Descrição de chapéu Rússia

Refugiados de Mariupol dizem que cidade na Ucrânia sob cerco virou o inferno

Civis convivem com bombardeios e relatam corpos nas ruas e falta de água e eletricidade

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Liz Cookman
Zaporíjia (Ucrânia) | AFP

Famílias que conseguiram sair de Mariupol, no sul da Ucrânia, descrevem como "inferno" o que deixaram para trás ao fugir do cerco russo à cidade. O local é estratégico para o Kremlin porque é o último grande centro de resistência ucraniana no corredor que conecta a Crimeia por terra à Rússia.

Moradores relatam que, enquanto as tropas de Moscou bombardeavam a cidade, corpos acumulavam-se nas ruas e faltava comida e eletricidade. "Dispararam muitos foguetes", diz Tamara Kavunenko, 58. Ela está entre os 4.300 moradores que fugiram nesta semana rumo a Zaporíjia, no centro da Ucrânia.

Bloco residencial destruído por bombardeio em Mariupol, no sul da Ucrânia
Bloco residencial destruído por bombardeio em Mariupol, no sul da Ucrânia - Alexander Ermochenko - 17.mar.22/Reuters

"Quando a neve caiu, derretemos para conseguir água. Quando não, fervemos água do rio para beber", conta. "Nas ruas estão os corpos de muitos civis mortos. Não é mais Mariupol. É o inferno."

Mais de 2.000 pessoas morreram até agora na cidade, segundo autoridades ucranianas —um número que não pôde ser verificado de forma independente. Na quarta (16), Kiev acusou a Rússia de bombardear um teatro no qual estariam centenas de civis desabrigados —que teriam escrito a palavra "crianças" na calçada do prédio, segundo imagens de satélite captadas por uma empresa americana em 14 de março.

As autoridades do país afirmam que ao menos 130 civis já começaram a ser resgatados do local, mas não foram divulgados outros números. Cerca de 6.500 veículos saíram da cidade nos últimos dois dias, disse no aplicativo Telegram Vadim Boichenko, prefeito de Mariupol, na madrugada de quinta-feira (17).

Em um circo da era soviética em Zaporíjia, um grupo de voluntários da Cruz Vermelha espera pelos resgatados, com sapatos e mantas infantis cobrindo o chão. A organização afirmou que deixou Mariupol devido ao agravamento da crise humanitária na cidade.

Dima, com as mãos sujas, conta que não toma banho há duas semanas. Na terceira tentativa, conseguiu chegar a Zaporíjia com a mulher e dois filhos. Para alimentar as crianças e seus avós em Mariupol, diz que teve que saquear lojas em busca de comida. "Vivíamos debaixo da terra e, se fazia -4°C, era uma temperatura boa", afirma, levantando a perna para mostrar as três calças para tentar se aquecer. "Às vezes os corpos ficavam na rua por três dias. O cheiro está no ar, e você não quer que seus filhos o sintam."

Daria, que também fugiu de Mariupol, diz que durante dez dias morou no porão do prédio com sua bebê. "Ficava pior a cada dia", afirma, com a filha nos braços. "Estávamos sem luz, sem água, sem gás, sem meios de existir. Era impossível comprar coisas."

Marina, uma voluntária da Cruz Vermelha de Zaporíjia, relata que as pessoas que chegavam de Mariupol estavam em péssimo estado. "Estavam cansados, doentes, chorando."

A única forma de fugir da cidade era com um carro particular. Muitos dos que conseguiram fugir contam que não podiam sair dos refúgios em razão dos bombardeios e que encontraram um jeito de viajar por sorte, porque tampouco havia sinal de telefone ou de internet.

Fila de carros, com panos brancos, para deixar a cidade de Mariupol, na Ucrânia
Fila de carros, com panos brancos, para deixar a cidade de Mariupol, na Ucrânia - Alexander Ermochenko - 17.mar.22/Reuters

"Vimos que havia gente com faixas brancas nos carros, saindo", afirma uma mulher que se identificou como Daria. Ela diz que perguntou a uma vizinha se podia se juntar a ela para fugir.

Para alguns, o trajeto a Zaporíjia, que normalmente leva três ou quatro horas, durou mais de um dia.

Um pai de dois filhos relata que conseguiu captar um sinal após ligar o rádio, conseguindo, assim, informação sobre o corredor humanitário. Abraçado ao filho, Dmitri afirma que eles passaram "nove ou dez dias" escondidos no teatro de Mariupol —o mesmo bombardeado, segundo Kiev, por forças russas.

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