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Rodrigo Zeidan

Uso de drones e robôs para controlar lockdown é caminho natural da tecnológica Xangai

Crescente descontentamento da população por confinamento encara equipamentos sofisticados para manter a ordem

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Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

Xangai

"Todos que respeitam as regras tornam a comunidade um lugar melhor para se viver."

Essa foi a mensagem no celular que eu e todas as pessoas em um raio de centenas de metros recebemos depois que um guarda me viu atravessando fora da faixa de pedestre. Conversando com amigos, descobri que os guardas de trânsito têm um dispositivo que dispara mensagens automáticas para a torre de celular mais próxima, de forma a lembrar à população que seguir as regras é criar uma "civilização sofisticada".

Funcionário ajusta robô em hospital de campanha em Xangai
Funcionário ajusta robô em hospital de campanha em Xangai - Jin Liwang - 8.abr.22/Xinhua

Xangai é uma cidade do século 21, ou melhor, do século 22, para o bem e para o mal. O mais impressionante é que a área em que moro, Pudong, passou direto do campo para a fronteira tecnológica, sem enfrentar os problemas urbanos da maioria das cidades do século passado.

Enquanto os brasileiros se acostumam com o Pix, aqui já usamos algo parecido há mais de dez anos. A maioria dos meus conhecidos nem usa mais carteira —está tudo integrado no celular. Metrô, ônibus, passagens de trem, códigos para testes de Covid e compras online? Há sempre um aplicativo para isso.

Taxistas nem olham mais para passageiros nas ruas. Para pegar uma bicicleta na rua, demoro segundos para desbloqueá-la, escaneando um código de barras, e a devolvo em praticamente qualquer lugar.

Se isso vale no dia a dia, vale ainda mais no combate à Covid. Antes de cada teste é preciso fazer um registro no app Health Cloud. Todos os resultados dos últimos 20 exames nos últimos 20 dias estão lá.

O histórico das vacinas também. Posso me consultar por videoconferência com um médico que vai receitar o medicamento por meio de um sistema eletrônico. A farmácia da clínica vai mandar o remédio controlado via entregador, e, da consulta até o fármaco chegar em casa, pode demorar 15 minutos.

Antes da pandemia, comprar coisas online era tão fácil que chegávamos a nos surpreender se qualquer pedido demorasse mais de 48 horas para ser entregue, seja de onde fosse na China.

Assim, causa surpresa que alguns distritos estejam usando drones e robôs para tentar manter a ordem em uma cidade de milhões de pessoas cuja frustração cresce diariamente? Não. A questão não é o uso dos robôs, mas o fato de que Xangai não tinha quantidades grandes desse tipo de ferramenta. Depois dessa onda de Covid, o número de compras de drones por autoridades locais vai disparar.

Mais impressionante que o uso esporádico de drones —e de robôs em formato de cachorro— é a frota de veículos autônomos que a Mei Tuan, maior empresa de entregas de restaurantes, está colocando nas ruas. Afinal, no momento, menos de 20% dos caminhoneiros e entregadores estão circulando pela cidade.

As autoridades também contam com mais de 1 milhão de câmeras de segurança instaladas pela cidade, para o caso de alguém ser pego burlando as regras. Em Xangai são 158 câmeras por quilômetro quadrado, pouco menos de um terço do que há em Londres, 442, mas 56 vezes mais que em São Paulo, 3.

Há uma visão equivocada do controle social na China. O governo não tem recursos, financeiros ou tecnológicos, para qualquer tipo de controle em tempo real. A censura existe e é forte, mas na maior parte das vezes é feita de forma tosca, apagando comentários e posts vistos como "perigosos" ou "sensíveis".

O governo de Xangai teve que criar um canal oficial para rebater as fake news que estão se multiplicando nas mídias sociais. Afinal, quando não há imprensa livre, o que não falta são canais informais para as pessoas se comunicarem. Viver em Xangai é experimentar o futuro. De novo, para o bem e para o mal. Faltam ainda os carros voadores que os livros de ficção científica nos prometeram no século passado.

Mas, de resto, não falta muito.

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