterado, chorando e chamando as tropas inimigas de baratas, um ucraniano deixou o hospital dizendo que mataria todos os russos se pudesse. "Volte para Irpin e lute como um homem", disse uma das secretárias, irritada com o comportamento do soldado que saiu esbarrando nos batentes da porta.

Ao fundo, as explosões incessantes são um alerta constante de que a situação nos hospitais ao redor de Kiev pode rapidamente se deteriorar.

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