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Colômbia terá 2º turno entre esquerdista Petro e surpresa populista Hernández

Empresário atropela adversários mais bem cotados e agora enfrenta ex-prefeito de Bogotá

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Bogotá

A eleição presidencial colombiana terá segundo turno, a ser disputado em 19 de junho, entre o esquerdista Gustavo Petro e o populista Rodolfo Hernández, de acordo com a apuração neste domingo (29).

Com 99,89% das urnas contabilizadas, Petro tem 40,32%, seguido por Hernández, com 28,15%.

A liderança de Petro não foi uma surpresa, uma vez que o candidato, que concorre ao cargo pela terceira vez, vinha em primeiro lugar nas sondagens desde o início da campanha. A novidade foi Hernández. O ex-prefeito de Bucaramanga apareceu por meses na sexta colocação nos levantamentos, mas nas últimas semanas atropelou os nomes mais cotados para chegar ao segundo turno.

Os candidato à Presidência da Colômbia que vão disputar o segundo turno, Rodolfo Hernández, à esq., e Gustavo Petro
Os candidato à Presidência da Colômbia que vão disputar o segundo turno, Rodolfo Hernández, à esq., e Gustavo Petro - AFP

O favorito para enfrentar Petro era o direitista Federico "Fico" Gutiérrez, ex-prefeito de Medellín, apoiado pelo atual governo, de Iván Duque, e pelo Centro Democrático, partido comandado pelo caudilho Álvaro Uribe, popular ex-presidente da Colômbia. Ele marcou 23,91%. Essa fatia será importante, e Petro já acenou a ela no discurso após a definição da volta final, dizendo que "o povo de Medellín pode ser conservador, mas não é bobo, é empreendedor e vai entender que nosso projeto é mais contundente".

Hernández também desbancou o centrista Sergio Fajardo, que vinha em terceiro lugar nas pesquisas, tinha a preferência do eleitorado mais urbano e terminou o primeiro turno com 4,2%. Diante do desempenho do populista, já há a visão na campanha de Petro de que Fico era um adversário melhor.

Mas o candidato tratou de destacar o resultado obtido. "Se comparamos com a eleição passada, tivemos uma vitória muito expressiva. A votação de hoje mostra ao mundo que uma época na Colômbia acabou. Agora temos de construir um futuro. O segundo turno será uma decisão sobre o tipo de mudança que queremos. Se vamos nos suicidar ou 
avançar", disse o esquerdista.

A decisão de levar Petro e Hernández à disputa final está relacionada à forte rejeição a Duque e à continuidade de políticas da direita —a Colômbia jamais foi governada pela esquerda. A inquietação contra um modelo neoliberal na economia e conservador nos costumes se revelou com força nas manifestações populares de 2019 e de 2021, que resultaram em forte repressão da polícia.

Assim, os colombianos demonstraram que o desejo de mudança prevaleceu: ambos os candidatos não pertencem às forças políticas tradicionais que nas últimas duas décadas governaram o país nem possuem vínculos com nenhum dos lados da polarização entre direita liberal e direita conservadora representada pelos ex-presidentes Juan Manuel Santos e Uribe.

Entre as principais propostas do esquerdista estão reforma agrária, redução da taxa de desemprego —atualmente em 12%— por meio da criação de vagas no Estado e diminuição da dependência do país em relação ao petróleo, principal produto de exportação colombiano. Petro tem discurso anti-extrativista e afirmou que priorizará a produção do campo e das indústrias. Nos últimos debates, afirmou que seu governo seria uma social-democracia e que expropriações estavam fora dos planos.

Ex-membro do M-19 que foi preso e torturado na década de 1980, Petro, 62, abraçou a opção democrática depois que a guerrilha da qual fazia parte se desmobilizou. Foi eleito senador duas vezes e também liderou a prefeitura da capital colombiana, Bogotá, o segundo cargo mais importante do país.

Hernández, por sua vez, faz uma campanha baseada em mensagens simples e diretas, com amplo uso de redes sociais, um aspecto criticado por Petro, para quem "a corrupção na Colômbia não será resolvida com vídeos de TikTok". Aos 76, ficou popular devido ao discurso anticorrupção e às caravanas em motos ou caminhonetes, principalmente no interior do país. Rico empresário do setor da construção, foi prefeito de Bucaramanga e tem origem pobre. Já afirmou ser admirador do ditador nazista Adolf Hitler, para depois pedir desculpas e dizer que tinha se enganado e que, na verdade, queria dizer Albert Einstein.

Apesar de ser contra o aborto e o casamento igualitário, Hernández é a favor da legalização das drogas.

Em Bucaramanga, após o anúncio dos resultados, Hernández leu um breve discurso escrito em um papel. "Faremos da Colômbia um país para todos, onde o governo trabalha cada dia para o bem-estar dos colombianos, em especial os mais necessitados. Conto com vocês para ganhar no segundo turno."

Nas ruas, apoiadores saíram buzinando de moto e camisetas amarelas, cor da campanha do engenheiro.

Caso seja eleito presidente, o populista contará com apenas dois deputados, Erika Tatiana Sánchez e Juan Manuel Cortéz Dueñas, eleitos no último pleito legislativo, em março. Ambos foram eleitos pelo Departamento de Santander, cuja capital é Bucaramanga, da qual o candidato foi prefeito.

Um ponto em comum entre os finalistas é a defesa da implementação completa do acordo com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). O tratado tem encarado dificuldades na prática. Funcionou no desarmamento e na desmobilização da guerrilha, mas pontos como a reforma agrária e a proteção de ex-combatentes ficaram de lado, causando mais de 150 mortes de ex-guerrilheiros e dissidentes, que se uniram a grupos criminosos e ligados ao narcotráfico.

Diferentemente da última eleição, em 2018, neste pleito a paz com as guerrilhas não apareceu como principal preocupação dos colombianos. Desemprego, saúde, impostos e maior participação do Estado nas aposentadorias foram temas que apareceram com mais força nos debates presidenciais.

O dia da eleição transcorreu sem maiores problemas, de acordo com observadores colombianos e estrangeiros, mas episódios de violência ocorreram nos Departamentos de Meta, Caquetá e Guaviare.

Em Meta, houve uma explosão a 100 metros de um local de votação, e em El Retorno uma outra bomba atingiu um soldado, que ficou ferido. As chuvas atrapalharam os colombianos, e em Meta foi necessário mudar mesas de votação para que eleitores pudessem ter acesso às urnas.

Antes de votar, Petro postou nas redes sociais logo cedo a imagem de uma carta de próprio punho para o povo colombiano. "Hoje confio em meu povo. É a hora da confiança, da convivência e da vontade de mudança. É hora de concretizar nossos sonhos", escreveu. Ao chegar ao 
centro de votação, teve de voltar para casa porque esqueceu a carteira de identidade.

Hernández, por sua vez, ao ser questionado sobre o que faria depois de votar, respondeu com o estilo bufão que o ajudou a chegar ao segundo turno da eleição presidencial colombiana: "Voltar para minha casa e dormir". Para quem já concedeu uma entrevista à CNN de pijama, a frase é bem coerente.

Erramos: o texto foi alterado

A frase correta do candidato Gustavo Petro sobre o adversário Rodolfo Hernández é "a corrupção na Colômbia não será resolvida com vídeos de TikTok". Versão anterior do texto afirmava que ele havia dito "fome" em vez de "corrupção". O acordo de paz com as Farc também não está na Constituição. Na verdade, o Congresso colombiano decidiu que é atribuição constitucional do Estado cumprir o pacto.

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