Descrição de chapéu Guerra na Ucrânia Rússia

Nova York, maior polo da comunidade ucraniana nos EUA, vira palco de protestos

No East Village, imigrantes e descendentes fazem manifestações, enchem restaurantes típicos e coletam doações

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Lúcia Guimarães
Nova York

​"Somos todos ucranianos!", diz uma mulher que passava na calçada da Segunda Avenida ao ver, na porta de um prédio, cartazes que pediam apoio à Ucrânia e denunciavam a invasão liderada por Vladimir Putin.

Com cerca de 150 mil imigrantes ou descendentes, Nova York é a cidade com a maior comunidade ucraniana dos Estados Unidos, estimada hoje em 1 milhão.

A especulação imobiliária fez encolher o número de lojas e restaurantes frequentados por imigrantes e descendentes na Pequena Ucrânia, no East Village, ao sul da ilha de Manhattan. Mas assim que as bombas russas começaram a cair, a área virou cenário de protestos e manifestações de solidariedade.

Centenas de pessoas protestam contra a guerra na Ucrânia em Nova York
Em Nova York, centenas de pessoas protestam contra a guerra na Ucrânia - Spencer Platt - 5.mar.22/Getty Images/AFP

A âncora da comunidade no Village é a igreja de St. George, um templo em estilo bizantino anexo à escola católica de mesmo nome. A igreja já recebeu padres brasileiros da numerosa comunidade ucraniana no sul do Brasil, e o mais recente é Cyril Iszezuck, paranaense de Roncador, que consolava membros da paróquia em voz baixa, enquanto uma mulher lia orações em ucraniano ao microfone.

O padre diz que mal consegue explicar a experiência dos últimos dias. "Todos nós estamos sentindo uma grande dor no coração, mesmo nós, que não somos ucranianos de nascença, temos amor à pátria, somos binacionais."

O padre Cyril não comenta a viagem de Jair Bolsonaro a Moscou ou as declarações de apoio a Putin, mas afirma acreditar que o presidente tem demonstrado determinação de ajudar a Ucrânia.

Aos fins de semana, famílias que vão à missa costumam encher dois restaurantes de cozinha ucraniana próximos à igreja. O fim de tarde quieto num deles foi interrompido por ruidosos jovens, todos funcionários de uma empresa que faz negócios com comerciantes ucranianos.

Jennifer Lee, na cabeceira de uma longa mesa, diz não haver ucranianos no grupo, que nunca esteve naquele local antes. "Escolhemos o restaurante para demonstrar solidariedade aos nossos parceiros", disse ela, enquanto os colegas pediam doses de vodca ucraniana feita com raiz-forte e estudavam o menu com pratos típicos como varenike, um bolinho de massa, e borsch, uma sopa de beterraba.

Mas a principal atração da Pequena Ucrânia continua a ser o venerado Veselka, na Segunda Avenida com a rua 9, inaugurado nos anos 1950. A fila na calçada é longa. Enquanto esperam, estranhos conversam —não sobre o menu, mas sobre a guerra.

O local é um lendário ponto de encontro de boêmios e seu menu é tão cobiçado que, numa cena da última temporada da série "Billions", um personagem promete mandar buscar petiscos de massas no Veselka para seus corretores virarem a noite trabalhando.

O restaurante é operado pela mesma família há três gerações. O atual proprietário, Jason Bichard, é cidadão ucraniano, assim como muitos dos empregados, que usam o local para coordenar doações para famílias afetadas, dentro e fora da Ucrânia.

Perto dali, o açougue ucraniano está próximo do horário de fechar, mas o gerente deixa a reportagem entrar. Ele mal consegue conter a indignação com a invasão russa, mas não quer dar seu nome ou identificar outros empregados, cujas famílias estão na linha de fogo das tropas russas. Pede apenas que a imprensa conte a verdade sobre a invasão.

Do outro lado do rio Hudson, que separa os estados de Nova York e de Nova Jersey, o jornalista Andrew Ninka atende a Folha por telefone, três dias depois de conseguir escapar da Ucrânia, pela Polônia.

Ele é o editor-chefe de duas das mais antigas publicações ucranianas nos EUA, o Svoboda, fundado em 1893, e o semanário Ukrainian Weekly, publicado desde 1933. Nova Jersey tem a segunda maior população de origem ucraniana desta região, calculada em mais de 70 mil.

Ninka nasceu nos Estados Unidos, mas morou na Ucrânia, onde cobriu a Revolução Laranja em 2005. Ele diz que sua pequena Redação está tentando identificar e listar organizações confiáveis para fazer com que a ajuda financeira e humanitária chegue, de fato, a quem precisa. A angústia de Ninka é visível quando explica que foi convencido pelos parentes a sair logo que os bombardeios começaram.

"Levaram-me de Lviv até a fronteira. Passei 24 horas em pé e vi cenas de caos que não vou esquecer."

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