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Ketanji Jackson transforma Suprema Corte dos EUA mesmo sem mudar jogo de forças

Primeira juíza negra no tribunal soma representatividade e experiência, com potencial impacto a longo prazo

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Juliana Cesario Alvim Gomes

Professora adjunta de direitos humanos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Ketanji Brown Jackson foi confirmada nesta quinta-feira (7) pelo Senado como ministra da Suprema Corte dos Estados Unidos. A nomeação não muda imediatamente o jogo de forças no tribunal, mas sua presença na corte promove transformações cruciais.

Nos EUA, os membros da Suprema Corte, em regra, têm se dividido e alinhado suas opiniões ao longo do tempo de acordo com as linhas partidárias de quem os indicou. Desde que Donald Trump nomeou a ultraconservadora Amy Coney Barrett para o lugar da progressista Ruth Ginsburg, o placar se cristalizou em 6 a 3 para os republicanos.

Jackson substituirá Stephen Breyer —que pediu sua aposentadoria—, nomeado pelo democrata Bill Clinton, e por isso não será capaz de modificar o quadro. Isso não quer dizer, contudo, que sua nomeação não possa levar a mudanças significativas dentro e fora do tribunal.

A magistrada Ketanji Brown Jackson assiste com o presidente Joe Biden à sessão do Senado que aprovou sua indicação à Suprema Corte dos EUA - Mandel Ngan - 7.abr.22/AFP

Primeiro, nenhuma mulher negra jamais foi ministra da Suprema Corte dos EUA. Em sua longa história (que teve início ainda durante a escravidão), o tribunal teve 120 integrantes, apenas 2 negros e 4 mulheres —uma delas latina, Sonia Sotomayor, a quem Jackon se soma. O impacto desse fato em termos simbólicos e de representatividade é visível nos dados segundo os quais, entre adultos negros americanos, 72% consideram historicamente muito ou extremamente importante essa nomeação (Pew Research Center).

Segundo, além de possuir (e superar) as credenciais que validam as trajetórias de seus colegas, Jackson traz uma experiência profissional única. Dentre as divisas que compartilha com seus pares, ela se formou em uma universidade de elite (assim como ela, quatro dos atuais membros foram de Harvard; outros quatro, de Yale), foi assessora da Suprema Corte (auxiliou, no passado, o próprio Breyer) e, posteriormente, magistrada em primeira e segunda instâncias.

Porém, será a primeira defensora pública da história da corte e a segunda integrante a ter experiência na defesa criminal de vulneráveis. Seu antecessor, Thurgood Marshall, ministro entre 1967 e 1991, foi o primeiro juiz negro da Suprema Corte e, antes disso, fundou e atuou no NAACP Legal Defense and Educational Fund, possivelmente a organização mais importante de litígio em questões raciais da história dos EUA. Jackson, por sua vez, advogou na defesa de clientes indigentes em casos criminais e de detidos em Guantánamo.

Mesmo sem alterar o percentual de nomeados conservadores (pró-republicanos) e progressistas (pró-democratas) na corte, a perspectiva e a experiência singulares que a presença da magistrada agrega podem influenciar dinâmicas internas e o processo decisório do tribunal —seja trazendo e viabilizando novos argumentos, seja persuadindo seus colegas.

De acordo com algumas estimativas (como a da Database of Ideology, Money in Politics, and Elections, ligada à Universidade Stanford), ela passaria a ser a integrante mais liberal da corte (substituindo Sotomayor), o que poderia fazer com que todo o bloco progressista se inclinasse mais nessa direção.

Por outro lado, em um cenário político extremamente polarizado, sua nomeação ocorreu com três votos republicanos, o que para alguns sugere uma boa capacidade de interlocução com o lado mais conservador.

Para além dos efeitos imediatos, seus 51 anos em uma Suprema Corte em que não há mandato limitado nem aposentadoria compulsória prometem mais algumas décadas de atuação e potenciais impactos de sua nomeação em contextos de novas configurações políticas e futuras composições da própria corte.


QUEM É QUEM NA SUPREMA CORTE DOS EUA HOJE

Ala conservadora

Jonh Roberts, 67
Indicado por George W. Bush em 2005. Ainda que seja considerado conservador, o atual presidente da Corte às vezes atua de forma moderada

Clarence Thomas, 73
Indicado por George Bush em 1991

Samuel Alito, 72
Indicado por George W. Bush em 2006

Neil Gorsuch, 54
Indicado por Donald Trump em 2017

Brett Kavanaugh, 57
Indicado por Trump em 2018

Amy Coney Barrett, 50
Indicada por Trump em 2020

Ala progressista

Stephen Breyer, 83 (se aposenta e dará lugar a Ketanji Brown Jackson, indicada por Joe Biden)
Indicado por Bill Clinton em 1994

Sonia Sotomayor, 67
Indicada por Barack Obama em 2009

Elena Kagan, 61
Indicada por Obama em 2010​

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