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Sabatina de 1ª negra indicada à Suprema Corte dos EUA termina com pressão e lágrimas

Ketanji Brown Jackson respondeu a perguntas por 23 horas em 4 dias; nomeação de Biden precisa ser aprovada pelo Senado

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Washington

A sabatina de Ketanji Brown Jackson, primeira mulher negra a ser indicada à Suprema Corte dos EUA, chegou ao fim nesta quinta-feira (24), depois de quatro dias. O processo foi marcado por perguntas duras de republicanos e por elogios de democratas que levaram a magistrada às lágrimas.

A indicação de Jackson, 51, foi analisada pela Comissão de Justiça do Senado. Ao longo dos quatro dias, ela ficou cerca de 23 horas respondendo a questões —fora o tempo dedicado a falas dos parlamentares e de testemunhas. Como comparação, a sabatina de André Mendonça, nomeado para o Supremo Tribunal Federal do Brasil em 2021, durou oito horas.

A juíza Ketanji Brown Jackson se emociona durante fala do senador democrata Cory Booker - Elizabeth Frantz - 23.mar.22/Reuters

Jackson foi indicada pelo presidente Joe Biden em fevereiro, e a nomeação depende da confirmação do Senado. A votação na comissão deve ser realizada no dia 4 de abril e, no Plenário, alguns dias depois, antes do recesso de Páscoa.

A expectativa é de aprovação, já que os democratas possuem 50 dos 100 votos no Senado, mais o poder de desempate. Chuck Schumer, líder do partido no Senado, disse ver a aprovação "a caminho".

A chance de algum apoio republicano à primeira mulher negra na mais alta instância da Justiça, porém, vem sendo reduzida. O líder da oposição Mitch McConnell antecipou que votará contra a nomeação, pois considerou insuficientes as respostas de Jackson.

Na segunda (21), senadores fizeram discursos de abertura. Jackson também falou e prometeu agir de modo independente e em busca da igualdade perante a lei. Na terça (22) e na quarta (23), ela respondeu a perguntas sobre sua trajetória e suas posições em vários temas

Em diversas ocasiões, republicanos tentaram caracterizá-la como uma ativista de esquerda condescendente com o crime. Jackson é juíza federal há mais de dez anos e já deu penas menores do que o recomendado para acusados de envolvimento com pornografia infantil. Ted Cruz chegou a levar um cartaz que exibiu sentenças dadas por ela ao lado das indicações federais —que são opcionais.

Jackson respondeu que a sentença deve levar em conta vários fatores. "Os juízes não estão em um jogo de números. Em cada caso, cumpri meu dever de responsabilizar os réus à luz das evidências e das informações apresentadas a mim", disse.

Houve também momentos de grosseria, com senadores interrompendo respostas da magistrada para tentar reafirmar seus pontos. O presidente da Comissão, o democrata Richard Durbin, interveio algumas vezes. "Eu diria para a juíza que não há razão para responder. Ele vai interrompê-la de qualquer jeito", ironizou, em meio à insistência de Cruz.

Sobre as acusações de se portar como ativista, Jackson disse ter claro que o papel do juiz é aplicar as leis, não tentar modificá-las ou criar políticas públicas. "Não creio que nenhuma criança deve ser convencida a sentir que é racista, mas também não deve sentir que não é valorizada", respondeu, ao ser questionada sobre como via o ensino de questões raciais e de gênero nas escolas.

Em outro momento, a senadora republicana Marsha Blackburn pediu que a juíza "desse uma definição da palavra 'mulher'". "Eu não sou bióloga", respondeu Jackson. "O fato de você não dar uma resposta direta ressalta o perigo da educação progressista", retrucou a parlamentar.

Sobre o aborto, a juíza disse considerar que as regras atuais, que liberam a prática, são "lei assentada". Afirmou ainda que pretende se abster de votar no processo em análise na Suprema Corte sobre ações afirmativas em universidades, por ter laços com Harvard, citada na ação.

Jackson buscou demonstrar que sempre atuou de modo independente de suas crenças pessoais. "Minha fé é muito importante, mas, como você sabe, não há teste religioso na Constituição."

Os democratas buscaram ressaltar que a nomeação é histórica em 233 anos de história do tribunal.

Na tarde de quarta (23), a juíza chorou ao ouvir o discurso do democrata Cory Booker. Ele disse que ser uma mulher negra nos EUA significa encarar obstáculos que nenhum de seus críticos teve que enfrentar. "Você é muito mais do que sua raça e gênero. Você conquistou esse posto. Você tem valor. É uma grande americana", elogiou.

Nesta quinta (24), o Senado ouviu testemunhas que falaram sobre a carreira da nomeada, selecionadas pela American Bar Association (ordem dos advogados dos EUA) e por parlamentares.

Representantes da ABA elogiaram Jackson e a definiram como brilhante, impecável e bem qualificada para a Suprema Corte. Steve Marshall, advogado-geral do Alabama, testemunhou contra a nomeação, por considerar que Jackson deve tentar mudar o sistema judicial do país —ele não apresentou provas disso.

Se aprovada pelo Senado, Jackson tomará posse em outubro, quando começa o próximo ano do Judiciário. Atualmente, o colegiado é formado por seis magistrados de perfil conservador e três de perfil progressista —algo que não vai mudar com a nova integrante, que entrará na vaga de Stephen Breyer, que se aposentou.


QUEM É QUEM NA SUPREMA CORTE DOS EUA HOJE

Ala conservadora

Jonh Roberts, 67
Indicado por George W. Bush em 2005. Ainda que seja considerado conservador, o atual presidente da Corte às vezes atua de forma moderada

Clarence Thomas, 73
Indicado por George Bush em 1991

Samuel Alito, 71
Indicado por George W. Bush em 2006

Neil Gorsuch, 54
Indicado por Donald Trump em 2017

Brett Kavanaugh, 57
Indicado por Trump em 2018

Amy Coney Barrett, 50
Indicada por Trump em 2020

Ala progressista

Stephen Breyer, 83 (se aposenta neste ano)
Indicado por Bill Clinton em 1994

Sonia Sotomayor, 67
Indicada por Barack Obama em 2009

Elena Kagan, 61
Indicada por Obama em 2010​

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